Ricardo Lacerda
Permeia certa confusão no debate a respeito das dificuldades que a economia brasileira vem enfrentando em seu crescimento nos últimos anos, em que fatores referentes a problemas estruturais de competitividade são colocados no mesmo cesto das dificuldades provenientes dos impactos negativos do longo período recessivo da economia mundial.
Quando nos referimos ao segundo conjunto de fatores, aquele relativo às dificuldades do cenário externo, não é com intenção de descartar ou atenuar o peso dos problemas estruturais, mas sim de colocá-lo na devida perspectiva e dimensão. No artigo de hoje será examinada a piora acentuada no comércio exterior brasileiro nos últimos dois anos.
Saldo comercial
O saldo da balança comercial brasileira quase que sumiu em 2013. Depois de somar US$ 29,8 bilhões em 2011, o saldo comercial caiu para US$ 19,4 bilhões, em 2012, até se tornar quase inexpressivo em 2013, US$ 2,6 bilhões (ver Gráfico). Foi o pior resultado da balança comercial desde que foi interrompida a longa série de saldos negativos registrados entre 1995 e 2000.
Fonte: MDIC-SECEX
Como foi possível reduzir o saldo em US$ 16,8 bilhões em apenas um ano, depois de já ter caído US$ 10,4 bilhões no ano anterior, totalizando US$ 27,3 bilhões nos dois anos. O leitor pode se perguntar o que aconteceu de tão drástico para produzir um resultado de tal monta em um período curto de tempo.
Na comparação entre 2011 e 2013, a redução do saldo comercial resulta quase que no mesmo montante da diminuição das exportações e do aumento das importações, nos seguintes valores, US$ 13,9 bilhões e US$ 13,4 bilhões, respectivamente.
Exportações
Se as exportações brasileiras foram muito estimuladas pelo ciclo longo de valorização das commodities no mercado internacional até a eclosão da crise em 2008, a desaceleração da economia mundial e, particularmente, a perda relativa de fôlego no crescimento da China, nos anos mais recentes impactaram negativamente no desempenho de nossas exportações.
Apenas para ilustrar, o volume do comercio mundial de bens e serviços cresceu à taxa média de 5,7% ao ano entre 2003 e 2008, daí em diante desacelerou para menos da metade, 2,5% ao ano, entre 2009 e 2013.
O exame da trajetória das exportações brasileiras em um período mais extenso pode ser esclarecedor das atuais dificuldades. As exportações brasileiras apresentaram crescimento espetacular nos seis anos contados entre 2003 e 2008. Saltaram de US$ 60,4 bilhões, em 2002, para US$ 197,9 bilhões, em 2008, média de crescimento de simplesmente 21,9% ao ano.
No primeiro mergulho da economia mundial na atual crise, as exportações brasileiras despencaram, com uma retração de US$ 44,9 bilhões entre 2008 e 2009, para apresentar em seguida uma expressiva retomada, em 2010 e 2011, de tal forma que o valor exportado desse último ano, US$ 256 bilhões, se situou quase 30% acima do pico anterior, em 2008 (ver Gráfico).
O novo mergulho da economia mundial, a partir de meados de 2011, interrompeu a retomada das exportações brasileiras. Nos dois anos subseqüentes as exportações recuaram.
No período 2009-2013, as exportações brasileiras se expandiram à taxa média de 5,3% ao ano (frente aos 21,9% ao ano entre 2003 e 2008), sendo que no período mais recente, entre 2011 e 2013, elas se retraíram à taxa média de 2,7% ao ano, acompanhando o agravamento do cenário comercial no mundo.
Destinos
A tabela apresentada resume a evolução das exportações brasileiras segundo os principais destinos, tanto no período de elevado crescimento, entre 2002 e 2008, quanto no período em que o comércio exterior já reflete os efeitos da crise internacional.
Entre 2002 e 2008, as exportações nacionais foram ampliadas em US$ 137,6 bilhões de dólares. Ainda que a evolução das vendas para os países asiáticos, com destaque para a China, tenha sido espetacular, resultando em uma ampliação de US$ 28,6 bilhões, os aumentos de vendas para os países latinoamericanos (integrantes da ALADI) e para a União Europeia foram ainda mais expressivos em termos absolutos, US$ 33,2 bilhões e US$ 31,1 bilhões, respectivamente (ver Tabela).
Reorientação
O cenário do comércio exterior brasileiro, todavia, mudou radicalmente após a eclosão da crise financeira. No período subseqüente, 2008-2011, as exportações brasileiras seguem crescendo, em ritmo mais lento, mas procedeu-se uma mudança de grande magnitude em relação aos mercados de destino.
Enquanto as participações de quase todos os demais grupos de países recuaram abruptamente, a China e o bloco asiático passam a responder por mais de 2/3 do aumento das compras ao Brasil. Especialmente ruins são as performances das exportações para os países ricos e para o Mercosul.
No primeiro grupo, as exportações para União Europeia, que representaram quase ¼ do incremento entre 2002 e 2008, recuaram para cerca de 1/8 do incremento verificado entre 2008 e 2011. As exportações para os EUA, por sua vez, caíram no período, enquanto as exportações para o Mercosul que haviam crescido US$ 18 bilhões no período anterior, mantiveram-se praticamente estagnada entre 2008 e 2011.
2012 e 2013
Depois de 2011, com a crise na Zona do Euro e com a desaceleração do crescimento na China e no bloco asiático, os problemas nas vendas externas brasileiras acumularam-se, porquanto o destino para o qual as vendas externas ainda vinham apresentando crescimento significativo enfrentou dois anos de estagnação, enquanto os demais mercados que já estavam se tornando problemáticos desde 2008, esmoreceram de vez.
Em 2012 e 2013, as vendas externas para a União Europeia, EUA e Oriente Médio registraram recuos muito expressivos, enquanto a China e o bloco asiático (exclusive oriente médio) interromperam o crescimento. No próximo artigo, serão examinadas as mudanças no perfil setorial das exportações brasileiras no período. Tabela. Variação Absoluta e Taxa de Crescimento das Exportações Brasileiras por Destino |
DESTINO DAS EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS | VARIAÇÃO ABSOLUTA. EM US$ BILHÕES | TAXA DE CRESCIMENTO. EM % |
2002 - 08 | 2008 -11 | 2011 -13 | 2002 - 08 | 2008 - 11 | 2011 - 13 |
ASIA (EXC. O. MÉDIO) | 28,6 | 39,2 | 1,0 | 326,0 | 105,0 | 1,2 |
UNIAO EUROPEIA | 31,1 | 6,7 | -5,4 | 206,5 | 14,4 | -10,1 |
ORIENTE MEDIO | 5,7 | 4,2 | -1,3 | 244,0 | 52,2 | -10,8 |
ALADI | 33,2 | 6,5 | 0,7 | 337,3 | 15,2 | 1,5 |
-MERCOSUL | 18,0 | 0,5 | 7,7 | 546,7 | 2,2 | 35,5 |
-ALADI (EXC. MERCOSUL) | 15,2 | 6,1 | -7,0 | 231,9 | 28,0 | -25,1 |
EUA (INC. PORTO RICO) | 12,4 | - 1,7 | -1,8 | 81,9 | -6,2 | -7,0 |
OUTROS | 13,5 | 2,6 | -5,9 | 93,6 | 9,4 | -19,4 |
Fonte: MDIC-SECEX
Publicado no Jornal da Cidade em 16 de março de 2014
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