Comentário ao seu artigo Eistein, Israel e Churchill
Economia

Comentário ao seu artigo Eistein, Israel e Churchill


Recebi há algum tempo o comentário abaixo do Marcelo Castro, hoje na Pharo Management, um analista que eu respeito muito e não é de agora. Eu queria publicar antes, mas nunca me lembrava de pedir a autorização do Marcelo. Bom, antes tarde do que nunca.

* * *

Prezado Alexandre,

Aqui vai meu comentário:

De acordo com dados do FED (flow of funds), os bancos comerciais têm $ 1.4 tri the capital e $ 2.5 tri de dívidas não securitizadas. O capital inclui ações preferenciais, as dívidas são subordinadas ou seniores.

Se o Roubini estiver certo, os bancos comerciais americanos ainda têm $1.8 tri the perdas se colocarem os ativos podres a valor de mercado. Neste caso o sistema teria capital negativo de $400 bi. Está claro que é politicamente impossível que o Tesouro Americano capitalize todo o sistema de novo, sairia caríssimo para o contribuinte Americano, e no longo prazo diminuiria PIB potencial. Mas note as $2.5 tri de dividas. Se o capitalismo funcionasse como deveria ser, a conversão de uns 70% destas dívidas em capital seria a ordem natural das coisas, e resolveria o problema da alavancagem sem custo para o contribuinte. Os bancos teriam então $1.35 tri de capital, 750bn de dividas. Neste ponto seria possível atrair mais capital privado para suplementar a necessidade de capitalização robusta dos bancos.

O problema é a implementação desta mega reestruturação do passivo dos bancos. Eu desconheço a lei bancária americana, mas entendo que o FED possui enormes poderes com as instituições sob sua supervisão. Não vejo porque a implementação deveria ser tão rápida. Eu vejo os determinados passos:

1) FED realiza o estresse dos balanços e determina quem está insolvente, quem está bem (porque não fizeram isto antes? Esta é a pergunta para a qual não tenho resposta – afinal o Geithner era o presidente do FED de NY, e o FED deveria ter recursos para isso; é o maior banco central do mundo, em termos de staff per capita)

2) Coloca em “conservatorship” aqueles bancos insolventes. Num período de alguns meses, limpa todos os CDS e demais derivativos negociados em balcão, garante o mercado interbancário e os depositantes – muito semelhante ao que fez com o AIG

3) Depois de uns 6 meses, começa a liquidar os ativos podres, no mesmo molde da RTC dos anos 90;

4) No final do ano, vai sobrar um rombo no capital, é claro. Neste ponto o governo vai ter que decidir se adianta mais capital ou força a conversão de dívida em capital. O governo tem bastante tempo – eu chutaria uns 10 meses - para aprovar o marco legal necessário para estas operações.

5) Privatiza o banco resultante.

Nesta solução, não vejo risco sistêmico. As ações vão para zero, as dividas subordinadas também, as dividas sêniores devem sofrer alguma perda. Mas o mecanismo de crédito deve continuar (bancos estatais costumam emprestar dinheiro – vejam o Fannie Mae e Freddie Mac depois da intervenção), os depositantes vão ser protegidos, bem como o “money market”.

O governo poderia até mesmo colocar mais capital NOS BANCOS BONS, ou relaxar temporariamente as necessidades de capital NOS BANCOS BONS. Eu chamo de bancos bons, aqueles bancos que passaram no teste de estresse do balanço.

Vale lembrar que economia é a ciência do que se vê, e do que não se vê. Principalmente o último. O que se vê é que os bancos ruins não vão emprestar mais, e como são os maiores, a economia americana vai entrar em depressão. O que não se vê, é que se há demanda por crédito, os bancos menores, que não têm grande participação atual na economia, podem crescer. Investidores externos podem querer comprar os ativos podres vendidos na bacia das almas, financiando uma parte do crédito. Um caso típico do que se vê e o que não se vê foi a história do Banco Pactual. Como que é que o banco Pactual no Brasil passou de um banco de uns $300 milhões de dólares em 2000 (quando o Luis Cesar Fernandes saiu) para um banco de $2 bilhões em 2007? Como foi que o banco atingiu a liderança da abertura de capital de empresas nacionais? Competência certamente, mas também a visão de que depois de tanta crise (1999 e 2002), a atividade bancária oferecia oportunidades grandes num ambiente de pouca competição.

A solução me parece simples, o que não significa fácil. Obviamente a implementação será difícil, a oposição política enorme. Mas francamente não vejo outro jeito. Se o Churchill estiver certo, é por aí que vamos.

Um abraço grande,

Marcelo



loading...

- Alavancagem (ii)
"A causa principal do colapso do sistema financeiro global reside na queda abrupta dos valores dos bens. O efeito da queda nos preços dos ativos é multiplicado pela alavancagem que existia nos balanços dos grandes bancos. Em muitos casos, o valor total...

- O Cavaleiro Inexistente E O Visconde Partido Ao Meio
As últimas decisões do governo americano indicam que a estatização de parte do sistema financeiro é inevitável. Mesmo acreditando que a solução do problema passe pela estatização de instituições financeiras, ainda não me parece que isto,...

- Pensamentos Esparsos Sobre A Crise
“Caio disse: Alex você não acha que existe limites para intervenção estatal na economia? O tesouro pretende dar um trilhão de USD para os bancos com dinheiro do contribuinte, como os EUA não tem esse dinheiro vão ter que emitir títulos públicos...

- Alavancagem (ii)
"A causa principal do colapso do sistema financeiro global reside na queda abrupta dos valores dos bens. O efeito da queda nos preços dos ativos é multiplicado pela alavancagem que existia nos balanços dos grandes bancos. Em muitos casos, o valor total...

- Mr. Geithner Anuncia O Plano De Estabilização Financeira
E o anúncio foi mal recebido pelo mercado. Motivo: Falta de informação sobre detalhes. As principais iniciativas do plano são: uma nova rodada de injeções de capital em bancos, com custo estimado de US$100 bi a US$200 bi, a constituição de um...



Economia








.