Como pode emergir um equilíbrio como analisado em concorrência perfeita?
O modelo econômico tradicional se caracteriza por um estado de coisas onde os agentes são tomadores de preços e maximizam a utilidade em relação a esses preços, escolhendo as quantidades que vão comprar ou vender no mercado e dessa forma temos uma teoria onde o sistema de preços é determinado como uma solução de um conjunto de equações de oferta e demanda. Esse modelos são chamados de concorrência perfeita porque os agentes tomam os preços do mercado como dados no sentido que os agentes esperam comprar e vender qualquer quantidade de algum bem pelo “preço de mercado”. Isso também é chamado de equilíbrio walrasiano, já que foi Walras quem inventou essa idéia.
Que esse modelo é irrealístico todo mundo concorda, o que ocorre é que muitos economistas da EA já escreveram dizendo que o estado de coisas onde temos um sistema de preços dado e os agentes maximizam em relação a esses sistema de preços pode emergir como conseqüência final do processo equilibrativo do mercado. Na verdade a concorrência perfeita não é o único resultado de equilíbrio possível, mas é sem dúvida um resultado normal num sistema econômico com muitos agentes (e isso não tem nenhuma relação com elasticidade da oferta/procura, mas na verdade é determinado pelo problema do conhecimento e da dinâmica do processo de formação do conhecimento dos agentes).
A natureza da “concorrência perfeita”
Na concorrência perfeita os agentes não podem escolher os preços pelos quais as propostas de compra e venda serão feitas, mas eles podem escolher a quantidade que vão ofertar e demandar no mercado. A idéia é que se os agentes não podem escolher nada, então não teremos um mercado mas sim um planejamento central. Digamos, se temos um leiloeiro walrasiano que chega para cada agente e diz: Vc aceita 5 bananas em troca de 8 reais?, e dessa forma realiza trocas mutuamente benéficas que vão levar a uma alocação eficiente. Mas como os agentes não escolhem as quantidades que eles vão trocar, mas apenas tem liberdade de aceitar ou recursar propostas de modo que eles sempre vão ter um ganho positivo com a troca, os agentes não igualam as taxas marginais de substituição das varias mercadorias em relação aos preços do mercado.
Isso significa que concorrência perfeita significa apenas uma experiência mental onde se abstrai do processo de determinação dos preços e se analisa as escolhas dos indivíduos apenas como um problema de maximização sob restrição, determinando as escolhas dos indivíduos em relação aos preços dados. Os outros indivíduos não existem para os planos de cada indivíduo (nota-se que na concorrência perfeita não temos aplicação da teoria dos jogos que lida justamente com equilíbrios estratégicos de 2 ou mais agentes).
O que é uma curva de demanda? Uma curva de demanda é como uma variação de preço afeta a quantidade que agentes que maximizam a utilidade em relação a esse preço demandam. Nas curvas de oferta e procura temos apenas agentes passivos que escolhem a quantidade que vão comprar e vender a partir de um preço de mercado dado, não existe atividade empreendedora nessas curvas (no sentido que não existe processo de formação de preços) e na verdade é óbvio que curvas de oferta e procura não existem na realidade, embora sejam uma ferramenta analítica poderosa.
Equilíbrios possíveis na teoria austríaca sem concorrência perfeita
Na teoria austríaca podemos ter sim equilíbrios puros (onde todas as oportunidades de lucro foram exauridas) que não sejam de concorrência perfeita. Como? Se empreendedores oferecem trocas para vários agentes com preço e quantidade definida e a totalidade dos ganhos com trocas possíveis sejam colhidas, então temos um equilíbrio já que nenhuma modificação nos planos de ação dos agentes pode resultar numa situação melhor para cada agente. Um equilíbrio com lucros empresárias puros nas trocas não pode ser um equilíbrio walrasiano, já que se os preços que são cobrados pelos empreendedores para os agentes que vendem os bens são menores do que os preços cobrados para os compradores do bem, e como os vendedores e compradores maximizam a utilidade em relação a esses preços ajustando as quantidades demandadas/ofertadas até que a razão das utilidades marginais se iguale a razão entre os preços. Mas como a razão entre os preços é diferente para o comprador e para o vendedor, então as taxas marginais de substituição das várias mercadorias entre os dois agentes vão ser diferentes, o que significa que ainda existe possibilidade de troca mutuamente benéfica entre os dois. E se existe possibilidade de troca mutuamente benéfica entre os dois, então existe um diferencial de valoração entre os dois agentes, o que significa que existe uma possibilidade de lucro ainda não explorada.
