Economia
Faça a coisa certa
Na semana passada foi divulgada a taxa de desemprego relativa a novembro, 5,7%, a menor da série iniciada em 2002. Mesmo ajustando o dado à sazonalidade favorável do período, o desemprego teria caído para pouco mais de 6%, ainda o mínimo histórico. A despeito do crescimento mais lento da produção no terceiro trimestre deste ano, o mercado de trabalho continua a registrar ganhos, o que, dado o alto custo associado à demissão e contratação de trabalhadores no país, sinaliza um setor empresarial bastante otimista acerca da produção futura, disposto a incorrer em tais custos.
Não são apenas as empresas que parecem otimistas. Um dado notável é o aumento da proporção da população em idade ativa engajada no mercado de trabalho, que tem ficado sistematicamente acima da média histórica, impedindo, inclusive, queda ainda mais rápida do desemprego (que, sem este efeito, teria registrado 4,9% no mês passado, ou 5,6% sazonalmente ajustado).
No entanto, não é só o otimismo que leva estas pessoas ao mercado; também o crescimento dos salários conduz à elevação da quantidade ofertada de trabalho. Apesar da aceleração da inflação, o rendimento médio real estimado pelo IBGE aumentou quase 8,5% no ano até novembro, fato que deve ter desempenhado papel importante na ampliação da oferta.
Não há, contudo, indicação que o aumento da produtividade do trabalho no Brasil tenha sido próximo a este valor (considerando que o PIB deverá crescer pouco menos de 8% este ano, um aumento de produtividade de 8,5% requereria queda do emprego no país, fenômeno bem diferente do que acabamos de descrever). Vale dizer, este aumento deve obrigatoriamente ter se transformado em aumento do custo unitário do trabalho.
Obviamente, nos setores sujeitos à competição internacional, a capacidade de repasse desses custos fica limitada pelo desempenho da taxa de câmbio. Não por outro motivo, apesar da demanda forte, a inflação de bens duráveis atingiu meros 0,8% no ano (segundo o IPCA-15).
Por outro lado, onde a competição externa não alcança, o desempenho é muito distinto: a inflação de serviços, não por acaso, registra 7,6% nos últimos 12 meses, mostrando aceleração quase ininterrupta desde o começo do ano.
Não falta, é claro, quem veja neste fenômeno algo da “inflação estrutural” analisada pelo meu colega de coluna Mário Mesquita na quarta passada, contra a qual nada se poderia fazer, o que, segue o argumento, justificaria uma postura relaxada do Banco Central a respeito. Mas isto só seria verdade se: (a) o aumento de salário não estivesse refletindo o aperto do mercado de trabalho; e (b) o aumento do preços dos serviços não estivesse refletindo, por sua vez, a elevação dos preços do seu principal insumo (mão-de-obra). Nenhuma destas condições, porém, encontra amparo na evidência disponível.
A rigor, ademais, uma postura relaxada do Banco Central só tende a ampliar o problema. Em algum grau, as demandas salariais hoje refletem a inflação esperada, pois, durante o período em que os salários estão fixos, é a inflação futura que determinará seu poder de compra. Assim, caso o BC seja percebido como leniente com respeito à inflação, as demandas salariais (e a inflação de serviços) se aceleram imediatamente. A este respeito note-se que as expectativas de inflação têm se descolado bastante da meta, em contraste com o observado no período de 2005 para cá (exceção feita ao ano da crise e da forte desvalorização cambial).
Não cabe, portanto, ao BC cruzar os braços na crença que nada pode fazer para conter a inflação, nem passar ao setor privado a mensagem que a convergência só ocorrerá em prazos muito mais longos, o que justificaria maiores reajustes agora. O próprio BC sugere que ainda há tempo para fazer a inflação voltar à meta em 2011, mas isto não ocorrerá sem que se faça o que deve ser feito.
(Publicado 22/Dez/2010)
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