¿Viva México?
Economia

¿Viva México?


Passei boa parte da última semana no México, país que, como o Brasil, adota o regime de metas para a inflação, operando, porém, de forma bastante característica. Embora a meta mexicana (3%) seja mais ambiciosa que a brasileira (nada de excepcional nisto), o Banco de México apresenta um desempenho ruim: a inflação tem ficado sistematicamente acima de 3%, atingindo a meta em raros momentos; nunca abaixo dela.

Devido a isso, a brincadeira corrente entre economistas monetários afirma que – ao contrário de outros bancos centrais, os quais, ao perder a meta, devem escrever uma carta explicando como pretendem fazer para voltar a ela – o Banxico só escreve sua carta quando atinge aquela, prometendo solenemente nunca mais voltar a fazê-lo (economistas têm um senso de humor peculiar, reconheço). Isto dito, qual é o problema de apresentar uma taxa de inflação persistentemente superior à meta?

Em respeito à minha herança judaica, respondo à indagação com outra. Se, no melhor caso, a inflação está na meta e na maior parte do tempo acima dela, pergunto ao leitor qual a melhor previsão para a inflação asteca: um número acima de 3%, ao redor de 3%, ou abaixo de 3%? Imagino que a resposta da maioria dos 17 fiéis deve ser “acima de 3%”, replicando, diga-se, o comportamento dos economistas que contribuem para a versão mexicana da pesquisa Focus, que preveem inflação superior à meta não só para 2011, mas também para horizontes mais longos.

A preocupação com as expectativas não é um capricho de bancos centrais. Há preços na economia que, ao invés de serem ajustados diariamente, sofrem revisões periódicas, mantendo-se praticamente inalterados entre estas (por exemplo, e crucialmente, salários, cuja correção é anual). Ao fixar, pois, preços e salários é necessário levar em conta a inflação esperada ao longo do período em que tais preços permanecerão constantes, de modo a suavizar os efeitos da corrosão inflacionária. Obviamente, se a inflação esperada se eleva, também aumentam os preços correntes, em virtude das expectativas neles embutidas.

É tentador, embora errado, acreditar que, por conta desse fenômeno, a inflação se torne uma profecia autorrealizável. Face à inflação esperada acima da meta, um banco central ainda pode evitar a deterioração do processo inflacionário, mas a conta fica mais salgada. Torna-se necessário compensar a piora das expectativas com uma desaceleração mais profunda da atividade aumentando a taxa real de juros, isto é, a taxa nominal de juros deve subir mais do que a inflação esperada, com impactos sobre, por exemplo, a taxa de câmbio. Não por acaso, há bancos centrais que, mesmo em vista de piora das expectativas, relutam a utilizar a política monetária e acabam por acomodá-las.

No caso do México, em particular, pude ouvir de alguns interlocutores que, devido ao poder de mercado de grandes empresas e sindicatos, que elevam seus preços acima da meta, o Banxico não consegue produzir a convergência da inflação. Entretanto, à luz da discussão acima, espero ter deixado claro que o problema é exatamente o oposto: como o Banxico não entrega a inflação na meta, tanto empresas como trabalhadores incorporam expectativas mais altas nos seus preços, devidamente sancionados pela política monetária. Produz-se assim um equilíbrio perverso, no qual a inflação é elevada mesmo quando a economia cresce pouco, porque o banco central não se mostra disposto a buscar, de fato, a meta, mas acomoda a inflação acima dela.

De volta ao Brasil, na semana do primeiro Copom sob nova administração, frente a expectativas de inflação bastante superiores à meta, espero que as lições do caso mexicano estejam devidamente estudadas e que o BC mostre, mais uma vez, seu compromisso inequívoco com o regime de metas. Ou então, ¡que viva México! 

A meta ficou lá pra trás
(Publicado 19/Jan/2011)



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