Economia
Portugal visto do relvado
Se quisermos fazer uma ligação entre a realidade futebolístico-desportiva e a situação económica, financeira e social do País, em particular numa semana como esta, temos que começar pelo essencial: o Benfica foi campeão, 6 milhões de Portugueses estão hoje mais felizes, mais motivados, mais produtivos e Portugal terá mesmo ganho várias posições nos rankings de competitividade internacionais.
Graças, entre outros, a Jesus, Luisão, Aimar e Cardozo são hoje mais toleráveis as medidas acrescidas de austeridade que o Governo vai ter que implementar, os aumentos de impostos, os cortes nas prestações sociais, a suspensão inadiável do lançamento de novos projectos de investimento.
Bem vistas as coisas, os investimentos verdadeiramente importantes para a opinião pública são os milhões pagos por Gaitán e se há investimento que deve ser travado é aquele que os grandes clubes europeus querem fazer por Di Maria, Saviola ou David Luiz.
A este propósito, não deixa de ser curioso que esta conquista acabe por corroborar a visão Socrática da gestão financeira da coisa pública, em que o investimento se assume como alavanca maior para o sucesso e acaba por criar mecanismos de auto-sustentação dos resultados (apenas com o pequeno pormenor de que estes mecanismos não são perceptíveis no campo de intervenção do actual Primeiro-Ministro).
Perante tais evidências, a lógica da vida austera e de sacrifício, o apelo à poupança e à contenção financeira pode mesmo sofrer um forte abalo, desenhando-se um novo impulso consumista que mais contribua para o desejado aumento das receitas do IVA.
Ainda a propósito desta conquista e, nomeadamente, dos festejos que a sucederam, ignoremos a soberba de alguns vencedores e centremo-nos na intolerância crescente de muitos vencidos, com consequências que voltaram a demonstrar a progressiva degradação das instituições. Afinal, parece que nem em cenários perfeitamente antecipáveis as forças de segurança conseguem garantir o cumprimento da sua missão e assegurar a ordem pública e a protecção de pessoas e bens.
Mas a principal reflexão que hoje resulta da análise do panorama futebolístico nacional prende-se precisamente com um aspecto de índole económica, referente aos indicadores de desenvolvimento do território.
Houve um tempo em que o mapa da divisão máxima do futebol nacional esteve sobretudo pintado com as cores do Norte, com o claro domínio dos filiados das Associações de Futebol do Porto e Braga (os quais chegaram a ter a maioria qualificada dos participantes na competição).
Nesse tempo, ainda que com algumas oscilações naturais e sucessivas mudanças de protagonistas, emergia a participação de vários clubes cuja sustentação resultava da capacidade de investimento de um ou mais empresários locais, normalmente ligados ao tecido industrial.
Quem não recorda o “desaparecimento” do Algarve do mapa do escalão principal, a contínua ausência do Alentejo, a esparsa presença dos clubes do Centro (depois da queda de vários clubes com enorme historial nos escalões secundários) e mesmo a concentração dos clubes do Sul na Grande Lisboa (Sporting, Benfica, Belenenses – bastas vezes salvo sobre a linha de meta – Amadora e Setúbal)?
Na próxima época, serão apenas 5 os clubes do Norte a marcar presença na Liga Sagres: Porto, Rio Ave, Paços de Ferreira, Braga e Guimarães. O Centro surge com quatro presenças (Beira Mar, Naval, Académica e U. Leiria), o Sul tem também cinco representantes, dois dos quais Algarvios (Benfica, Sporting, Setúbal, Olhanense e Portimonense), a Madeira mantém os seus dois clubes actuais (Marítimo e Nacional).
Poderá parecer uma análise simplista, mas a verdade é que esta evolução não diverge muito da quebra de competitividade e riqueza no Norte do País face ao resto do território.
Note-se que, mesmo na Liga Vitalis, eram equipas do Centro (Oliveirense e Feirense) e Açores (Santa Clara) os demais candidatos à promoção. Até Trás-os-Montes volta a perder o seu representante nos escalões profissionais de futebol, logo no ano em que o Chaves consegue um dos maiores feitos do seu historial.
Por tudo isto, não tendo muito a concordar que o S. C. Braga fez mais pela regionalização do que muitos estudos técnicos ou declarações políticas. Mas pode ter demonstrado que o caminho para o Norte passa também pela criação de uma rede multipolar de cidades médias, capaz de alavancar novos pólos de competitividade e dinamização económica.
Dentro e fora das quatro linhas, só uma outra postura e ambição pode reverter o caminho de perda que ora se vem percorrendo…
loading...
-
Grande Penalidade
O ministro das Finanças deu "luz verde" para que o Fisco notifique a Liga, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e os clubes para liquidarem as dívidas fiscais relacionadas com a aplicação, até 2004, do acordo firmado em 1999, conhecido por...
-
A Tempestade Perfeita
A poucas horas do início de mais um campeonato na Primeira Liga do futebol profissional, o conceito de “tempestade perfeita” tem diversas possibilidades de materialização consoante a perspectiva dos adeptos. Para uns, ocorreria caso o supostamente...
-
Era Uma Vez Um Leão
O Desporto no seu todo e o futebol em particular conquistaram ao longo dos últimos anos um protagonismo social e económico que mais que justificam as incursões pontuais que aqui vou fazendo em tais realidades. A juntar a tal facto, porém, está também...
-
Uma Plataforma Para O Minho
Ao longo dos últimos meses, muito se tem debatido sobre a perda de competitividade do Norte do País e sobre a diminuição do seu protagonismo e dos seus índices de desenvolvimento face ao todo nacional e à vizinha Galiza. Normalmente, na lógica...
-
Futebol
Qual a lógica econômica do problema do futebol brasileiro?
Ok, temos vários pontos polêmicos, mas esta semana a vedete é o crowding out da regulação governamental que, em essência, diz que se eu tropeçar na geral, o clube é o responsável....
Economia