Palpite infeliz
Economia

Palpite infeliz


Voltando de férias cheguei a pensar que teria pegado o avião errado. Além de estarmos em meio a um ciclo de aperto monetário em que o Banco Central não fica com a fama de malvado (corretamente atribuída à política fiscal), ainda tive o prazer de ver “keynesianos de quermesse” empedernidos admitindo publicamente não só a necessidade de uma redução do gasto público, mas também que o BC está correto em elevar a taxa de juros.

Uma leitura mais atenta, porém, me revelou que havia realmente retornado ao Brasil. Mesmo reconhecendo que a redução do ritmo de crescimento da demanda é necessária para conter a aceleração da inflação e trazê-la de volta à meta, a quermesse acusa agora o BC de ter desperdiçado uma “janela da oportunidade” para reduzir a taxa de juros.

Segundo este raciocínio, o Copom poderia ter reduzido a taxa de juros ainda mais fortemente durante o ciclo de queda da Selic (o número mágico seria 8,5% a.a. contra os 11.25% a.a. observados), o que – dado o tamanho do aperto monetário em curso – implicaria uma taxa de juros ao final do processo também mais baixa. Em outras palavras, se o BC precisasse agora elevar a taxa de juros em, digamos, 3,5 pontos percentuais, a estratégia da quermesse implicaria a Selic ao final do ciclo no patamar de 12%, ao invés de hipotéticos, 14,75%.

Parece lógico, mas é uma falácia. O ponto crucial do “argumento” é a suposição de que o tamanho do aperto monetário é independente do nível inicial da taxa de juros, ou seja, o teríamos que promover o mesmo aumento da taxa de juros partindo de 8,5% ou 11,25%.

Isto, porém, só seria verdade se a expansão da demanda doméstica fosse igual sob taxas de juros tão distintas. A própria quermesse não parece acreditar nisto. De fato, se o ritmo de expansão da demanda doméstica não se alterasse em resposta a uma diferença de 2,75 pontos na taxa de juros, como justificar agora que “o BC tinha que se adiantar ao perceber que inflação estava mudando de patamar”, ou ainda que precisamos de uma “gestão de demanda” que limite o crescimento do consumo e do gasto público, pois “deixar as duas coisas crescendo tem impacto explosivo”?

Assim, caso a Selic tivesse sido reduzida a 8,5% como sugerido, o crescimento da demanda teria sido ainda mais vigoroso do que foi e a inflação teria se acelerado ainda mais rapidamente. Nestas circunstâncias não estaríamos discutindo um ajuste da Selic de 3,5 pontos percentuais (ou algo parecido), mas uma elevação muito maior.

É errado, pois, afirmar que o Copom deveria ter reduzido mais a taxa de juros no ciclo de afrouxamento monetário, a menos que se esteja preparado também para admitir que teria de aumentar ainda mais a taxa de juros nesta fase de aperto. Isto, porém, só elevaria a volatilidade das taxas de juros e resultaria no aparecimento de prêmios de risco mais significativos nas taxas de longo prazo, precisamente o contrário do que precisamos. Ainda bem que, apesar dos palpites, não é a quermesse quem conduz a política monetária.

TJLP

Pretendia mostrar os erros dos argumentos que pretendem negar o subsídio embutido na Taxa de Juros de Longo Prazo, em particular as noções que “não há subsídio, porque a TJLP é superior à inflação”, ou “não há subsídio porque a TJLP é superior à taxa paga pelo BNDES ao Fundo de Amparo ao Trabalhador”. Márcio Garcia (Valor Econômico, 1/8/2008, p. A-11), porém, já os demoliu. Só me resta recomendar a leitura do seu belo artigo (http://www.econ.puc-rio.br/mgarcia).

(Publicado 6/Ag0/2008)



loading...

- Testando Os Limites Da Cretinice
Esta eu preciso partilhar com os leitores do blog. Saiu no Valor de ontem, página C2, coluna assinada por Luiz Sérgio Guimarães. "Para analistas independentes, a ampliação do aperto monetário pode se transformar num tiro no próprio pé do BC. O...

- Uma Verdadeira Proposta Rudimentar
Parece haver uma crença generalizada acerca da existência de um almoço gratuito no atual arranjo de política monetária e fiscal no Brasil: bastaria cortar a taxa de juros para que o problema fiscal brasileiro fosse automaticamente resolvido. Como...

- Selic A 10% Não é Inflacionária?
Meu amigo Paulo Tenani escreveu recentemente um artigo em que defendia a tese que a Selic a 10% não seria inflacionária. A tese pode até ser verdadeira (torço para que sim; acho que não, pelo menos nas atuais circunstâncias), mas não pelos motivos...

- Copom Aumenta Selic
Copom eleva Selic a 7,50% e inicia ciclo de aperto monetário BRASÍLIA, 17 Abr (Reuters) - O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu nesta quarta-feira elevar a Selic a 7,50 por cento ao ano, tirando-a do piso histórico de...

- Brasil Reduz Taxa De Juros
"... Com o agravamento da crise econômica, o Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central decidiu nesta quarta-feira, por unanimidade, acelerar a queda dos juros e reduziu a taxa básica em 1,5 ponto percentual, cortando a Selic de 12,75%...



Economia








.