Ricardo Lacerda
O mercado de trabalho vem sendo impactado pela redução do nível de atividade econômica. Em uma perspectiva de longo prazo, o Brasil vai registrar em 2015 a primeira redução no emprego formal desde 1999 e a taxa anual de desocupação deverá aumentar, o que não se verificava desde 2003.
O país está enfrentando a primeira onda mais grave de deterioração do mercado de trabalho desde o interregno 1995-1999, em que o Cadastro Geral de Emprego e Desemprego (CAGED) do Ministério do Trabalho registrou cinco anos sucessivos de queda do emprego formal.
PNAD Contínua
A Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar Continua do IBGE apresenta dados elucidativos sobre os efeitos da atual crise econômica e de governabilidade sobre o mercado de trabalho brasileiro e de suas regiões em 2015.
O contingente de pessoas ocupadas continuou crescendo no primeiro semestre de 2015, ainda que em ritmo muito menos intenso do que em anos anteriores. Os novos postos de trabalho, todavia, se concentraram em tipos de ocupação mais precárias, como trabalhador por conta própria, empregador ou trabalhador familiar auxiliar, enquanto caiu o número de pessoas empregadas no setor privado com ou sem carteira assinada.
Os resultados do primeiro e segundo trimestres de 2015 indicam que as famílias já estão buscando alternativas de ocupação para enfrentar a redução do emprego formal e a tendência de queda dos rendimentos. Como nos anos noventa, deverá se expandir um empreendedorismo de subsistência, em resposta à piora do mercado de trabalho.
Um fato significativo é que no segundo trimestre o contingente de pessoas que está trabalhando ou em busca de ocupação, que forma a força de trabalho (PEA) de um país, cresceu mais rapidamente do que a ocupação, ou seja a oferta de trabalho cresceu mais rapidamente do que a demanda por trabalho, fazendo aumentar a taxa de desocupação.
Um fenômeno que não se registrava há algum tempo é que o número de pessoas que ingressam no mercado de trabalho (ocupadas ou em busca de ocupação) cresceu mais rapidamente do que a população em idade de trabalhar (14 anos ou mais). Ou seja, revertendo tendência recente, quando melhorava a qualidade de inserção no mercado de trabalho e os rendimentos cresciam continuamente, as famílias sentiram a necessidade de estimular a entrada de um maior número de seus membros no mercado de trabalho.
Brasil e regiões
Na comparação entre o segundo trimestre de 2015 e o segundo trimestre de 2014, o contingente de pessoas ocupadas na economia brasileira aumentou em 159 mil, equivalente a uma taxa de incremento de apenas 0,2%. Entre o segundo trimestre de 2013 e o de 2014, o aumento havia sido de um milhão, quatrocentos e noventa e cinco mil pessoas, ou 1,7%. A região Centro-Oeste foi a única que apresentou queda na população ocupada.
O aumento da ocupação no conjunto do país, todavia, conviveu com uma deterioração muito acentuada do vínculo de trabalho. O incremento do número de trabalhadores por conta própria no segundo trimestre de 2015, em relação a igual período de 2014 respondeu por setenta e dois por cento das ocupações geradas e o de empregadores por dezenove por cento. Simplesmente um milhão, duzentos e cinquenta mil trabalhadores adicionais encontraram ocupação nessas duas categorias de trabalho. De outra parte, novecentas e setenta e uma mil pessoas perderam vínculo formal no período, queda 2,6% (ver Tabela)
Em termos espaciais, nas regiões em que o setor industrial tem peso mais elevado na ocupação, como Norte, Sudeste e Sul, a redução do contingente de empregados com carteira assinada foi proporcionalmente maior.
Em linhas gerais, a deterioração do mercado de trabalho foi relativamente menor no Nordeste que apresentou corte menos acentuado no emprego formal, 1,8%, frente a 2,6%. Isso não significa que o Nordeste tenha sido poupado dos efeitos da crise. A deterioração do mercado de trabalho também foi muito intensa na região.
A ocupação por conta própria, por outro lado, se expande celeremente em todas as regiões do Brasil. No Sudeste o crescimento desse tipo de vínculo alcançou notáveis 6,1% e no Centro-Oeste, 7,4%.
Tabela. Crescimento absoluto e relativo da população ocupada segundo posição na ocupação entre o segundo trimestre de 2014 e o segundo trimestre de 2015. |
Posição na ocupação principal | Brasil | Norte | Nordeste | Sudeste | Sul | Centro-Oeste |
| Variação absoluta da ocupação entre março-junho de 2014 e março-junto de 2015. (Em mil pessoas) |
Total da população ocupada | 159 | 30 | 64 | 79 | 0 | -14 |
Empregado no setor privado com carteira | -971 | -64 | -111 | -611 | -156 | -28 |
Empregado no setor privado sem carteira | -249 | -8 | -101 | -97 | 22 | -66 |
Trabalhador doméstico | -1 | 6 | -10 | 23 | -32 | 10 |
Empregado no setor público | 66 | -49 | 86 | 45 | 24 | -41 |
Empregador | 266 | 7 | 34 | 216 | 25 | -17 |
Conta própria | 989 | 113 | 162 | 468 | 131 | 115 |
Trabalhador familiar auxiliar | 60 | 25 | 3 | 34 | -15 | 12 |
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| Variação relativa da ocupação entre março-junho de 2014 e março-junto de 2015. (%) |
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Total da população ocupada | 0,2 | 0,4 | 0,3 | 0,2 | 0,0 | -0,2 |
Empregado no setor privado com carteira | -2,6 | -3,7 | -1,8 | -3,2 | -2,3 | -1,0 |
Empregado no setor privado sem carteira | -2,4 | -0,8 | -2,9 | -2,5 | 2,0 | -7,8 |
Trabalhador doméstico | 0,0 | 1,5 | -0,6 | 0,8 | -3,9 | 2,0 |
Empregado no setor público | 0,6 | -4,2 | 2,8 | 1,0 | 1,5 | -3,7 |
Empregador | 7,1 | 2,9 | 5,4 | 12,5 | 3,2 | -5,1 |
Conta própria | 4,7 | 5,4 | 2,4 | 6,1 | 4,3 | 7,4 |
Trabalhador familiar auxiliar | 2,2 | 5,0 | 0,3 | 6,6 | -2,9 | 10,5 |
Fonte. IBGE. PNAD contínua.
Publicado no Jornal da Cidade, em 27/09/2015
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