O ajuste e o IPCA de junho
Economia

O ajuste e o IPCA de junho



Ricardo Lacerda

Quando assumiu o comando da política econômica no final de 2014, antes mesmo de tomar posse, o ministro Joaquim Levy já deixava claro qual a rota que seguiria em seu objetivo de reverter a onda de desconfiança que dominara as expectativas e traduziu seu conjunto de propostas em uma palavra-chave: ajuste.  

O ajuste pressupunha uma série de medidas monetárias, fiscais e nos mecanismos de regulação da economia. Alguns dos efeitos esperados do ajuste já se manifestam no mercado de trabalho; no nível de atividade; nas vendas do comércio; na balança comercial; na contenção dos gastos públicos; na carga fiscal; na asfixia das finanças de estados e municípios. Desde então o ministro não se afastou de seus objetivos, ainda que a caminhada possa parecer mais penosa do que muitos acreditavam no final do ano passado.

Observando da perspectiva de hoje, os custos sociais e econômicos estão sendo muito elevados e os benefícios prometidos em termos de estabilização vão tardar ainda alguns trimestres para se mostrarem mais robustos, mas o fato é que se sabiam, e os especialistas já dimensionavam, os impactos que adviriam.

Inflação

Em relação à evolução dos preços, não restavam dúvidas de que haveria uma forte aceleração ao longo do primeiro semestre de 2015 causada principalmente pelos efeitos da desvalorização cambial e pelo corte dos subsídios nas tarifas de energia e nos preços dos combustíveis. Ainda estão por vir os possíveis efeitos de elevação de custos decorrentes da eliminação parcial ou total das medidas de desonerações sobre as folhas de pagamento adotadas em anos anteriores, mesmo que a forte contração do poder de compra em curso atenue o poder de repassar elevações de custos para os preços.

O Índice de Preços do Consumidor Ampliado (IPCA) de doze meses apresentou forte aceleração já a partir de janeiro de 2015, rompendo e se distanciando do teto superior da meta de inflação (6,5%), conforme ilustra o Gráfico 1.

O IPCA de junho atingiu 0,79% elevando o índice acumulado em doze meses para 8,89%, o mais alto desde dezembro de 2003. A projeção de mercado no início do mês de julho é de que o IPCA em doze meses subirá nos próximos meses, ainda que em ritmo bem menos intenso, na medida em que os resultados mensais do segundo semestre de 2015 substituirão as taxas, em média, relativamente mais moderadas de igual período do ano passado. Ao final do ano, segundo projeção de mercado, o IPCA em doze meses se situará em 9,04% (ver Gráfico 1).

Ainda segundo as projeções de mercado, o IPCA em doze meses declinaria acentuadamente já no primeiro semestre de 2016, na medida em que os resultados mensais do próximo ano substituiriam as taxas excepcionalmente elevadas do início de 2015.
Em junho de 2016, o IPCA em doze meses se situaria em 5,88% e ao final daquele ano atingiria 5,45%.


Fonte: IBGE. Os resultados projetados são do relatório de mercado do Banco Central.

Monitorados e livres

Os efeitos das medidas de ajuste sobre os preços podem ser acompanhados pelo Gráfico 2, que apresenta os dados do IPCA mensal dos bens e serviços monitorados, dos bens e serviços comercializáveis e dos não comercializáveis, além do IPCA geral, entre junho de 2014 e junho de 2015.

Os preços dos bens e serviços monitorados pelo governo sofreram fortíssima elevação entre janeiro e março de 2015, como todos sabemos. No acumulado de doze meses de março de 2015, o IPCA dos monitorados alcançou 13,4%, impactado pelos aumentos nos preços dos combustíveis e nas tarifas de energia elétrica. Nos meses seguintes, os aumentos nos preços monitorados se tornaram mais moderados, ainda assim se mantiveram, em média, acima do do IPCA geral.

Também era esperado que com a apreciação cambial/desvalorização do real os preços dos produtos comercializáveis (influenciados pelos preços externos medidos em reais) acelerassem, enquanto os preços dos bens e serviços não comercializáveis (que não sofrem competição direta com preços externos) desacelerassem,  por conta da piora do mercado de trabalho e do poder de compra doméstico.

Como o Gráfico 2 mostra, esses movimentos de fato aconteceram, mas, talvez, em uma intensidade menor que se pensava que ocorreriam, visto que somente nos últimos dois meses os não comercializáveis subiram menos, na média, do que os comercializáveis.

Os movimentos de preços apresentados nos dois gráficos deixam poucas dúvidas de que a inflação vai declinar acentuadamente no segundo semestre e que os resultados no acumulado de doze meses em 2016 serão bem mais baixos do que os atuais. Isso não é polêmico. O que é polêmico é o custo social que a população vai arcar.


Fonte: IBGE, extraído do SGS do BCB.

Publicado no Jornal da Cidade, em 12 de julho de 2015 



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