Economia
Amazônia, energia elétrica e sustentabilidade.
Hoje, no VALOR ECONÔMICO, Joaquim
Francisco de Carvalho e Ildo Luís Sauer escrevem sobre “Amazônia, energia
elétrica e sustentabilidade”.
Imagens colhidas de satélites meteorológicos
mostram que o clima da Amazônia exerce forte influência sobre os regimes
hidrológicos e pluviométricos de toda a América do Sul, e garante a
estabilidade climática, fluvial e pluviométrica - portanto, a sustentabilidade
da agricultura - de todo o Brasil.
Assim, a Amazônia vale pela importância de seus
próprios ecossistemas. Enquanto não se acumularem e testarem suficientes
conhecimentos científicos e técnicos sobre os intrincados ecossistemas
regionais, a Amazônia deve ser mantida em sua integridade, evitando-se,
principalmente, a pecuária extensiva, a ampliação de monoculturas de exportação
(soja, milho etc.), a exploração madeireira e a implantação de novos projetos
de mineração.
Apesar da polêmica desencadeada pelas
organizações ambientalistas, a alternativa mais interessante para se
desenvolver a Amazônia, mantendo a sua integridade, seria a de aproveitar o
potencial dos recursos naturais renováveis da região, com projetos de turismo
ecológico, extrativismo e geração de energia elétrica. Além de serem excelentes
geradores de empregos e uniformizarem a distribuição de renda na região, o
turismo ecológico e o extrativismo dependem da integridade do ecossistema.
Quanto è geração de energia elétrica, a Amazônia
tem um dos maiores potenciais do mundo e, mediante políticas inteligentes e
rigorosamente aplicadas, as empresas públicas e o empresariado do setor de
geração elétrica deverão se transformar nas maiores defensoras do ecossistema
amazônico. Alterações causadas por desmatamentos para abrir terrenos para
plantações de soja e milho, criação de gado, projetos de exploração mineral e
outros comprometerão o potencial hidrelétrico, inviabilizando as próprias
usinas.
De acordo com a Empresa de Pesquisa Energética
(EPE), o potencial hidrelétrico brasileiro é de 268 GW, dos quais apenas 30%
estão em aproveitamento. A região amazônica detém 65% do potencial não
aproveitado.
Admitamos que, por motivos de caráter social e
ambiental, os planos de expansão do sistema elétrico sejam reformulados, para
se limitar em 80% o potencial hidrelétrico a aproveitar na Amazônia - e que as
hidrelétricas a serem implantadas naquela região alaguem 0,2 km2 /MW. O que é
uma hipótese conservadora, pois a maioria dos aproveitamentos existentes em
outras regiões e em construção, na própria Amazônia, apresenta uma relação bem
menor entre área inundada e potência instalada. Neste caso o aproveitamento do
potencial hidrelétrico amazônico ocuparia cerca de 0,4% da área da região, ou
seja, menos do que os grandes projetos agrícolas ou de pecuária.
Mesmo assim o Brasil poderá adicionar uma
capacidade hidrelétrica de 148,7 GW aos 79,3 GW já instalados. Somando-se a
isto os 17 GW das pequenas hidrelétricas, teremos uma capacidade hidrelétrica
total de 245 GW.
No entanto, as ONGs ambientalistas optam por
uma posição fundamentalista, baseada no dogma de que a Amazônia é intocável.
É certo que os ecossistemas amazônicos são delicados, mas isso não significa
que ficarão estacionados em sua condição primordial, se é que se possa falar em
condição primordial de sistemas que se vêm alterando desde a origem, como todos
os ecossistemas terrestres.
Com ou sem hidrelétricas, os povos indígenas
(que fazem parte do ecossistema amazônico) vão continuar com as derrubadas e
queimadas de matas, tradicionais em sua agricultura. E ainda há as
mineradoras, o agronegócio e os pecuaristas, sobre os quais as ONGs ambientalistas
ficam silenciosas, preferindo vociferar contra o aproveitamento do potencial
hidrelétrico, que poderá dar ao Brasil um sistema elétrico limpo e sustentável.
A interligação do sistema hidrelétrico com o
sistema eólico permitiria que parte da energia gerada pelas centrais eólicas
ficasse "armazenada", na forma de água acumulada nos reservatórios
hidrelétricos - de maneira semelhante às malhas termo-eólicas de alguns países
europeus, nas quais a energia dos parques eólicos permite que se economize gás
natural ou óleo combustível. Segundo o Centro de Pesquisas em Energia Elétrica
da Eletrobras, o potencial eólico brasileiro (com turbinas em torres de 50
metros) é de 143 GW. Note-se que, com torres mais altas, o potencial é maior.
O sistema hidroeólico poderia operar em sinergia
com usinas termelétricas a biomassa, pois a frota automotiva brasileira é em
grande parte alimentada com etanol, forçando a produção do bagaço de cana em
escala suficiente para alimentar termelétricas de pequeno e médio porte,
totalizando, em conjunto, uma capacidade da ordem de 15 GW, segundo a União da
Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica).
Assim, aproveitando apenas fontes primárias
limpas e renováveis, o sistema interligado hidroeólicobiotérmico teria uma
capacidade conjunta de 403 GW, podendo gerar 1.589 GW por hora firmes por ano,
admitindo-se, conservadoramente, que o fator de capacidade do sistema integrado
será igual à média ponderada dos fatores de capacidade de cada sistema
isoladamente, que é 0,45.
Por outro lado, de acordo com o IBGE, a
população brasileira deverá se estabilizar em 215 milhões de habitantes, por
volta do ano 2040, de modo que o sistema integrado hidroeólicobiotérmico
teria um potencial suficiente para oferecer à população 7.390 kWh por habitante
por ano, equiparando o Brasil a países de alto nível de qualidade de vida, tais
como a França, a Alemanha e a Grã-Bretanha.
A reserva de segurança do sistema
hidroeólicobiotérmico seria constituída pelas termelétricas a gás já existentes
nas diversas regiões do país. Portanto, ao contrário de alguns países europeus
e do Japão que, em médio prazo, não têm melhor alternativa, o Brasil não
precisa correr o risco de gerar em centrais nucleares a energia elétrica de que
precisa ou precisará.
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