Políticas de industrialização
Economia

Políticas de industrialização


[1] Muitos países se utilizaram de políticas de industrialização nos últimos 100 anos para tentar se desenvolverem. Uma política de industrialização (alguns gostam de chamar de estratégia de industrialização) consiste em um conjunto de medidas com o intuito de desenvolver o setor de manufaturados da economia em detrimento de outros setores. A razão por detrás dessas medidas está no fato de que a grande maioria dos países desenvolvidos são países industriais (como exceção temos o exemplo da Austrália que exporta produtos primários), logo, pensam os planejadores de países pobres, se tivermos “chaminés” teremos “progresso”. Ou seja, a base “teórica” por trás da grande maioria das políticas que objetivam a industrialização é a percepção de que a indústria é uma forma naturalmente superior de atividade econômica em comparação com a agricultura ou os serviços.

[2] A indústria pode ser incentivada de várias maneiras. Desde o clássico subsídio direto passando por crédito subsidiado (como faz o BNDS) e até através do controle estatal direto de certas indústrias estratégicas, onde o Estado administra diretamente a indústria com recursos próprios. O caso mais extremo desse tipo de incentivo à indústria é o caso da União Soviética. Na URSS o estado controlava as indústrias pesadas e estabelecia cotas de produção para essas indústrias, que deveriam ser cumpridas com a utilização de recursos fornecidos pelo Estado. Era uma política de industrialização estritamente de cima para baixo. O caso do Brasil foi um pouco diferente, o governo Brasileiro criou várias estatais para administrar o processo de construção de certos segmentos da indústria, como a URSS fez. Mas, além da intervenção direta, o governo brasileiro fechou a economia às importações o que acabou elevando os preços dos bens importados, servindo de incentivo à produção interna desses mesmos bens. O nosso governo também subsidiou as empresas consideradas estratégicas através do BNDS e forneceu incentivos fiscais para o estabelecimento de multinacionais no Brasil (o exemplo clássico são as montadoras).

[3] Devemos diferenciar o conceito de política industrial do conceito de política de industrialização. O conceito de política industrial consiste em uma política com o objetivo de incentivar determinados setores de uma economia nacional, enquanto que uma política de industrialização consiste em um tipo de política industrial, focada no desenvolvimento das manufaturas. Um exemplo de política industrial que não consiste em uma política de industrialização são os subsídios agrícolas praticados pelos EUA e pela União Européia.

[4] Historicamente, os EUA e a Europa não se industrializaram via políticas públicas específicas com o objetivo de incentivar o desenvolvimento da indústria através de subsídios ou intervenção direta no setor. O processo de industrialização dos países hoje desenvolvidos na Europa e América do Norte foi do tipo natural. Com o desenvolvimento da economia de mercado, a maior produtividade do trabalho se traduziu em uma maior renda per capita o que se traduziu em uma expansão dos gastos de bens de consumo não alimentícios. Já os gastos com alimentos decresceram em proporção a renda. Conseqüentemente, as manufaturas cresceram em relação à agricultura, que ficou relativamente estagnada e perdeu espaço dentro desses países.

[5] Além desse fator, os países de maior nível de desenvolvimento possuem grande quantidade de capital investido per capita. E por isso tendem a ter também uma maior quantidade de capital investido por quilometro quadrado. Logo, a densidade de capital (e fatores de produção em geral) investido por unidade de recursos naturais tende a ser maior nos países desenvolvidos, o que favorece o desenvolvimento de vantagens comparativas na indústria. Enquanto que países com pouco capital acumulado per capita (que são países subdesenvolvidos) tendem a ter pouco capital acumulado por unidade de recursos naturais e logo esses países tendem a se especializar na exportação de commodities.