Então um equilíbrio genuíno onde as trocas são realizadas por preços diferentes entre agentes devido a diferença de preço causada pelo empreendedor é um equilíbrio onde o empreendedor faz as propostas para os agentes de modo rígido no sentido que os agentes não podem escolher a quantidade do bem transacionado.
Quais são as condições para que o processo de convergência tenda a concorrência perfeita?
Essas é a condição para que o equilíbrio que o processo de mercado atinga seja um equilíbrio walrasiano:
Temos muitos agentes no mercado
Essa condição surge a partir do fato de que com poucos agentes os empreendedores vão descobrir as preferências individuais de cada agente de modo a conseguir realizar transações sob medida para cada agente. Essas transações sob medida são transações onde os agentes passivos (não empreendedores) não escolhem o quanto vão comprar e vender pelo preço ofertado pelo empreendedor mas na verdade escolhem só se vão aceitar os termos da troca, que será: venda 1 banana em troca de 4 maças, digamos, porque se o empreendedor sabe as preferências do indivíduo em questão então ele sabe fazer uma proposta onde o indivíduo vá vender ou comprar mais do que estaria disposto a comprar e pudesse vender/comprar pelo preço oferecido. Como ele vai trocar uma quantidade maior pelo preço do que trocaria se pudesse escolher a quantidade, a taxa marginal de substituição será diferente do preço, ou seja, é possível termos eficiência com lucro liquido para o empreendedor que realiza arbitragem por preços diferentes porque ele iguala as taxas marginais de substituição dos agentes passivos cobrando preços diferentes! Mas quando temos muitos agentes com preferências diferentes o empreendedor pode descobrir que comprando por menos numa parte do mercado e vendendo por mais em outra parte do mercado terá oportunidade de auferir lucro mas como ele não sabe as preferências dos agentes individuais ele vai montar a barraca e deixar os agentes escolherem a quantidade que vão comprar/vender pelo preço na barraca. Nesse caso temos que a eficiência só poderá ser atingida quanto a margem de lucro tender a zero.
Vou explicar isso melhor: Temos um trabalhador onde o produto de seu trabalho de 10 horas vale $200 no mercado de bens finais. Nota-se que 10 horas é o tempo de trabalho ótimo. Por que? Se ele recebe 20 por hora, então ele vai escolher trabalhar 10 horas, otimizando seu tempo de trabalho em relação ao salário. Como ele iguala a taxa marginal de substituição da hora de trabalho/salário em relação a hora de tempo livre e como o preço que os consumidores pagam é igual ao preço que ele recebe pela hora de trabalho, então temos uma alocação ótima do trabalho. Em outras palavras, o ganho marginal da hora trabalhada do ponto de vista do consumidor iguala o ganho marginal do trabalhador, o que significa que temos a quantidade ótima de trabalho vendido. Mas digamos que o trabalhador não descobre que pode vender o produto do seu trabalho no mercado de bens finais e um empreendedor descobre que os consumidores estão dispostos a pagar mais do que o trabalhador está disposto a receber por hora marginal de trabalho, o que significa que o trabalhador está disposto a vender seu trabalho no mercado. No caso da troca sob medida, digamos que o empreendedor sabe que o trabalhador no equilíbrio competitivo vai trabalhar 10 horas pelo salário de $20 por hora, mas ele contrata o trabalhador para trabalhar 10 horas por $150 ao invés de $200. Mas o trabalhador ainda escolhe trabalhar 10 horas porque sua escolha não é, digamos, entre trabalhar 10 hora e trabalhar outro número de horas, mas entre trabalhar 10 horas ganhando 150 ou não trabalhar e não ganhar nada. O empreendedor vende $200 de bens produzidos pelo trabalhador e paga $150 por esse trabalho, nota-se que $150 representa a valoração da desutilidade do trabalho. Como ele trabalha 10 horas e essa é a mesma quantidade de trabalho que ele trabalharia se recebesse o salário correspondente ao seu produto marginal, então temos uma alocação eficiente mesmo que exista lucro puro! Mas se o trabalhador escolhe quantas horas ele trabalha, então ele não vai trabalhar 10 horas, porque seu excedente nesse caso tende a zero, mas sim vai trabalhar, digamos, 6 horas, maximizando seu excedente para um salário de $15 por hora. Como o salário de $15 é diferente do preço de $20 para o produto de seu trabalho então a desutilidade da hora marginal de
Vou fazer um esqueminha de tabelas de valorações marginais (nota-se que assumo que não existe efeito renda das variações dos salários!) para ilustrar meu ponto:
Desutilidade de "unidades" de 2horas de trabalho, e salários para essas unidades: $40 (preço do trabalho = produtividade marginal no mercado que é de $20 por hora):
2 horas – $20 $40 - ganho marginal - $20
4 horas - $25 $40 - ganho marginal - $15
6 horas - $30 $40 - ganho marginal - $10
8 horas - $35 $40 - ganho marginal - $5
*10 horas - $40 $40 - ganho marginal - $0 - ponto de equilíbrio
12 horas -$45 $40 - perda marginal - $5
Temos equilíbrio quanto a quantidade de trabalho vendida é 10 horas se o trabalhador escolhe quanto vai trabalhar e recebe o valor de sua produtividade marginal.
