O argumento central que apoiava essa visão enfatizava as desvantagens dos pequenos empreendimentos frente às grandes empresas que, por produzirem em larga escala, operavam com custos médios de produção mais baixos e poderiam oferecer bens e serviços a preços mais atraentes.
Nessa perspectiva, as grandes empresas tenderiam a deslocar os pequenos empreendimentos dos mercados em que atuavam tão logo esses contassem com dimensão suficiente para a entrada de unidades produzindo em larga escala. Assim, com a chegada das redes de supermercados foram deslocadas as antigas mercearias que abasteciam as famílias de suprimentos. E no segmento industrial, novas tecnologias exigiam unidades produtivas e sistemas de distribuição cada vez maiores, com o surgimento de megas corporações que findariam por levar à bancarrota as unidades menores, que não conseguiam acompanhar às mudanças no ambiente econômico, em um reinado da produção em massa. Reconhecia-se, é verdade, que novos nichos de mercado seriam abertos para os pequenos empreendimentos, muitas vezes em atividades subsidiárias às da grande empresa, com o fornecimento de bens e serviços para a cadeia produtiva.
A reestruturação produtiva
A reestruturação industrial dos anos noventa, estimulada pelo aumento da competição em mercados cada vez mais globalizados, impactou de diferentes formas a vida dos pequenos empreendimentos. A busca obsessiva da redução de custos levou a grande empresa a terceirizar uma diversidade de atividades, desde serviços de segurança e limpeza, passando pela produção de partes e componentes, até a prestação de serviços de engenharia, tecnologias de informação e marketing, abrindo espaço de atuação para os pequenos empreendimentos. Novos arranjos institucionais se multiplicaram, com a formação de redes de empresas, em que os pequenos empreendimentos tinham um espaço a ocupar.
A disseminação das novas tecnologias de informação e de comunicação, as chamadas TICs, cumpriu um papel determinante. Com as novas tecnologias foram redimensionados os requisitos de tamanho dos empreendimentos, com efeitos diversos, elevando o tamanho mínimo em muitos mercados, mas abrindo oportunidades para unidades menores, em outros. Todo um conjunto de novas necessidades emergiu e pôde, parcialmente, ser atendido pelos empreendimentos de menor porte, mesmo por que eles continuaram se revelando imbatíveis em termos de flexibilidade para atender a demandas específicas de empresas e famílias, de uma forma que a produção massificada não conseguia suprir de forma satisfatória.
Ao lado desses processos, a formação de um contingente de pessoas que simplesmente não conseguia entrar ou permanecer no mercado de trabalho nos anos noventa concorreu para a constituição de novos empreendimentos de pessoas que forçavam sua inserção econômica. No Brasil, com a retomada do crescimento nos anos 2000, a expansão do poder de compra das famílias abriu novas oportunidades de mercado para os pequenos empreendimentos ao tempo em que foram intensificadas políticas voltadas para o fomento do desenvolvimento local por meio do fortalecimento das pequenas empresas, em que o acesso ao crédito se constituiu em uma das ferramentas de maior efetividade.
Alguns dados da presença dos pequenos empreendimentos refletem a importância deles na economia brasileira e em Sergipe. O Comunicado Ipea N. 38, de 04 de fevereiro de 2010, busca examinar a Atualidade e perspectiva das ocupações nos pequenos empreendimentos no Brasil, com base em dados da Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar- PNAD, de 2008. O referido relatório informa que, considerando apenas o setor privado, os empreendimentos, formais ou informais, com até dez ocupantes respondiam por 54,4% de todos ou postos de trabalho e por 57,2% do total da massa de rendimentos. Em relação ao total de pessoas ocupadas, adicionando o setor público, pessoas não-remuneradas e serviços domésticos, os empreendimentos com até dez ocupantes representavam 33,6%. Em Sergipe, os empreendimentos com até dez ocupantes contavam com 342 mil trabalhadores, proporcionalmente mais do que a média brasileira, pois correspondiam a 37,5% de todas as ocupações.
Observando-se apenas as empresas formalizadas e excluindo a administração pública, em 2008, a economia sergipana contava com 18.326 estabelecimentos com até dezenove pessoas ocupadas, correspondendo a 91,9% do total de 19.944 estabelecimentos privados. Esses estabelecimentos empregavam 66.959 pessoas, contingente muito expressivo, representando 32,4% do total. Os estabelecimentos entre 20 e 99 empregados, considerados de pequeno porte, eram em número de 1.335 e ocupavam 52.186 pessoas; os empreendimentos de médio porte, entre 100 e 499 empregados, contavam com 48.986 empregados, e os grandes estabelecimentos, com mais de 500 empregados, ocupavam 38.313 pessoas. (Ver tabela)
Tabela. Sergipe. Estabelecimentos e Empregados no Setor Privado Formal segundo o Porte. 2008.
Fonte: MTE-RAIS
Entre 2000 e 2008, o segmento de empresas com até dezenove empregados teve um incremento de 5.221 estabelecimentos e de 22.588 pessoas ocupadas, 28% dos novos empregos gerados pelo setor privado sergipano. Os dados mostram a importância incontestável dos pequenos empreendimentos na economia sergipana e do Brasil como um todo.
Embora o avanço das grandes corporações seja um fato inegável, a visão mais pessimista não se confirmou e os pequenos empreendimentos souberam se recriar e se adaptar às mudanças cada vez mais velozes do ambiente de negócios, mostrando grande perspicácia para buscar o atendimento de novas necessidades. A permanência dos pequenos empreendimentos como um ator significativo da economia capitalista contemporânea também é um fato que não se pode desconhecer.
Nos artigos seguintes, serão examinados em que setores de atividade se concentram os pequenos empreendimentos e algumas das políticas de desenvolvimento voltadas para o segmento.
* Professor do Departamento de Economia da UFS e Assessor Econômico do Governo de Sergipe.
Publicado no Jornal da Cidade em 11 de abril de 2010.