António Damasio em entrevista
Economia

António Damasio em entrevista


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Edição sueca de "O Sentimento de Si"

P - Somos tão racionais como pretendemos?

R Não. Não somos racionais de forma natural. Temos a possibilidade de o ser mas mediante um tremendo esforço pessoal e devido a um contexto social e cultural que contribui para o tornar possível. Somos escravos das emoções e do ambiente. É possível sermos racionais se controlarmos as emoções negativas e potenciarmos as positivas.

P - E como é possível fazê-lo?

R - Abordo essa questão no meu último livro, "Ao encontro de Espinosa". Porque a questão tem muito que ver com a filosofia e a ética de Espinosa , que se confrontou com a questão de controlar as emoções negativas e fortalecer as positivas. Espinosa não tinha conhecimentos científicos, mas foi capaz de vislumbrar o futuro. Ambos os tipos de emoções - as positivas e as negativas - existem e a nossa racionalidade depende do equilíbrio entre ambas. Hoje a neurobiologia dá-nos os instrumentos necessários para compreender o que ocorre no cérebro e quais os factores que desencadeiam essas emoções.

P - Essa capacidade recoloca o eterno problema ético de qual o uso da ciência que é correcto e qual é menos nobre, e onde está a fronteira.

R - Temos que envolver os cidadãos neste debate, a sociedade deve estar informada para que decida quais os usos das descobertas científicas que são aceitáveis. Mas este mesmo dilema ocorre também acerca do uso correcto ou incorrecto dos meios de comunicação, do lazer e de outros aspectos da nossa sociedade. Para dirimir o que é correcto e o que não é, e para conhecer os riscos, necessitamos sobretudo de educação de qualidade. Nisto deve envolver-se a escola, os meios de comunicação, o mundo académico e os próprios cientistas.

P - Defende que o indivíduo faz uma primeira aproximação de forma emotiva, e só depois a avalia e, se for ocaso, corrige de forma racional, sopesando as opções?São imprescindíveis ambos os mecanismos, e se faltar uma deles, estaremos perante una anomalia?

R - Tradicionalmente pensava-se que as decisões correctas deviam ser tomadas sem a intervenção das emoções, baseando-se apenas na razão e na racionalidade. Mas eu defendo que as decisões correctas exigem três elementos: emoção, conhecimento e razão, e que devem operar em equilíbrio e mediante uma "negociação" entre o leque de possibilidades que permitem. A emoção existe para recordarmos decisões passadas, boas ou más, e as suas consequências. A emoção é uma bengala que nos ajuda a escolher entre opções e possibilidades, e que se complementa com o conhecimento e a razão.

P - Então Pascal tinha razão quando defendia que "o coração tem razões que a razão desconhece"?

R - Sim. Refiro essa citação no meu primeiro livro, "O Erro de Descartes
", para pôr em evidência a intuição de Pascal sobre o valor das emoções e como nos ajudam a tomar decisões e a desenvolvermo-nos com maior humanidade.

P - Estará cada um de nós programados de antemão para ser mais o menos sociável, ou altruísta?

R - Não. Todos somos muito semelhantes e, ao mesmo tempo, muito singulares. Temos umas características de comportamento e de personalidade comuns, mas também somos únicos e irrepetíveis como consequência do nosso processo individual de desenvolvimento e da nossa biologia, que marca as tendências. Tudo isso é o resultado de variações naturais e do nosso desenvolvimento, no qual estamos condicionados pelo ambiente: o meio em que estamos mergulhados e sobre o qual também exercemos influências.
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  • Entrevista com Desidério Murcho, Junho.2000



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