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Uma das questões que sempre alimentou grandes discussões foi o impacto nocivo da publicidade sobre as crianças e jovens, quer por via da utilização de conteúdos menos adequados, quer em razão do aproveitamento de certas fragilidades emotivas, psíquicas ou de capacidade de compreensão da diferença entre realidade e ficção que caracterizam o normal processo evolutivo dos seres humanos.
A tal ponto que o próprio Código da Publicidade (estabelecido pelo Decreto-Lei nº 330/90, de 23 de Outubro, mas com várias posteriores revisões e actualizações, não hesitou em dedicar dois dos seus 41 artigos a esta temática.
Assim, nos Artº 14º. e 20º., inseridos na Secção sobre as Restrições ao conteúdo da publicidade, pode mesmo ler-se que “A publicidade especialmente dirigida a menores deve ter sempre em conta a sua vulnerabilidade psicológica, abstendo-se, nomeadamente, de incitar directamente os menores, explorando a sua inexperiência ou credulidade, a adquirir um determinado bem ou serviço; incitar directamente os menores a persuadirem os seus pais ou terceiros a comprarem os produtos ou serviços em questão; conter elementos susceptíveis de fazerem perigar a sua integridade física ou moral, bem como a sua saúde ou segurança, nomeadamente através de cenas de pornografia ou do incitamento à violência; e explorar a confiança especial que os menores depositam nos seus pais, tutores ou professores”.
Por acréscimo, estabelece-se que “os menores só podem ser intervenientes principais nas mensagens publicitárias em que se verifique existir uma relação directa entre eles e o produto ou serviço veiculado” e proíbe-se a “publicidade a bebidas alcoólicas, ao tabaco ou a qualquer tipo de material pornográfico em estabelecimentos de ensino, bem como em quaisquer publicações, programas ou actividades especialmente destinados a menores”.
Sobre esta matéria é mesmo possível encontrar estudos científicos com resultados contraditórios, ora corroborando a influência nefasta da publicidade sobre a formação da personalidade dos mais jovens, ora assegurando que a sua exposição “livre” às mensagens publicitárias fortaleceria a sua capacidade de formular juízos críticos sobre as mesmas.
Como também se percebe, esta questão é tanto mais premente quanto ao longo dos últimos anos aumentou exponencialmente o nível de exposição das crianças e jovens à publicidade, mormente através da televisão e do acesso à Internet, ao passo que as técnicas publicitárias foram também ficando cada vez mais apuradas.
Neste âmbito, recorde-se também que nem todas as mensagens publicitárias são preparadas para este “nicho específico de mercado” mas que, ainda assim, esta franja da população acaba por partilhar a visualização de “anúncios” que não lhes são directamente dirigidos e sobre os quais não dispõem da mesma capacidade de compreensão e interpretação dos adultos.
De igual forma, atente-se também a que a publicidade dirigida às crianças não versa apenas os produtos e serviços de que estes são utilizadores/consumidores, mas procura aproveitar o papel de “prescritores” que os elementos mais jovens assumem no contexto da economia familiar.
Perante este cenário, pode então questionar-se como devemos reagir no sentido de precaver os potenciais malefícios associados a este fenómeno.
Entre a lógica que defende a “supervisão” das famílias num ambiente de liberdade total da actividade publicitária e a que exige a imposição de normas ainda mais restritivas do que as que constam do referido Código da Publicidade, existe agora o que poderíamos designar de uma “terceira via”.
É neste contexto que surge o programa “Media Smart”, um programa de educação para a publicidade especialmente dirigido às crianças mais jovens, nomeadamente as que frequentam o 1.º e 2.º Ciclos do Ensino Básico, com o qual se pretende que “as crianças consigam desenvolver competências para a correcta interpretação das mensagens publicitárias, fornecendo-lhes ferramentas que as ajudem a compreender e a interpretar a publicidade desde muito cedo, preparando-as para fazer escolhas informadas baseadas no juízo crítico”.
O Media Smart foi lançado em 1998 no Canadá e trazido para a Europa (Reino Unido) em 2002. Hoje, é já utilizado como ferramenta de ensino em mais de 68 mil escolas na Europa, em países como a Holanda, a Bélgica, a Alemanha, a Finlândia, a Suécia e a Hungria.
Desde 21 de Fevereiro passado, o Media Smart está também disponível em Portugal, numa parceria entre o Ministério da Educação e a APAN – Associação Portuguesa de Anunciantes, que faculta a possibilidade de disponibilização do programa a todas as escolas públicas e privadas destes níveis de ensino, por adesão voluntária das mesmas.
Segundo os dados dos promotores, no início do presente mês de Maio eram já 1.168 as escolas em que estavam a ser disponibilizados os conteúdos pedagógicos do Media Smart, o que equivale a 20% do parque escolar nacional dirigido a esta faixa etária.
A adaptação dos materiais pedagógicos à realidade portuguesa foi feita por um grupo de peritos, coordenado por Roberto Carneiro, antigo Ministro da Educação, e constituído por representantes das direcções-gerais de Inovação e Desenvolvimento Curricular e da Saúde, do Instituto do Consumidor, da Confederação Nacional das Associações de Pais, da Associação Nacional de Nutricionistas, da Faculdade de Motricidade Humana e ainda por um doutorando em Marketing Infantil, um representante dos professores e um especialista em comunicação infantil.
Atendendo à actual conjuntura económica, ao fenómeno do sobre-endividamento das famílias e às novas tendências do processo educativo fica a pergunta: para quando um Media Smart para adultos?



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