Charlie don’t surf!
Economia

Charlie don’t surf!


Atendendo à sugestão da Janaína extraí o seguinte trecho da coluna de Clóvis Rossi na Folha (27/Mai/2008).

"Tempos atrás, cruzei em um evento com Luiz Gonzaga Belluzzo, um dos (poucos) economistas com que dá prazer conversar. Primeiro, porque é didático ao falar; segundo, porque não tem alinhamentos automáticos e, terceiro, por ser palmeirense. Belluzzo pôs em perspectiva os méritos do Plano Real na derrota da inflação ao lembrar que o dragão fora abatido no mundo inteiro. O Brasil, portanto, apenas surfara na onda."

A impressão que fica é que ninguém precisou fazer nada: a inflação caíra no mundo todo; por que não no Brasil? É a mesma "teoria" acerca da "inflação importada": sobe no mundo todo, logo aqui não haveria de ser exceção e, mais, não há o que fazer, já que tratamos de tendências globais. Em outras palavras, é o determinismo histórico aplicado à inflação.

Obviamente trata-se de uma bobagem. Uma das formas de ver isto é notar que Israel debelou sua superinflação em 1985, o México em 1988, a Argentina em 1991, mas nós só em 1994. Já a Colômbia e o Chile nunca passaram por hiper(super)inflação, a despeito mau exemplo de seus vizinhos. Como é que o “determinismo histórico” explica este fenômeno? Por que alguns países enveredaram pelo caminho de altas taxas de inflação e outros não? Por que a queda da inflação não ocorreu simultaneamente em todos eles, já que o “dragão fora abatido no mundo todo”?

A menos que alguém explicite com bastante cuidado os mecanismos de transmissão entre inflação externa e interna, a suposta observação inteligente não passa de uma constatação casual (e não causal). A inflação, nunca é demais lembrar, é sempre e em qualquer lugar um fenômeno monetário (que pode, ou não, ter uma raiz fiscal), ou seja, está associada à postura de política monetária de cada país. Não é algo que se pega por contágio (presumivelmente na piscina do clube, talvez até do Palmeiras), mas que se desenvolve pela sua dinâmica doméstica.

A exceção à regra – que não é realmente exceção, mas mais um caso particular – ocorre quando determinado país mantém uma taxa de câmbio fixa com relação à moeda de um outro país que sofre de inflação elevada. Neste caso, porém, o país que adotou o câmbio fixo abandonou sua política monetária e, consequentemente, adotou à do país que sofre de inflação elevada. A solução é abandonar o câmbio fixo, medida que, em geral, está ao alcance da autoridade monetária (dolarização, porém, deve ser bem mais difícil de reverter), como o exemplo de Singapura em 1973 (4?) nos mostra. Aliás, vários países que fixam suas moedas com relação ao dólar pensam agora em abandonar o peg precisamente por preocupação com inflação.

Daí minha pergunta (ao Belluzzo ou ao Clóvis Rossi). Como mesmo é que a inflação baixa no mundo se tornou inflação baixa no Brasil? Por que não ocorreu em 1986, quando Belluzzo estava no governo fazendo o Plano Cruzado e a inflação americana rodava abaixo de 2%?

Não tem jeito: para surfar na onda, precisa saber subir na prancha. Na frase imortal do Tenente Coronel Bill Kilgore: “Charlie don’t surf!”



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