O Plano Real e o vício quermesseiro
Economia

O Plano Real e o vício quermesseiro


Irresistível.

Algumas pessoas me pediram um comentário sobre este texto de Theotonio dos Santos Júnior:
Em primeiro lugar vamos desmitificar a afirmação de que foi o plano real que acabou com a inflação. Os dados mostram que até 1993 a economia mundial vivia uma hiperinflação [grifo meu] na qual todas [grifo meu] as economias apresentavam inflações [sic] superiores a 10%. A partir de 1994, TODAS AS ECONOMIAS DO MUNDO APRESENTARAM UMA QUEDA DA INFLAÇÃO PARA MENOS DE 10%. Claro que em cada pais apareceram os “gênios” locais que se apresentaram como os autores desta queda. Mas isto é falso: tratava-se de um movimento planetário (...)
Conclusões: O plano real não derrubou a inflação e sim uma deflação mundial [grifo meu] que fez cair as inflações no mundo inteiro.

Gosto disso. É uma afirmação cretina, porém científica, pois pode ser confrontada com os dados. E que diz Sua Majestade, A Evidência?

Em primeiro lugar que, certamente, a economia mundial NÃO vivia uma hiperinflação na qual todas as economias apresentavam inflações superiores a 10%. O gráfico abaixo mostra as taxas de inflação em 1993 e 1994 para países desenvolvidos (e alguns emergentes que já estavam bastante próximos dos desenvolvidos). Dentre estes apenas Grécia e Israel registravam taxas de inflação maiores que 10% naquele ano (Israel 11,3%; Grécia 11,9%). A média aritmética simples (não estou com paciência para ponderar os dados, ainda mais sabendo que a ponderação não mudará a conclusão) mostra uma inflação de 3,9% para este grupo. Talvez na Dimensão Z (de zurro, como sabemos) este nível represente hiperinflação; no planeta Terra, aqui no quadrante Alfa da galáxia, de forma alguma.


Fonte: FMI

A média recuou para 3,5% em 1994, que, ainda no quadrante Alfa, também não representa uma deflação global. Segundo o gênio em questão, foi esta queda que fez a inflação brasileira despencar de 40% ao mês para 20% ao ano (nos primeiros 12 meses do plano Real). Sinceramente, me faltam palavras para descrever os píncaros de cretinice atingidos por tal afirmação.

Fora isto, não faltam exemplos de países cuja inflação aumentou (e não aumentou pouco) entre 1993 e 1994. Nossos amigos venezuelanos, por exemplo, viram a inflação saltar de de 46% para 71%; os búlgaros de 64% para 122%, os turcos de 70% para 120%. Como nosso perito nos mecanismos de transmissão da inflação global para a inflação nacional explica este fenômeno? Será que não havia gênios locais nestes lugares?

Em suma: afirmações peremptórias baseadas nos delírios de "intelectuais" que não se preocupam em perder 5 minutos para uma checagem mínima dos dados são um vício nacional. Só com um processo cuidadoso de desintoxicação a academia brasileira se livrará do "vício quermesseiro".



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