A mulher barbada e a prole de Bresser Pereira
Economia

A mulher barbada e a prole de Bresser Pereira


Apesar das contribuições valiosas do Chutando a Lata (“Se fosse possível gerar desenvolvimento com câmbio, já estaria decretado o fim da pobreza.”), do Galego (que apontou para o descaso dos autores em examinar variáveis omitidas em particular, e os dados em geral) e do Rogério Ferreira (que indicou que este mesmo blog já postou sobre a pobreza do modelo usado pelo Professor Gala em sua apaixonada catilinária a favor de políticas públicas visando a concentração de renda no Brasil), fica difícil não dar o prêmio para o anônimo das 16:21. Confesso que nem sob tortura teria talento para compor um Haikai que resuma com tanta eloqüência a obra de Gala e Libanio:




Texto prolixo
que nada acrescenta
eu mando pro lixo




Aplausos!

O Haikai do anônimo também me convida a debater sobre porque perderia tempo policiando a quermesse. Meu interesse, admito, reflete um tanto de atração pelo deviante. Assim como uma criança visitando o circo, admirando a mulher barbada, existe um certo prazer proibido em ler alguns dos piores trabalhos em Economia que ganharam a honra da assinatura de um ‘acadêmico’.





Substantivamente, existe um equívoco original na análise de muitos membros da prole de Bresser Pereira. Há uma confusão entre sintomas, tratamento e doença. Para a quermesse da 9 de julho, o câmbio apreciado é a doença que vai causar a desindustrialização que pode ser evitada pelas autoridades monetárias (“By avoiding excessive appreciations, monetary authorities would contribute to the development of an advanced manufacturing industry...”). Uma analogia médica é útil. Imagine um médico que, convencido que a morte é frequentemente precedida por febre alta, recomenda que seus pacientes durmam em uma banheira com cubos de gelo, e não ministra tratamento algum para outras condições subjacentes.

A partir dessa confusão entre sintomas (febre, câmbio valorizado) e causas subjacentes, a prole de Bresser prepara uma salada de recomendações esdrúxulas e artigos ‘acadêmicos’ beirando o humor involuntário visando combater a febre sem lidar com a doença. Como os autores ‘sabem’ que o problema é o câmbio, e convivem com outros membros da prole que compartilham o mesmo diagnóstico, a argumentação é preguiçosa e cheia de furos. Apontam com autoridade para as severas conseqüências da doença dos holandeses sobre a Holanda, mas aparentemente o amarelão em estágio avançado rouba-lhes a energia para achar uma referência sequer sobre tal fenômeno. Os autores citam a Austrália do século XIX como exemplo de país padecendo da maldição dos recursos naturais, talvez na ignorância que a Austrália seja... a Austrália. Os autores mencionam a taxa real de câmbio estável da China, talvez em referência a alguma China mítica e idealizada (a China não é um país com taxa real de câmbio particularmente estável).

- Mamãe, olha a mulher barbada! A barba dela é maior que a do Tio Moshe!

Para não me alongar, vou apenas tangenciar a questão teórica. Os autores apresentam dois modelos para justificar suas recomendações de política econômica, mas estranhamente não notam que nenhum dos modelos em questão aborda a questão setorial que aparentemente é a base de seus argumentos. Seria pedir demais que autores que advogam políticas para reduzir os salários reais e transferir poder de compra da massa trabalhadora para os capitalistas industriais com o objetivo expresso de transformar a estrutura produtiva da economia sejam ao menos capazes de tirar da gaveta um modelo econômico em que a economia tenha uma estrutura produtiva? Pois os autores tem a pachorra paquidérmica de falar sobre câmbio real quando nenhum dos modelos que apresentam tem mais de um bem (no primeiro modelo os capitalistas aparentemente aplicam o mark-up sobre um bem composto)!

- Mamãe, aquele moço é o engolidor de espadas!

Mas a atração principal do artigo são os estudos de caso apressadíssimos da Indonésia e Chile. Os autores argumentam que “a laissez-faire type management of the macroeconomic policy would most likely lead to greater dependency of international commodity markets”, mas não explicam o que seria um “laissez-faire type management of the macroeconomic policy”. Algum desavisado pensaria que um banco central que adota metas de inflação, não intervém no câmbio por mais de uma década e que aboliu controles de capitais seria um exemplo. Mas não para os autores! Desavisados também não veriam nada de extraordinário nas maxi-desvalorizações cambiais na Indonésia dos anos 80, afinal tais eventos ocorreram no Brasil e em tantos outros países da América Latina no mesmo período.

-- Quieto, Rodriguinho! É apenas um pós-keynesiano.

E assim concluem: “our main hypothesis is that competitive currencies contribute to the existence and maintenance of a dynamic manufacturing sector in the economy”. Estranhamente, os autores, depois de 27 páginas, não testaram tal hipótese e ainda pensam que têm um artigo.

--Meu Deus, Rodriguinho, como você sabe que aquele gordinho é o engolidor de espadas?!?



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