O caso Volpon
Economia

O caso Volpon


Em primeiro lugar, um aviso: embora não tenha, por motivos óbvios, nenhuma simpatia pela atual diretoria do BC, sempre mantive um relacionamento cordial com Tony Volpon, que hoje ocupa minha antiga posição na instituição e que se absteve de participar da última reunião do Comitê de Política Monetária, quando a taxa Selic foi elevada de 13,75% para 14,25% ao ano.

O motivo de sua abstenção foram críticas recebidas por, supostamente, ter antecipado seu voto em favor do aumento da Selic em reunião com economistas (em nome da transparência, eu estava entre os presentes). A frase que provocou a reação de senadores foi: “pessoalmente, vou votar pelo aumento de juros até que a nossa projeção esteja de maneira satisfatória apontando para o centro da meta”.

Muito embora políticos tenham interpretado a afirmação como antecipação do voto do diretor, no encontro propriamente dito ninguém a viu desta forma. A começar porque não havia dúvida que o BC seguiria o aumento da taxa de juros (a questão era se seria de 0,25% ou 0,50% ao ano).

No entanto, talvez o mais relevante para explicar a diferente reação de senadores e economistas à declaração seja o entendimento acerca da condução de política monetária no contexto de um regime de metas para a inflação.

Ter uma meta para a inflação não implica apenas explicitar um objetivo numérico; requer também, e principalmente, que o BC aja de forma consistente com a busca daquele alvo.

De fatos, bancos centrais que seguem este regime costumam se comportar de modo semelhante: aumentam a taxa de juros quando a inflação está acima da meta e a reduzem quando a inflação está abaixo dela.

Embora a regra pareça simples, há questões que a tornam um tanto mais complicada. Como já tive oportunidade de expor aqui, não se trata de olhar a inflação passada (por exemplo, os últimos 12 meses, ou, como defendido por um desavisado, os últimos 3 meses), mesmo porque não há nada que qualquer BC que não possua uma máquina do tempo possa fazer para alterar a inflação já ocorrida.

A política monetária só pode afetar a inflação futura, ainda mais em função das defasagens conhecidas entre alterações das taxas de juros e a resposta da inflação, afetada por vários canais distintos (atividade, taxa de câmbio, expectativas, etc). Todavia, esta não é conhecida, dentre outros motivos porque, ao menos em tese, o próprio BC deveria estar ativamente agindo para colocá-la na meta.

Por conta disto, BCs costumam lançar mão de um conjunto de modelos econômicos que, dentro de suas limitações, buscam responder uma pergunta crucial: se adotada a taxa de juros “x”, presumindo tal e qual trajetória para as variáveis relevantes (desempenho fiscal, crescimento mundial, etc.), a inflação “y” meses à frente estará acima ou abaixo da meta?

Caso a resposta seja “acima”, elevam-se os juros e vice-versa. Não há economista minimamente versado em política monetária que não entenda isto. Já senadores...


Volpon apenas verbalizou esta regra e é lastimável (embora, infelizmente, nada surpreendente) que o BC tenha se curvado à pressão. Mais lamentável, porém, é a tentativa de (presumidamente em nome de “preservar a independência do BC”) colocar a instituição e seus diretores na berlinda por motivos estritamente políticos.


Estou preocupadíssimo com a independência do BC


(Publicado 5/Ago/2015)



loading...

- E Aí, Vai Encarar?
“Numa política monetária (sic) de metas de inflação é muito mais razoável considerar as taxas médias dos últimos três meses como medida de inflação do que a taxa acumulada de inflação dos últimos 12 meses, como faz o Banco Central do Brasil”...

- No Mato Sem Coelho
Há momentos em que minha fé no debate econômico de alto nível, já não muito profunda, confesso, desaparece de vez e frequentemente por conta dos mesmos culpados. No caso, trata-se de mais um artigo de Yoshiaki Nakano (Valor Econômico, 12/agosto)...

- Quem Acordou A Fera?
A aceleração recente da inflação veio acompanhada de uma velha conhecida: a indexação, caracterizada pelo reajuste de preços e salários de acordo com a inflação passada. Nestas condições o custo para desinflacionar a economia é mais alto...

- ¿viva México?
Passei boa parte da última semana no México, país que, como o Brasil, adota o regime de metas para a inflação, operando, porém, de forma bastante característica. Embora a meta mexicana (3%) seja mais ambiciosa que a brasileira (nada de excepcional...

- Inflação 2011
Eu sempre tenho medo de inflação. Por sinal todo mundo deveria ter medo de inflação. No Brasil, onde tivemos décadas disso, deveria ser paranóia nacional. E quem falar "ah, mas dá pra tolerar inflação até uns 10% pra ter mais crescimento" deveria...



Economia








.