[6] Uma visão crítica sobre a idéia de políticas de industrialização nota que embora países pobres naturalmente tendem a ser exportadores de commodities enquanto que os países desenvolvidos naturalmente tendem a ser exportadores de produtos de teor tecnológico mais elevado, isso representa um caso de vantagem comparativa e que o desenvolvimento da indústria em comparação com a agricultura ocorre naturalmente com o processo de crescimento econômico. Uma industrialização forçada apenas leva a má alocação dos meios de produção. Esses meios de produção são alocados em direção a segmentos aonde seus retornos por unidade investida são menores do que poderiam ser em outros segmentos. Logo, embora um país possa desenvolver suas indústrias de chaminés através de subsídios, o que o Brasil efetivamente fez durante meio século (de 1930 - 1980), esse país não supera seu subdesenvolvimento e com o agravante de que se a política de industrialização é baseada na substituição de exportações temos uma redução do dinamismo da economia ao se isolar do mercado global.

[7] Os defensores das políticas de industrialização retrucam que embora as teorias que suportam a visão da industrialização como um fenômeno natural estejam corretas em muitos aspectos, essas teorias deixam de incluir a existência de externalidades de rede, que surgem com o desenvolvimento de certas indústrias. Essas externalidades não aparecem no balanço das empresas e por isso não representam um incentivo financeiro ao desenvolvimento desses setores. Logo, argumentam os defensores das políticas de industrialização, o governo deveria subsidiar esses setores para internalizar essas externalidades, criando subsídios piguvianos.

[8] Ou seja, embora subsidiar e proteger certas indústrias seja danoso para a nação no curto prazo, ao promover uma alocação de meios de produção ineficiente, no longo prazo essa alocação inicialmente ineficiente pode se tornar mais eficiente do que uma alocação gerada na ausência de interferência. Essas externalidades de rede vão se acumular com o desenvolvimento da indústria e no longo prazo vão superar os custos iniciais dos subsídios concedidos à indústria. Assim, são justificadas as políticas de proteção a indústria local, em detrimento temporário do princípio das vantagens comparativas.

[9] O problema é que Brasil protegeu as suas indústrias nascentes durante décadas e muitas dessas indústrias nunca se tornaram competitivas. Apenas com a abertura econômica e queda da proteção à indústria doméstica que a produtividade de algumas indústrias Brasileiras cresceu a ponto de se tornar competitiva internacionalmente. Outras indústrias simplesmente faliram com a abertura, após décadas de proteção, como foi o caso da indústria eletrônica e de eletrodomésticos (Gradiente). Além desse resultado empírico, podemos fazer uma crítica teórica com relação à teoria das externalidades de rede: Se as indústrias geram externalidades de rede, então os agentes econômicos iriam naturalmente criar organizações para beneficiar seus empreendimentos industriais, por exemplo, coordenando investimentos em certas zonas industriais para que cada indústria faça investimentos complementares. Esse processo deveria ocorrer naturalmente na ausência de barreiras a criação desse tipo de organização.

[10] Atualmente o Brasil está se integrando ao mercado global e nossas políticas econômicas não favorecem a indústria da forma como faziam no passado, particularmente no período de 1930-1980, tanto que a FIESP reclama constantemente para o governo. Temos uma política industrial, mas não temos uma política de favorecimento e subsídio ao setor industrial como tínhamos no passado. Com a nossa integração ao mercado internacional, o Brasil se tornou grande exportador de produtos primários, como minério de ferro e soja, ao mesmo tempo que a automatização da indústria reduziu os empregos no setor, logo, a proporção do produto nacional derivado da indústria vem se reduzindo gradualmente de 45% em 1987 e hoje representa apenas 28% do PIB (fonte: http://www.google.com/publicdata/explore?ds=d5bncppjof8f9_&ctype=l&strail=false&nselm=h&met_y=nv_ind_totl_zs&hl=en&dl=en_US#ctype=l&strail=false&nselm=h&met_y=nv_ind_totl_zs&scale_y=lin&ind_y=false&rdim=country&idim=country:BRA&tstart=315532800000&tunit=Y&tlen=28&hl=en&dl=en_US). Esse processo é ruim? Não podemos dizer que seja, ao menos que tenhamos que assumir que a indústria é uma atividade econômica “melhor” do que os outros setores da economia, o que é um julgamento de valor subjetivo. Podemos compreender que o processo de desindustrialização do Brasil é causado por dois processos distintos: a integração do Brasil com a economia global, que ocorreu a partir de 1990, somado ao processo de automatização da indústria, que reduz a proporção do trabalho empregado na indústria e a proporção do PIB.



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