Você ficou chocado, eu sei. A maioria dos manuais de Microeconomia, até de Economia, fazem esta distinção entre os tipos de bens em uma economia, e não temos porque, aparentemente, nos questionar quanto à idéia de que existem alguns bens que o mercado não é capaz de produzir e devemos então deixar o governo o produzir, certo? Errado.
Nisso entra na discussão o filósofo alemão Hans-Hermann Hoppe, um integrante da Escola Austríaca de pensamento, que seria a ala mais radical, se assim podemos dizer, dos libertários. Ele faz uma breve explanação a respeito da “igualdade” entre os bens públicos e privados, que sintetizarei a seguir.
Bens privados são aqueles que uma pessoa investe na fabricação para seu proveito de alguma forma, seja utilizando, ou vendendo para outros. Bens públicos, considerando que haja essa categoria distinta de bens, são aqueles que possuem as características de não rivalidade e não exclusão, e por isso devem ser produzidos pelo governo. Ou seja, eu utilizo, e não te impeço de usufruir, e, não exclui ninguém do consumo, como o Ar. O fato de eu respirar não te deixa sem ar. Mas não tem como produzir ar, então deixemo-los de lado por enquanto.
A distinção entre os conceitos de bem público e privado não existe, é mera ilusão, porque para algo ser considerado um bem, alguém tem que considerá-lo escasso (preceito econômico universal), em outras palavras, se preocupar com ele. Então até mesmo os bens mais privados como a cor da minha cueca ou o quadro dos Beatles no meu quarto podem ser bens públicos, na medida em que alguém passe a se preocupar com eles. Ou então, bens de característica pública, como o jardim na frente da minha casa, ou a cor do muro que a cerca, podem se tornar privados na medida em que as pessoas passem a deixar de se preocupar com eles. Portanto, um bem pode ser considerado mais público ou mais privado num dado momento e ir mudando suas características ao longo do tempo,o que inviabiliza a distinção entre os mesmos.
A idéia é que para um certo bem ser produzido, ao longo do tempo (possibilitando uma produção contínua), haja um certo número de pessoas dispostas a comprá-lo, porque senão não há incentivos à produção e há um desperdício de recursos. Por isso as pessoas produzem papel, carro, tênis, camiseta dos Beatles, etc. Se existe algum produto que não é produzido pelo mercado, é porque ele é pelo menos, um produto secundário, porque senão haveria interesse direto na produção dos mesmos pela iniciativa privada. Se o governo fosse produzir algum bem, ele seria, desde o principio, considerado secundário. E porque produzi-los então, se está sendo sinalizado que não é de necessidade primária e sendo assim, está se canalizando um fluxo de recursos que poderia ser destinado a outras áreas?
[Um breve adendo, com uma característica descrita pelo grande Ludwig Von Mises em As Seis Lições, com minhas palavras] O capitalismo nos proporciona algo que até então não havia existido. A concorrência, forma pela qual se submetem as empresas neste tipo de sistema tem o poder único de subordinar os empresários aos consumidores. A idéia de que os “industriais” são os soberanos e que eles fazem o resto da população, coitada, sofrer em suas mãos é uma falácia. Muito fácil é falir uma empresa nesse sistema capitalista. Basta que os consumidores percam a vontade / necessidade de adquirir os produtos por ela produzidos. Essa forma de mercado, competitiva, gerou esse aspecto peculiar ao sistema econômico, que faz com que a credibilidade se torne algo fundamental e deixe os empresários nas mãos da população. [Pronto]
O que me faz pensar que o governo deva ser encarregado pela justiça ou policiamento, e não firmas, em competição, os fazer? Podem muito bem duas empresas de policiamento, hipoteticamente, cuidar da cidade, e isso passar a ser muito mais eficiente para todos, porque elas estariam correndo risco de deixar de existir na medida em que seu papel passe a ser irrelevante para a sociedade, como conseqüência de um serviço mau executado. E não se deve pensar que haveria disputa hostil entre as diversas empresas de polícia como uma troca de tiros, brigando por espaço, e assim por diante. Isso porque a concorrência faria que essa briga simplesmente não acontecesse, na medida em que quem gostaria de um grupo de baderneiros prezando pela segurança do seu bairro? A demanda pelo produto dessa empresa iria diminuir drasticamente, ou talvez, acabar. Não é muito difícil imaginar essa situação e o quanto ela seria benéfica à sociedade. Agora, espero que você, leitor, ao menos esteja em dúvida sobre a existência de um bem em que o governo deva produzir.