Economia
O câmbio, o guarda-chuva e o tsunami
Pretendia escrever sobre o bom desempenho do PIB em 2007. Iria contar como ocorreu apesar das reiteradas afirmações de nossos “keynesianos de quermesse” acerca da suposta incompatibilidade entre a atual política econômica e o crescimento. Principalmente, iria dizer como se beneficiou das reformas econômicas realizadas nos últimos anos, em particular na área de crédito, mesmo que os mais míopes não consigam entender a ligação entre reformas e crescimento. No entanto, à luz das medidas adotadas para desvalorizar o real não há como deixar de abordar o tema, um exemplo de como uma análise equivocada leva a políticas inadequadas.
Motivado ao que parece pela apreciação recente da moeda em face do dólar o governo tomou três medidas com a intenção de evitar um aprofundamento deste processo: (a) eliminou a obrigatoriedade dos exportadores converterem suas receitas em reais; (b) isentou os exportadores do pagamento de IOF (0,38%) no fechamento de câmbio; e (c) instituiu a cobrança de IOF (1,5%) nas operações de câmbio associadas a aplicações em renda fixa no mercado brasileiro.
A rigor, a persistência da obrigatoriedade de conversão das receitas de exportação em moeda nacional (a chamada “cobertura cambial”) – mesmo tendo sido limitada recentemente a 70% das receitas – era uma excrescência numa regulamentação que, no período mais recente, vem se caracterizando por maior liberalização. Em especial, impunha custos significativos ao setor exportador sem ganho correspondente do ponto de vista de estabilidade do balanço de pagamentos.
Alguém poderia imaginar que, livres desta exigência, os exportadores reduziriam os ingressos de dólares, levando a um câmbio mais desvalorizado, mas noto que, mesmo com a permissão atual de manter 30% de suas receitas no exterior, exportadores têm trazido todos seus recursos, sugerindo que a remoção desta restrição não implicará desvalorização da moeda, ainda que alivie custos do setor exportador, o mesmo efeito que trará a isenção do IOF para este setor. Registre-se apenas que custos menores se traduzem, em geral, em câmbio mais forte, mas o efeito parece ser pequeno neste caso.
Já a criação do IOF sobre os ingressos relativos às aplicações em renda fixa parte do pressuposto que a taxa de juros é o principal fator de apreciação do real. Já tive aqui a oportunidade de analisar este argumento e mostrar que mesmo durante um longo período de queda da diferença entre juros locais e internacionais a moeda não parou de se apreciar, indicando que outros fatores, além dos juros, levaram a este resultado.
De fato, o aumento do preço das
commodities beneficia quem as exporta, e o Brasil não foge à regra. Não por acaso, entre as moedas que mais se fortaleceram no período recente destacam-se às de países exportadores de
commodities, como Austrália, Nova Zelândia, Chile e Colômbia. Some-se a isto a derrocada do dólar devido ao enfraquecimento da economia norte-americana e temos um quadro no qual o real, em conjunto com a maior parte das moedas do mundo, se aprecia em relação ao dólar ainda que sua paridade contra, por exemplo, o euro pouco tenha se alterado.
Dado o erro de diagnóstico, a medida só encarecerá o custo da dívida pública, com chance mínima de deter a apreciação do real (ainda bem, pois a última coisa de que a inflação precisa é um empurrão do câmbio). É como abrir um guarda-chuva para se proteger do
tsunami.
(Publicado 19/Mar/2008)
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