Economia
Itaipú, contrabando e pobreza: um retrato do Paraguai
Insulado pela natureza, habitado por uma população pequena e despreparada tecnicamente, desprovido de recursos naturais, devastado por guerras no decorrer dos séculos e rodeado por vizinhos instáveis como Brasil, Argentina e Uruguai. Esse e o Paraguai, um dos países menos desenvolvidos da America Latina. Tendo claramente considerados os aspectos acima mencionados, já não parece tão surpreendente a afirmação feita na sentença anterior. Façamos uma digressão histórica, focada no século XXI, de forma a compreender alguns aspectos que colaboram para a presente situação.
A economia paraguaia sempre foi concentrada no setor primário, a agricultura, vitimada conseqüentemente por oscilações nos mercados internacionais de grãos, o que causava incerteza no que tange ao crescimento do PIB, inflação e outros aspectos macroeconômicos.
Enquanto a II Guerra Mundial perdurou, os índices de crescimento anuais no Paraguai foram surpreendentes (apesar da alta inflação incidente sobre os pobres); contudo, assim que o conflito chegou ao fim, a guerra civil tomou parte do cenário, reduzindo a produção (emprego e renda), por conseguinte, causando a instabilidade social. Para combater o problema, o governo resolveu aplicar uma política fiscal (gastos do governo) expansionista, similar a que está sendo aplicada nos dias de hoje, porém sem foco concreto, engordando ainda mais os níveis inflacionários. A solução foi recorrer ao FMI na metade em 1953, instaurando um regime cambial no qual o guarani estava acorrentado ao dólar, em uma relação de 126 para 1.
Da mesma forma que nas décadas de 1940 e 1950, a primeira metade dos anos 1960 apresentou como base de sustentação da economia a atividade agrária, representando 40% do PIB e a empregar 55% da PEA (população economicamente ativa), ao passo que a manufatura continuava engatinhando. Um dos principais motivos do desenvolvimento da agricultura do Paraguai nesse período foi o melhoramento das vias de transporte internas e externas (parceiros do MERCOSUL), ademais, o processo imigratório de colonos brasileiros à região leste daquele pais. Após 1965, houve mudança no panorama majoritariamente agro-dependente em duas frentes: por parte do governo, houve investimento pesado em obras de renovação das estradas e da estrutura portuária, até chegando à construção de uma planta para a produção de cimento; já no âmbito do comércio, houve a entrada de grandes números de turistas argentinos e brasileiros para aproveitar os preços dos produtos importados pelo Paraguai, o famoso contrabando, que ainda hoje movimenta bilhões.
A prosperidade foi a característica mais marcante dos anos 1970. A atividade agrícola foi intensamente desenvolvida, com a expansão das fronteiras para terras antes inabitadas, mas altamente férteis, principalmente por causa da valorização dos preços do algodão e soja. O desenvolvimento de minifúndios, o que impediu a migração campo-cidade (que na teoria é bom), ao mesmo tempo enfraqueceu a capacidade competitiva da agricultura do Paraguai, gerando pobreza e perda de mercados. De parte da infra-estrutura, a construção da segunda maior hidrelétrica do mundo, Itaipú, um projeto conjunto com o Brasil, de 1973-1983, de custo na época um valor equivalente a 4X do PIB do Paraguai, sendo que o débito foi garantido pelo Brasil. Os mercados internacionais de crédito naquele momento estavam regados de liquidez, logo uma torrente de capital inundou a economia paraguaia, o que só seria positivo se a propriedade privada e o setor público soubessem investir de forma equânime e eficiente. Ao contrário do bom senso, esse dinheiro acabou sendo desviado pelos canais da corrupção.
A década de 80, não somente no Paraguai, mas em toda a América Latina, foi considerada “perdida”. Esses anos foram de instabilidade macroeconômica (dívida externa, inflação, falta de recursos externos). Como mencionado no parágrafo anterior, todo o capital recebido pela faraônica Itaipú foi utilizado de forma corrupta e ineficiente no decorrer dos anos 1980, a saber, na concessão de créditos ilegais a exportadores ligados ao sistema ditatorial da época, subsídios ao setor agrícola, e outras práticas de obtenção de rendas. Felizmente, depois de 35 anos, o governo autoritário do Stroessner caiu, devido a movimentos sociais crescentes.
Por sua vez, nos anos 1990, o governo de transição trabalhou duramente no equilíbrio das contas públicas, por meio de um novo código tributário, e também pela liberalização da taxa de câmbio, isto é, seguindo o Consenso de Washington. Na metade da década, houve uma grande crise bancária da qual o país ainda está tentando se recuperar, visto que ela afeta a concessão de empréstimos especialmente aos cidadãos de baixa renda. Em meio a essa crise de grandes proporções, o novo presidente do Paraguai, Fernando Lugo, propõe a revisão dos contratos da Itaipú (com o Brasil) e Yaceritá (com a Argentina) e várias outras reformas. O que se espera é que ele não resolva se apoiar nos ideais de Hugo Chavez, para o bem do Paraguai.
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