Sem paliativos.
Economia

Sem paliativos.



Editorial de hoje no GLOBO comenta sobre a atual situação econômica brasileira e alerta para a necessidade de ajustes internos, considerando que a crise internacional pode continuar por vários anos.     

Por algum tempo, o governo alimentou a ideia que o Brasil poderia continuar crescendo, alheio à crise financeira internacional, até porque o país estaria mais voltado para a Ásia, onde a demanda por nossas exportações continuava firme e forte. Era, evidentemente, uma ilusão, pois seria apenas uma questão de tempo a Ásia também sentir os efeitos da crise.

E foi o que aconteceu. Diante da perspectiva de baixo crescimento nos mercados mais desenvolvidos, as economias asiáticas, muito impulsionadas por exportações, não têm conseguido manter o mesmo ritmo acelerado de expansão do passado. A Ásia certamente permanecerá com mais dinamismo e vigor do que outras partes do mundo, mas não mais a ponto de provocar uma pressão de demanda explosiva, capaz de sustentar as cotações de matérias-primas industriais e agrícolas lá nas alturas.

A participação do comércio exterior no conjunto da economia brasileira é relativamente pequena, mas é essa troca de mercadorias que na verdade funciona como força motriz do crescimento. Historicamente, é a partir do impulso das exportações que o mercado doméstico ganha velocidade.

Sem esse impulso, o governo tem recorrido a medidas pontuais para estimular o consumo interno de segmentos industriais que viram a sua demanda minguar nos últimos meses. Setorialmente são iniciativas que até podem ser válidas, desde que vistas como paliativos, de efeito passageiro. Não será com tais estímulos que a economia recuperará o impulso de crescimento sustentável.

O nó da questão está nos investimentos. Mesmo com ritmo de crescimento moderado, a economia brasileira se depara com muitos gargalos em sua infraestrutura. Sem removê-los, a economia sempre enfrentará dificuldades quando tentar crescer mais rapidamente.

Viabilizar investimentos, públicos e privados deveria ser o foco da política econômica, e para tal há desafios importantes a serem superados. O principal deles é um aumento de poupança doméstica. Para financiar investimentos, a economia brasileira não pode contar indefinidamente com o reforço da poupança externa. A prática nos mostra como os humores dos mercados financeiros mudam, às vezes até sem fundamento.

O Brasil tem um nível de poupança doméstico baixo, entre outras razões porque a economia do país teve que conviver, por anos a fio, com um desequilíbrio estrutural nas finanças públicas. Em vez de financiar investimentos, parte da poupança doméstica foi deslocada para a cobertura dos déficits governamentais.

A conjuntura atual tem favorecido a redução desses déficits, pois o componente financeiro tende a diminuir com a queda das taxas básicas de juros. Então, o país está diante de uma oportunidade para ampliar a poupança doméstica, redirecionando-a para investimentos. Nesse caso, o governo terá de redobrar a atenção com os gastos de custeio, não cedendo a pressões para a concessão de aumentos de salários ou concessão de benefícios. Se cair na tentação populista, perderá a oportunidade, e dificilmente a economia brasileira encontrará outro caminho para assegurar um razoável ritmo de crescimento nesse ambiente de crise internacional, que pode perdurar ainda por vários anos.



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