Para pensar
Economia

Para pensar


Estava atualizando meus dados de taxa real de câmbio (contra o dólar) e montei o seguinte gráfico mostrando a evolução do real (BRL) e do peso argentino contra o dólar. Como os dados oficiais de inflação argentina subestimam a inflação verdadeira, usei também a medida de inflação da consultoria Buenos Aires City. A inflação americana é medida pelo PPI cheio (que captura melhor os preços de bens comercializáveis). Os resultados aparecem no gráfico abaixo.


O curioso é a semelhança no comportamento da taxa real de câmbio até o choque do terceiro trimestre de 2008, bem como o retorno das taxas de câmbio a aproximadamente os mesmos níveis após a superação da fase mais aguda da crise. Só não é mais curioso para quem se recorda que os termos de troca de ambos os países refletem de perto o comportamento de preço de commodities (Argentina um pouco mais sensível a petróleo, Brasil um pouco mais a minérios/metais, e ambos muito expostos às "soft commodities").

Conclui-se disto que:

(1) A política de manutenção de uma taxa de câmbio supostamente subvalorizada ("competitiva") na Argentina não resistiu à aceleração da inflação (provavelmente porque a política monetária que apoiou a intervenção não-esterilizada não foi a adequada à manutenção de inflação sob controle);

(2) Quando a crise adveio, e a taxa nominal de câmbio se depreciou no Brasil, mas não na Argentina, o ajuste do câmbio real foi mais intenso no Brasil. Isto parece decorrer de preços de bens e serviços serem mais vagarosos para se ajustar do que a taxa de câmbio (como dizia Friedman, a vantagem do câmbio flutuante é que apenas um preço precisa se ajustar). É possível que a saída mais rápida da crise no caso brasileiro esteja, ao menos em parte, associada à reação da taxa real de câmbio no pior momento da crise, mitigando o efeito sobre a economia doméstica;

(3) Assim, o ajuste do câmbio real na Argentina implicou desaceleração mais forte da inflação lá, já que o repasse de preços internacionais não foi mediado pela taxa nominal de câmbio.


Trata-se obviamente de um caso particular, não de um estudo econométrico de larga escala, embora as semelhanças entre os dois países (exportadores de commodities, com taxas de poupança relativamente reduzidas) deem mais peso à conclusão. Este resultado sugere que a estratégia de manter taxas desvalorizadas de câmbio em ambientes de baixa poupança (e choques positivos de termos de troca) não funciona tão bem como nossos quermesseiros insistem. As taxas nominais podem até se manter, mas esta combinação de política monetária e cambial não consegue manter a inflação sob controle para que a desvalorização nominal se torne desvalorização real.

Se tiver tempo estendo isto para outros países da região.



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