Ricardo Lacerda
As medidas de ajuste macroeconômico adotadas pela nova equipe econômica já começam a ter impactos sobre a evolução dos preços. Os efeitos sobre o nível de atividade e sobre o emprego também apresentam os primeiros sinais, mas se farão sentir de forma mais acentuada nos próximos meses.
Dois conjuntos de medidas têm o poder de deslocar para cima a trajetória dos preços: a depreciação do real frente às principais moedas e a retirada progressiva dos subsídios aos preços dos derivados de petróleo e às tarifas de energia, aos quais deve ser adicionada a reversão progressiva de desonerações tributárias sobre setores específicos que haviam sido adotadas nos últimos anos.
Nos primeiros meses de 2015, o segundo conjunto de medidas (os cortes dos subsídios) tem tido maior impacto do que o primeiro, mas os efeitos da aceleração recente da depreciação do real (valorização do câmbio) deverão se manifestar com força nos próximos meses. Devem amortecer a tendência de elevação nos preços a queda nas cotações das commodities no mercado internacional e a compressão no poder de compra da população.
IPCA
Nos dois primeiros meses de 2015, a taxa em doze meses do IPCA apresentou dois saltos, passando de 6,41%, em dezembro, para 7,14%, em janeiro, e atingiu 7,70% em fevereiro. O IPCA-15 de março já acusou nova aceleração, para 7,90% em doze meses.
A expectativa é que o IPCA em doze meses suba um pouco mais nas próximas edições mensais e em algum momento de 2016 comece a declinar posto que a maior parte dos choques de custo deve provocar elevações não recorrentes (once for all) e que as empresas deverão limitar os repasses aos preços em uma conjuntura em que a renda disponível das famílias deverá ser encolher. A evolução dos níveis dos reservatórios das principais hidrelétricas deverá cumprir papel chave na evolução dos preços na medida em que impactará as tarifas do fornecimento da energia elétrica.
Represamento
Desde dezembro do ano passado se acentuou a tendência iniciada doze meses antes de acelerar a elevação dos preços dos produtos monitorados pelo governo, como combustíveis, energia elétrica e outras tarifas de serviços públicos.
É importante destacar que a elevação dos preços monitorados vem reduzir uma enorme defasagem acumulada. Os preços monitorados vêm sendo reajustados sistematicamente abaixo da inflação média desde maio de 2007, desconsiderando-se cinco meses entre o segundo semestre de 2009 e o início de 2010, em uma situação excepcional.
A defasagem foi muito ampliada ao longo de 2013. Entre fevereiro e dezembro daquele ano, o IPCA dos preços monitorados manteve-se 4 pontos percentuais abaixo do IPCA, na série de doze meses acumulados (ver Gráfico).
Em 2014, o governo estreitou essa diferença mas ela se manteve muito ampla até meados do ano quando a elevação dos preços monitorados foi acelerada, reduzindo a diferença em relação ao IPCA. Depois de dezembro, os preços monitorados foram fortemente corrigidos, fazendo com que as taxas acumuladas em doze meses em janeiro e fevereiro superassem o IPCA- Geral, o que não acontecia desde fevereiro de 2010.
Comercializáveis e não comercializáveis
A queda nas cotações internacionais de nossas principais commodities agrícolas e minerais, além da forte retração nos preços do petróleo e gás, propiciou que o IPCA dos bens e serviços comercializáveis tenha declinado na série de doze meses desde meados de 2014, mesmo com a forte apreciação do câmbio no período. O IPCA dos comercializáveis somente reagiu em janeiro, mas o acumulado em doze meses manteve-se abaixo do IPCA-Geral.
Ainda assim, é de se esperar que nos próximos meses a elevação nos preços dos produtos e serviços comercializáveis, desde eletrônicos e insumos industriais até fretes e turismo internacionais, venha a acelerar, refletindo o novo patamar do câmbio.
Por outro lado, o IPCA dos bens e serviços não comercializáveis, que não sofre impacto direto do câmbio, como são os casos dos serviços pessoais e alimentação fora de casa, se manteve acima do IPCA-Geral até o momento, indicando que o desaquecimento em curso da economia ainda não atingiu fortemente o poder de compra interno, nem o mercado de trabalho no segmento de serviços.
A tendência nos próximos meses é de que os preços dos bens e serviços comercializáveis, que dependem da cotação do câmbio, passem a subir acima da inflação média, enquanto os preços dos bens e serviços que não são cotados no mercado internacional e não sofrem concorrência direta com os importados passem a ser reajustados abaixo do IPCA médio, na medida em que a economia desaquecer e o poder de compra da população se tornar mais restrito, em um processo inverso ao que ocorreu quando o câmbio foi desvalorizado, entre o início de 2004 e meados de 2011.
Fonte: IBGE-IPCA
Publicado no Jornal da Cidade, em 22/03/2015
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