Há poucas semanas, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou por ampla maioria a ratificação pelo Brasil do Protocolo de Adesão da Venezuela ao Mercosul. Agora, o processo segue seu curso no Congresso Nacional, com previsão de ser posto em pauta dentro de três semanas. Ainda falta aprovação semelhante por parte do Legislativo do Paraguai.
Com a derrota de Chavez em seu memorando (que pregava mudanças na Constituição da Venezuela, para, por exemplo: postergar o seu governo por tempo indeterminado e dar poderes ilimitados de interferência tanto na questão executiva – prefeitos e governadores – quanto na questão econômica, via criação de conselhos), há esperança de que a “democracia” pregada ainda nos primórdios do comemorado Tratado de Assunção, o qual instituiu essa proveitosa união aduaneira (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai), seja respeitada. Sem uma digressão concisa, fica difícil averiguar quais os fatos históricos que empurraram Chavez ao poder de uma nação com capacidade praticamente ilimitada no curto prazo de gerar riqueza. Retornemos à década de 1980.
Como a Venezuela não aproveitou os dois choques do petróleo, de 1973 e 1978, a situação no início da década de 1980 estava realmente complicada. Segundo o economista Domingo Felipe Maza Zavala, somente entre 1976 e 1995, o país recebeu cerca de 270 bilhões de dólares de ingressos petroleiros, equivalentes a vinte vezes o famoso “Plano Marshall”. Paradoxalmente, o saldo total da dívida externa venezuelana aumentou de 16,4 bilhões de dólares para 33,5 bilhões de dólares entre 1978 e 1983. Após tentativas frustadas de diversos governos (como o de Carlos Andrés Pérez e o de Rafael Caldera), o país foi entregue à mercê do FMI, o qual impôs as costumeiras políticas “arrojadas” de privatização das principais empresas nacionais, nesse caso (tradução livre): Companhia Nacional de Telefonia (Cantv), a Siderúrgica do Orenoco (Sidor), a Venezuelana Internacional de Aviação S.A. (Viasa), instituições financeiras, centrais açucareiras, estaleiros navais e empresas do setor construção, além da PDVSA (a qual teve parte de seu poder acionário fragmentado nas mãos outras empresas multinacionais do setor petrolífero). O objetivo dessa política, principalmente, foi o de diminuir o déficit fiscal e o desemprego. Ademais, trazer à tona a capacidade de renovação e atualização de processos, gerando incremento na competitividade, via injeção de recursos financeiros internacionais e know-how do desenvolvido mundo capitalista. Infelizmente, essas medidas acabaram por ser estéreis na resolução dos problemas, como constatou a CEPAL, Banco Mundial, FMI e até o Vaticano (até o Vaticano!). Depois de diversos eventos de revolta, em fevereiro de 1999, Chavez toma o poder.
Em 1999, o PIB venezuelano caiu 6% em 1999, fruto da grave situação econômico-financeira e do período de adaptação (semelhante ao que ocorreu na posse de nosso presidente, Luis Inácio Lula da Silva). A recuperação dos preços do petróleo - fruto direto das ações do governo Chavez (junto à OPEP) e também da demanda chinesa - e as políticas fiscal e monetária expansionistas da economia marcaram o início da nova etapa. Durante os anos 2000 e 2001, o PIB teve altas de 3,7% e 3,4%, respectivamente. Nestes oito trimestres o PIB não-petroleiro cresceu 4% em média, enquanto o PIB petroleiro elevou-se somente 1,2%.Verificam-se quedas no desemprego, no índice de preços ao consumidor e nas taxas de juros; com conseqüente aumento do crédito, do consumo e do PIB per capita.
Depois da tentativa de golpe de 2002 (engendrado, segundo fontes populares, pela CIA), a economia venezuelana caiu em desgraça, regredindo cerca de 20% ainda dentro do ano presente, contribuindo para a elevação dos juros básicos – para sustentar a dívida externa -, crescimento do desemprego e da inflação. Disso tudo, Chavez saiu fortalecido. Mediante a captação dos valores petrolíferos, crescente nos últimos anos, devido a um choque de demanda, e não de oferta, como previamente ocorrido, foram estipulados seis mecanismos:
Apesar de serem consideráveis essas atitudes, percebe-se que o viés autoritário floresce a cada dia mais no âmago de Chavez, visto que, atualmente, as receitas governamentais estão sendo direcionadas à aquisição de armamentos, com a desculpa de auto-proteção da ameaça iminente de uma invasão norte-americana.
No que tange ao Mercosul, a preocupação maior é com a questão diplomática, pois Chavez não reflete a postura de cumprimento de contratos e de bastião da democracia representativa, exigida pela EU, como fator primordial para o fechamento de um acordo comercial consistente com nosso continente. A entrada da Venezuela no bloco corroborará para um desgaste na imagem já corrompida do Mercosul, cooperando, talvez, para a derriba definitiva desse bloco já nascido sobre bases débeis. Sobre os efeitos econômicos, acredito que serão positivos, visto que os parceiros comerciais como a Argentina, tranquilamente, manterá a sua posição no que diz respeito à dívida pública, mediante venda dos títulos para a entidade máxima monetária da Venezuela, o seu Banco Central.