Economia
Por quem os juros sobem
Hoje o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) deve se decidir por mais uma rodada de elevação da taxa de juros básica da economia. Não tenho dúvida que, até entre os meus 18 leitores, há mais de uma alma se perguntando por que, afinal de contas, se a taxa de juros no Brasil já é tão alta, seria necessário elevá-la ainda mais.
A resposta simples é porque a inflação, não apenas a corrente, mas, principalmente, a esperada, se encontra acima da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (4,5%). De fato, a inflação nos últimos 12 meses se encontra ao redor de 6%, enquanto o consenso de mercado e as projeções do próprio BC sugerem que a inflação em 2011 e 2012 deve superar a meta, caso a Selic não suba.
Mas a resposta simples é insuficiente. Uma mente mais inquisitiva poderia perguntar se uma taxa de juros mais elevada é mesmo um tratamento eficaz contra a aceleração da alta dos preços. Por exemplo, se a inflação resulta de preços de alimentos, por conta da elevação dos preços mundiais de commodities agrícolas, como se ouve aqui e acolá, que bem poderia fazer um aumento da taxa de juros?
A verdade, contudo, é que a inflação decorre de fenômenos bem mais amplos que os preços de alimentos. O núcleo de inflação (que retira os preços de alimentos, assim como tarifas públicas) indica que os preços estariam aumentando a um ritmo de 6,5% ao ano. Destaco adicionalmente que o IPCA medido de 16 de janeiro a 15 de fevereiro revela que mais de 73% dos itens não-alimentícios sofreram aumento no período contra 69% em janeiro, revelando que o processo inflacionário se encontra bastante difundido.
E, antes que alguém alegue que se trata de problema sazonal, noto que esta medida de difusão é a mais alta para o mês desde 2003, merecendo a duvidosa honra de ser a segunda maior para fevereiro desde o estabelecimento formal do regime de metas para a inflação.
Isto dito, se as causas da aceleração inflacionária vão além do comportamento do preço de alimentos, quais são elas? Ainda que setores menos comprometidos com a estabilidade de preços insistam em “problemas estruturais” ou “conflitos distributivos” (que, misteriosamente, se exacerbam apenas quando a economia cresce em ritmo forte), a verdade é que a inflação varia essencialmente em linha com o grau de pressão sobre a capacidade produtiva da sociedade. Quando o mercado de trabalho aperta, o nível de utilização de capacidade na indústria sobe e os (muitos) gargalos da infra-estrutura (como os recentes “apagões”) pipocam mais que o David Beckham, os custos unitários se elevam e as condições de demanda permitem seu repasse generalizado.
Sob estas circunstâncias, não há alternativa para conter o processo inflacionário que não passe pela redução da pressão sobre a capacidade produtiva e, goste-se ou não da conclusão, isto requer que o crescimento fique, por algum tempo, abaixo do potencial. Isto poderia ter sido evitado se o combate à inflação tivesse sido iniciado mais cedo, promovendo a convergência do crescimento para seu potencial (o chamado “pouso suave”) ainda em 2010, mas este leite já se encontra devidamente derramado.
É bom que se diga, também, que esta desaceleração poderia se dar preservando o consumo e o investimento privados, desde que o governo tomasse para si o fardo de reduzir seu dispêndio. Obviamente, quando o responsável pelo caixa afirma que “os gastos públicos não têm impacto inflacionário no Brasil”, fica claro que esta não é a prioridade, ainda mais depois de um “corte” de despesas que, na verdade, implica seu aumento com relação ao observado em 2010.
Assim, leitor, quando perguntar por quem os juros sobem, saiba que eles não sobem por ti, mas por quem desperdiçou (e, parece, desperdiçará) todas as oportunidades de lidar com o problema antes que isso se tornasse necessário.
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É minha! Ô..ô...Não! |
(Publicado 2/Mar/2011)
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