Economia
O eleitor-consumidor
A escolha de um eleitor no exercício (ou não) do seu direito de voto assemelha-se em vários aspectos às escolhas que o mesmo cidadão faz no seu dia-a-dia enquanto consumidor de diversos bens e serviços.
A diferença, substancial claro está, é que quer não exerça o seu direito de voto, quer o faça em relação a uma das candidaturas derrotadas acaba por ficar sujeito a “consumir” o output da escolha da maioria do colectivo a que pertence, com óbvias repercussões em diferentes aspectos da sua vida.
Aliás, este é claramente o aspecto mais distintivo das duas circunstâncias na medida em que, no limite, o conjunto dos consumidores pode recusar-se a consumir qualquer dos produtos existentes no mercado, assim incentivando os respectivos produtores/fornecedores a melhorarem os seus atributos em linha com as preferências dos seus potenciais clientes.
No caso em apreço, porém, pode considerar-se que a governação, nacional, regional ou local, é um “bem de primeira necessidade”, sendo que ou o cidadão-eleitor faz a sua escolha do melhor de entre os “produtos” disponíveis, ou, se se abstiver ou votar branco ou nulo, alguém fará a escolha por si.
Daí que, em linha com os objectivos eleitorais específicos que perseguem, se venha a considerar que os partidos/candidaturas disponíveis no espectro democrático nem sempre correspondem aos anseios dos eleitores e, muitas das vezes, não fazem sequer um esforço considerável para se aproximarem das suas ambições.
No mais, as semelhanças encontram-se sobretudo nas fundamentações do processo de escolha do eleitor-consumidor.
Como em relação a qualquer bem ou serviço, os eleitores dão especial atenção ao aspecto “preço”, aqui mensurado por duas vias: pelos diferentes custos que terá que suportar no futuro (impostos, taxas e outros preços aplicáveis aos serviços públicos de que irá usufruir); e pelos benefícios financeiros que espera obter (subsídios, abonos, incrementos expectáveis de rendimento, etc.).
A juntar a este aspecto, cada eleitor-consumidor atenderá à “utilidade” que poderá retirar do consumo de cada um dos candidatos a quem pode entregar o seu voto. Para tal, há que ter em conta as missões que estão confiadas aos Governos, as quais se confundem em larga escala com os papéis que o Estado pode ou deve assumir na sua relação com os cidadãos.
A título de exemplo, independentemente do custo (factor antes considerado na vertente preço), os cidadãos quererão usufruir de boas condições de segurança, de serviços públicos administrativos eficientes, de serviços de educação ou saúde de excelência, de serviços de justiça capazes, de boas perspectivas para o exercício das actividades económicas, de políticas que promovam a justiça social, de oportunidades de acesso ao desporto, lazer e cultura, entre vários outros aspectos que configuram as áreas de intervenção dos poderes a eleger.
A outro nível, cada “produto” disponível tem também atributos, reais ou percebidos, que podem reforçar a “satisfação” dos eleitores-consumidores em outros níveis da sua escala de preferências. Assim, alguns eleitores tenderão a valorizar aspectos menos quantificáveis de forma objectiva tais como: a empatia, a seriedade, a fiabilidade, a experiência, o aspecto, o trato ou a postura os candidatos.
Naturalmente, cada um destes atributos tem implícitos aspectos que convergem com os anteriores, mas são por si indutores de uma superior valorização ou desvalorização dos candidatos aos olhos dos eleitores-consumidores.
De facto, é expectável que um candidato “sério” não incorra posteriormente em práticas de corrupção ou outras lesivas do interesse público. È antecipável que um candidato “fiável” estará a falar verdade e não surpreenderá os eleitores/cidadãos após a sua eleição com discursos ou medidas contrários aos que agora formula. É de presumir que um candidato mais próximo dos cidadãos esteja mais vocacionado para procurar responder aos seus reais problemas em cada uma das circunstâncias. E assim poderíamos continuar de forma quase interminável…
Decorre deste conjunto de reflexões que quanto mais profissionalizada estiver uma máquina de campanha mais a mesma recorrerá às técnicas de marketing comummente aplicáveis aos produtos e serviços para tentar reforçar a adesão ao seu candidato.
Acontece que, tal como a generalidade dos marketeers estão vinculados a códigos de ética no exercício das suas profissões que os impedem de desenvolver determinado tipo de práticas que se traduzam na tentativa de enganar os potenciais consumidores, também os gestores das campanhas políticas e os candidatos deviam ser capazes de se impor determinados limites.
Todavia, sucedem-se os exemplos de situações que configuram más práticas de marketing no plano ético e criticáveis acções de promoção política.
Mas, quando se chega ao ponto de mobilizar cidadãos imigrantes para participar em actos de campanha a troco de uma merenda, descemos ao grau zero do respeito pela dignidade das pessoas e pela inteligência dos eleitores.
Aí, a política e quem assim a pratica desce abaixo do rating da República: é um verdadeiro lixo!
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