ANTONIO DELFIM NETTO, hoje na FOLHA DE S. PAULO, escreve sobre “Incertezas”.
Uma boa parte das divergências de diagnóstico entre os economistas brasileiros refere-se às incertezas sobre como distinguir, inequivocamente, se estamos diante de um excesso de demanda sobre a oferta global, corrigível pelo corte da demanda (aumento da taxa de juros real), ou se estamos diante, por exemplo, de desajustes setoriais que podem ser produzidos:
1º) Pelo excesso do uso de regulação;
2º) Por excesso de proteção;
3º) Por modificações na estrutura do mercado de trabalho superáveis apenas com o tempo e através de alterações nos preços relativos.
Estes não podem ser corrigidos apenas pela manobra da taxa de juros. Precisam de forte apoio de medidas que deem aos agentes econômicos os incentivos adequados para ajustarem-se.
Os primeiros devem ser corrigidos pela redução da interferência do poder público que, frequentemente, aumenta os riscos dos investimentos privados. Os segundos devem ser tratados com reduções tarifárias. Os terceiros, com rápido e substancial esforço de qualificação da mão de obra.
Desequilíbrios setoriais podem ocorrer sem que sejam "prova" irrefutável da existência de profunda divergência entre a oferta e a procura globais ou de um nível de desemprego incompatível com a estabilidade monetária.
São condições em que se exigiriam cortes da demanda pública (despesas) e da demanda privada (aumento da taxa de juros real).
Tentar corrigi-los apenas com o uso desses instrumentos resultará em enorme e desnecessário custo social.
Por exemplo: o tumulto que tem acompanhado o problema dos aeroportos é sinal inequívoco de excesso de demanda global? Ou é apenas o efeito da falta de investimento privado no setor, consequência de um perverso mecanismo de intervenção estatal?
Tal intervenção foi surpreendida pela modificação da estrutura da demanda gerada por um aumento de renda não compensado por uma modificação de preços relativos entre o transporte rodoviário e o aéreo, ambos sujeitos a "subsídios".
Deve ser corrigido por uma redução do bem-estar geral com aumento da taxa de juros real? Ou com medidas que o liberem do excesso de regulação e deem confiança ao investidor privado para estimular a oferta?
Em princípio, o Banco Central só tem um instrumento, a taxa de juros de curto prazo, com que ele espera manobrar a de longo prazo e controlar o consumo e o investimento.
O mundo é mais complicado do que parece. Há sérias dúvidas de que o BC possa fazê-lo sem o suporte da política fiscal e de medidas monetárias não convencionais.