Restrições ao crescimento II - a restrição externa
Economia

Restrições ao crescimento II - a restrição externa


Por Ederson Vieira Grandi

Vimos no primeiro texto que existem restrições internas e externas ao crescimento econômico. Foram abordadas as restrições dadas pela taxa de crescimento do estoque de capital e pela taxa de crescimento da força de trabalho. Existe, porém, outra restrição que é causada no processo de crescimento, sendo esta de origem externa.

Quando se fazem investimentos em equipamento e estoques, dado o nível de integração produtiva em nível internacional, parte desta demanda é suprida pela importação. Quando as empresas exportam, estão adquirindo divisas para poder pagar as importações feitas. Trata-se um autofinanciamento das empresas para realizar seus investimentos com bens e serviços produzidos no exterior.

Porém, se o valor monetário de importações de bens e serviços for maior que as exportações (déficit na balança comercial ou de serviços não fatores[1], precisarão as empresas pagar de alguma fo rma. Alguns economistas advogam que basta um influxo de capitais para fazer frente a este déficit, ou seja, que a conta de capitais[2] seja maior que o déficit na conta corrente do país. Outra receita destes economistas é a manutenção de uma taxa de câmbio apreciada, de forma a reduzir o custo das importações. Como objetivam conseguir isto? Por meio de elevadas taxas básicas de juros! Isto não lembra alguma coisa?

Mas nem todo capital ingressado no país é direcionado pelos investidores externos ao financiamento dos investimentos: parte vai parar no mercado de capitais, na aquisição da propriedade de empresas (ações), ou mesmo com o Governo, quando este adquire reservas para recompor o estoque ou enxugar as divisas do mercado cambial. Haja visto, também, que os títulos do Governo, devido a altas taxas básicas (caso Brasil) pode concorrer com o setor privado pelo capital estrangeiro.

Quando o autofinanciamento não é possível, ou seja, quando há déficit na balança comercial ou de serviços não-fatores, e não há acionistas estrangeiros enviando recursos para financiar os planos de investimentos domésticos, restam as contratações de dívidas, internas ou externas. Porém estes investimentos de acionistas estrangeiros e as dívidas externas levam, a médio prazo, em um agravamento no déficit das contas correntes (causado pel os déficits comercial e de serviços não-fatores), por meio de um déficit de serviços fatores. Isto porque, de tempos em tempos, há a remessa de dividendos e lucros para os investidores no estrangeiro, mais os juros da dívida. Desta forma, agravam-se as contas correntes do país.

Nestas horas há a atuação do Governo, pois o endividamento excessivo das empresas pode leva-las a uma fragilidade financeira tal, que choques externos levariam o país a uma crise financeira ou cambial e, por fim, econômica. Ademais, em caso de déficits em conta corrente, fontes de recursos, como o FMI, podem ser necessárias no futuro. Resta o controle dos itens da conta corrente, pois déficits recorrentes na mesma são insustentáveis a longo prazo.

Thirlwal, em seu trabalho, concebe a equação de equilíbrio na conta corrente de não-fatores, com importações de bens e serviços não-fatores sendo igual às exportações. Se não houver mudanças significativas nos preços relativos, tem-se que:

yCC = x / erM

Onde yCC representa a variação percentual na renda de equilíbrio na conta corrente, a qual o PIB efetivo fica condicionado, no longo prazo, para que haja este equilíbrio; x é a variação percentual das exportações; e erM é a elasticidade-renda das importações, ou seja, a variação percentual nas importações quando ocorrem variações percentuais na renda interna (neste caso dado pelo PIB). Se tomarmos a variação percentual das exportações acima como sendo o produto da elasticidade-renda da mesma vezes a variação percentual do PIB mundial (a taxa de crescimento mundial):

yCC / yW = erM / erX

Daí se conclui que a razão das elasticidades-renda nos dá o limite de crescimento do PIB de um país, a longo prazo, em relação ao mundo.

Se erM / erX = 1,5 (que é maior que 1), e a economia mundial crescendo, digamos, 5% a.a., o país em questão terá uma maior liberdade para crescer à taxa de 7,5% a.a. sem maiores riscos de déficits em conta corrente. Agora, se a razão for menor que 1, a taxa de crescimento do país fica abaixo da taxa de crescimento mundial. Se a taxa de crescimento da população for menor que a taxa de crescimento da restrição, a longo prazo a renda per capta crescerá e (supondo constante o nível de concentração da renda), a população passará a ter elevação no padrão de vida.

Segundo Davidson[3], países em desenvolvimento possuem vantagens na produção de produtos primários e matérias-primas, mas os países desenvolvidos possuem elasticidade de demanda desses produtos. Isto causa uma elasticidade-renda de exportações dos países em desenvolvimento também baixas. Já os países desenvolvidos possuem vantagens na produção de manufaturados e, devido aos países em desenvolvimento possuírem alta elasticidade de demanda a estes bens, a elasticidade-renda de importações é, de igual forma, alta.

Assim a razão de elasticidades dos países em desenvolvimento seria menor que a dos países desenvolvidos. Países em desenvolvimento de importância em termos de bens manufaturados ou com grande exportação de produtos primários poderão[4] gozar de taxas de crescimento superiores às mundiais. Porém, deve-se salientar que se as variações nos preços relativos for considerável, deve ser incluso tal variável no modelo, pois afetará o saldo da conta corrente do Balanço de Pagamentos, como é o caso brasileiro. As variações nos preços relativos têm diminuído o gap entre as importações e exportações e, somando-se o déficit devido aos serviços fatores fizeram a conta corrente registrar um saldo negativo de US$ 17,4 bi no primeiro semestre deste ano, sendo que tal resultado só é comparável ao mesmo período de 1949.

Veremos no próximo texto, a apl icação empírica ao caso brasileiro com uma variante da Lei de Thirlwal, que considera o equilíbrio no Balanço de Pagamentos e os fluxos de capital.

[1] A balança de transações correntes de um país é composta pelo saldo da balança comercial (exportações de bens menos as importações) mais o saldo da balança de serviços (que incluem os serv iços não fatores, que são os serviços comprados e vendidos, e os serviços fatores, que são a remuneração do capital investido no país, como royalties, dividendos, lucros, etc.) e as transferências unilaterais (que se caracterizam por não haver uma contrapartida, e.g., um filho que trabalha no exterior e envia parte de seu salário para os país, em seu país natal.
[2] A conta de capitais inclui alguns itens como o fluxo líquido de capitais externos, empréstimos externos com os mais diferentes prazos de vencimento e, por fim, as variações das reservas de divisas em poder do Banco Central mais capitais compensatórios (FMI, BIRD, etc.), que entram em cena caso ainda o déficit na conta corrente ainda não pôde ser coberto com os dois primeiros itens)
[3] DAVIDSON, P. A Lei de Thirlwal. Revista de Economia Política, vol. 10, nº 4, out-dez/1990.
[4] Note-se que "poderão" não quer dizer que "vão". Estas taxas tratam-se de limites que, para serem atingidos, dependem da demanda agregada. Se a demanda agregada crescer a taxas superiores às estipulad as por esta relação, haverá a longo prazo déficitis em conta corrente do balanço de pagamentos.



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