Mais uma escorregada do Professor Oreiro?
Economia

Mais uma escorregada do Professor Oreiro?


Em seus comentários ao artigo do Pedro Ferreira e Renato Fragelli da EPGE no Valor Econômico, o professor Oreiro cometeu uma pequea atrocidade em seu blog que merece ser comentada aqui.

Nas palavras dele:

"... um aumento da taxa de poupança – sem mudanças no modus operandi da política cambial, irá apenas aumentar o tamanho do desalinhamento cambial ao desvalorizar a taxa real de câmbio de equilíbrio, sem ter um efeito perceptível sobre a taxa real de câmbio de mercado."


Vamos por partes. Primeiro, a afirmação que um aumento da taxa de poupança teria o efeito na taxa de câmbio no curto prazo (o que ele chama de 'taxa de mercado') é um resultado bem conhecido, mas vou apresentar aqui. Um aumento na taxa de poupança brasileira muda a composição da demanda global e tem como efeito imediato uma redução relativa na demanda por nossos bens não comercializáveis. Portanto, no curto prazo enquanto não há mudança na capacidade produtiva da economia, o aumento na taxa de poupança tem o efeito de engendrar uma queda no preço relativo dos nossos bens não comercializáveis, isto e, uma depreciação real do câmbio (aumento da competitividade de nossas exportações). O professor argumenta que o efeito não seria perceptível, o que é uma questão empírica na qual eu discordo mas, até aqui, podemos concordar em discordar.

Mas na segunda parte está a batatalhada. Vejamos... Segundo o professor, um aumento da taxa de poupança depreciaria a taxa de câmbio de equilíbrio. Isto é falso, o efeito de um aumento da taxa de poupança sobre a taxa real de câmbio no longo prazo é exatamente o oposto do que o professor propõe, e vou demonstrar.

Para entender o mecanismo econômico, precisamos explorar a conexão entre o curto e o longo prazo no equilíbrio externo: a dinâmica da acumulação de ativos. Um aumento duradouro da taxa de poupança que não seja acompanhado de um aumento da mesma magnitude na taxa de investimento tem como consequência uma melhora cumulativa na posição externa líquida do país (isto é, nossa dívida vai diminuir ou vamos acumular mais ativos externos, por exemplo, reservas internacionais ou investimento de portfólio ou direto no exterior).

A acumulação de ativos externos líquidos naturalmente tem o efeito - não ambíguo - de melhorar o balanço da conta de renda no balanço de pagamentos tanto durante a transição como no longo prazo. Com uma renda de ativos externos maior (ou serviço de dívida menor), temos uma expansão de nossas possibilidades de consumo de bens comercializáveis, isto é, podemos ter um balanço comercial menor, e portanto o mecanismo de preços implica um câmbio mais apreciado no longo prazo.

Em resumo, se o câmbio está desalinhado hoje - e muito bem pode estar! - políticas públicas que aumentam a taxa de poupança, ao contrário do que diz o professor, reduzem esse desalinhamento por dois efeitos: no curto prazo, depreciam o câmbio real, e no longo prazo, apreciam-no.

Pergunto-me agora qual vai ser a desculpa do professor: vai me acusar de ser anônimo? Vai alegar ser café-com-leite ("apenas um simples post de blog, escrito em apenas 2 horas, por alguém que não é especialista...")? E agora, sagaz professor?

P.S. Uma pergunta que não se cala: será que o ilustre Professor Gala da EESP estava sendo sincero quando disse que concordava "couldn’t agree more!!!" nos comentários do blog do Oreiro ou será que ele reconheceu a falha do raciocínio econômico do colega e estava sendo sarcástico? O que vocês acham?

P.S.2 Essa não foi a única e nem a pior bobagem que o professor proferiu em seu post, aposto que os leitores mais atentos deste blog podem identificar outras!



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