Desenvolvimento regional e conflito federativo no Brasil (2)
Economia

Desenvolvimento regional e conflito federativo no Brasil (2)


Ricardo Lacerda

A constituição de 1988 estabeleceu uma série de mecanismos cooperativos nas relações federativas, reafirmando o compromisso do país com a busca de um desenvolvimento mais equilibrado territorialmente, tanto em termos econômicos quanto em termos sociais.

Os resultados já publicados pelo censo demográfico de 2010 confirmam o que outras pesquisas já mostravam: os mecanismos de políticas públicas e o ciclo recente de crescimento econômico promoveram importante redistribuição espacial dos benefícios do desenvolvimento, favorecendo as áreas mais pobres do país, ainda que todas as regiões tenham alcançado importantes ganhos ao longo da década passada.

Os conflitos federativos têm assumido a feição de uma disputa cega por recursos para fazer frente às crescentes demandas das populações, deixando de lado os princípios consagrados de cooperação horizontal, entre os estados, e vertical, entre união, estados e municípios.

FPE

O Fundo de Participação dos Estados (FPE) tem como objetivo promover o equilíbrio socioeconômico entre as entidades federativas, tendo como critério de repartição os tamanhos da população e da área territorial e o inverso da renda per capita. Em 1989, pactuou-se entre os estados, como contrapartida a outras vantagens auferidas pelos estados mais industrializados, destinar 85% do FPE para os estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste e 15% para as regiões Sul e Sudeste. Dentro dos grupos, aplicar-se-iam os critérios constitucionais.

Em 2010, provocado por alguns estados que se sentiam prejudicados, o STF pronunciou-se pela inconstitucionalidade das quotas regionais fixas de repartição (os 85%), visto que a realidade socioeconômica evolui no tempo, determinando a suspensão na distribuição dos recursos deste fundo, caso novas regras de repartição não sejam aprovadas pelo congresso nacional até o final de 2012.

União

Há disputas também em relação ao peso do FPE e FPM em relação ao total da receita arrecadada pelo governo federal.Para enfrentar as despesas geradas pela expansão das políticas públicas e pelo crescimento da máquina administrativa, as administrações federais têm optado por incrementar as receitas de contribuições como o Finsocial e CSLL, que não são repartidas com os estados e municípios, diferentemente do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPII e do Imposto sobre a Renda (IR), em que 40% têm tal destinação. Com isso, o IPI e do Imposto sobre a Renda (IR) caíram de 73,2% da arrecadação própria da receita federal, em 1988, atingiram 57,7% em 1990, e nos anos 2000, oscilaram em torno de 45% (ver gráfico a seguir).



Fonte: SRF. Extraído de GEFPE-CONFAZ, 2011.

Os maus resultados na arrecadação do IPI e do IR, em 2009 e 2010, frente aos compromissos crescentes, provocaram forte desequilíbrio nas finanças de estados e municípios mais dependentes do FPE/FPM, gerando uma forte insatisfação com a repartição dos recursos entre as esferas de governo.

Royalties

O imbróglio em torno dos critérios de repartição dos royalties de exploração marítima de petróleo parece ainda mais distante de uma resolução satisfatória.Em 2010, foram distribuídos como participações governamentais (royalties + participações especiais) R$ 21,7 bilhões, dos quais 40% pertencem a União, 56% a Estados e Municípios e os 4% restantes são destinados a fundos especiais e outros. Rio de Janeiro e Espírito Santo se apropriaram, junto com seus municípios, de R$ 10,6 bilhões, equivalentes a 49% do total distribuído no país e a 87,6% da parcela que cabe a estados e municípios, restando aos demais a quantia de 1,5 bilhão, ou 12,6% do total (ver tabela a seguir).



Fonte: ANP.

As participações governamentais (royalties + participações especiais) devem dobrar nos próximos anos, dado que a produção deverá passar de 2 milhões de barris/dia para 4 milhões de barris/dia em 2017, e triplicar até 2022, atingindo 6 milhões de barris/dia, implicando forte injeção de recursos nos Estados confrontantes, muito pouco compartilhados com os demais Estados.

Em dezembro de 2010, foi sancionada, com vetos,a lei 12.351, que definiu novas regras para a exploração de petróleo na camada do pré-sal, instituindo o sistema de partilha, com o que a distribuição das participações governamentais da exploração marítimade petróleo e gás deverá seguir os critérios mais equânimes entre estados produtores e não produtores, seguindo a sistemática do FPE.

O cerne da disputa atual é que 28% do petróleo do pré-sal já foram licitados pelo sistema anterior, regime de concessão, cujos resultados reforçam os ganhos dos estados produtores, Rio de Janeiro, Espírito Santo e também São Paulo, que inicia a exploração. Os demais estados não concordam em esperar até 2020 quando o pré-sal no regime de partilha começa a dar seus primeiros frutos e querem participar dos cerca de R$ 10 bilhões anuais de incremento da receita de petróleo.





Publicado no Jornal da Cidade 17/07/2011




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