A efetividade da lei seca
Economia

A efetividade da lei seca


Há alguns meses entrou em vigor em todo o território nacional uma lei que proíbe que os condutores de veículos automotores tenham qualquer nível de alcoolemia, a chamada “Lei Seca”. Como defensor dos princípios da liberdade dos indivíduos, endosso que qualquer pessoa tenha o direito de beber o quanto quiser, já que ninguém melhor do que a própria pessoa para julgar os custos e benefícios de sua decisão. No entanto, ao dirigir bêbado um veículo, um cidadão gera externalidades negativas, pois está  ferindo a liberdade de terceiros.  Por isso, uma legislação para impedir esse comportamento se faz necessária.

A promulgação dessa lei gerou grande repercussão entre todos os membros da sociedade, incluindo motoristas e donos de estabelecimentos comerciais que têm como fonte de receita a venda de bebidas alcoólicas. No entanto, o que muita gente parece não perceber é que, mesmo antes da “Lei Seca”, JAMAIS se permitiu o comportamento de risco do motorista. A diferença se deu no tocante a fiscalização, que aumentou enormemente sob a forma de “blitz”. Passados alguns meses, vale ressaltar uma experiência própria: a fiscalização caiu abruptamente.  E é sob esse prisma que torna-se possível usar uma das possíveis abordagens para compreender a efetividade dessa lei.

O uso de uma simples ferramenta matemática pode ajudar a compreender melhor o comportamento de motoristas diante de uma legislação. O valor esperado (esperança matemática) de uma variável X é a média ponderada de seus possíveis resultados, com probabilidades determinando o peso para cada um desses resultados.

Matematicamente:  VE= ∑p.X,

 onde p é a probabilidade de ocorrer o resultado de X.

Vamos supor que “X” seja o custo total arcado pelo condutor quando o mesmo comete alguma infração no trânsito e “p” seja a probabilidade do condutor ser autuado quando comete uma infração. Nesse caso, a fórmula se torna simplesmente: VE = p.X.

Agora vamos imaginar dois cenários. No primeiro, vamos supor, como alguns defendem, que a legislação se torne extremamente rígida (por exemplo, multa de R$ 1 milhão de reais e suspensão do direito de dirigir por 20 anos) para alguém que dirija bêbado. Se esse aparato legal não for acompanhado de fiscalização, o valor esperado de transgredir  será baixo, pois o “p” na equação será muito pequeno. Isso implica que mesmo indivíduos avessos ao risco podem querer guiar embriagados. Num outro cenário, a legislação não é tão dura. Porém, a fiscalização é bem maior. Nesse caso, mesmo “X” não sendo tão grande, o valor de “p” é considerável, fazendo com que o valor esperado seja maior que no cenário “1”, induzindo o motorista a pensar duas vezes antes de assumir a direção alcoolizado. Com esse simples exemplo em mente, pode-se dizer que não há necessidade da “tolerância zero”, já que é de conhecimento comum que pessoas que bebem uma, ou até duas latas de cerveja podem tranquilamente dirigir. Todos então ficariam em melhor situação: tanto os cidadãos que poderiam beber moderadamente, e, ao mesmo tempo, deixariam de ser encorajados a tomar um comportamento de risco – diminuindo o número de acidentes de trânsito e vítimas fatais –  quanto os donos de bares e restaurantes que não teriam que arcar com tantos prejuízos em função da lei.

A lição tirada do exemplo acima é a seguinte: se o indivíduo tiver ciência de que existe uma probabilidade razoável de ser encontrado bêbado ao dirigir um veículo, ele não vai tomar esse comportamento. O rigor da lei está na sua fiscalização, e não nos seus efeitos punitivos.




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