Desutilidade total: $150, ou seja, ele prefere não trabalhar 10 horas do que trabalhar e receber $149, mas por um valor de $150 ou mais ele prefere trabalhar 10 horas. Lucro de $50 para o empreendedor, que fica com a quase totalidade dos ganhos de troca e os ganhos com a troca são exauridos, ou seja, não existe troca mutuamente benéfica perdida. Primeiro acho importante se notar que se o capitalista quisesse que o trabalhador trabalhasse 12 horas para vender seu produto por $240 ele teria que pagar no mínimo $195, e lucraria no máximo $45, ou seja, menos do que lucraria numa alocação eficiente do trabalho com 10 horas trabalhadas igualando a valoração marginal dos consumidores com a desutilidade marginal do trabalho. Logo, isso significa que se o empreendedor tem perfeita percepção das valorações dos agentes ele vai agir de modo a fazer contratos sob medida para cada agente para extrair ao máximo os ganhos com as trocas e desse modo teremos uma alocação eficiente. Nota-se que se ele receber $15 por hora, ele vai escolher trabalhar apenas 6 horas:
Desutilidade de 2h valorada em $20 e salário para 2horas: $30 (salário de $15 por hora) e valoração do produto marginal pelos consumidores ($40):
2 horas – $20 $30 - ganho marginal de $10 - $40
4 horas - $25 $30 -ganho marginal de $5 - $40
*6 horas - $30 $30 -ganho marginal de $0 - $40 - equilíbrio sub ótimo ($30<$40)
8 horas - $35 $30 – perda marginal de $5 - $40 - perda de lucro potencial (peso morto): $5
10 horas - $40 $30 – perda marginal de $10 - $40 - alocação ótima ($40 = $40)
12 horas -$45 $30 – perda marginal de $15 - $40
Mas como os consumidores estão dispostos a pagar $80 para que o trabalhador trabalhe mais 4 horas e o trabalhador tem desutilidade de $75 se trabalhar mais 4 horas, então não é eficiente que ele trabalhe 6h porque temos perda de $5 de peso morto. Nesse caso o lucro do empreendedor é de $30, menor do que o lucro que ele teria se tivesse plena percepção das valorações dos agentes e fizesse um contrato sob medida para o trabalhador de 10 horas por $150. Isso significa que onde existem discrepâncias nos preços das transações e onde os agentes passivos podem escolher as quantidades não temos um equilíbrio, porque um outro empreendedor pode oferecer $75 para mais 4 horas de trabalho do trabalhador e lucrar $5 com isso. Só teremos um equilíbrio com eficiência com ou sem lucros puros. Mas com lucros puros, só temos equilíbrio se o empreendedor faz o contrato de forma a incluir a quantidade além do preço. Já que dando liberdade para o trabalhador ofertar a quantidade que ele quiser só com um salário de $20 por hora, igual ao produto marginal, que temos eficiência e nesse caso, lucro zero.
Mas então por que que os empreendedores vão deixar os agentes passivos escolherem as quantidades? Porque eles não sabem as preferências de cada agente. Mas em que tipo de situação que os empreendedores não sabem as preferências de cada agente? Quanto temos muitos agentes se torna mais provável que os empreendedores descubram as condições gerais do mercado do que as valorações individuais, e isso ocorre porque as curvas de oferta e procura de mercado são formadas por milhões de agentes com preferências diferentes, e isso significa que é possível conhecer essas curvas sem conhecer as preferências dos agentes (o que não ocorre no exemplo do trabalhador das horas porque ele é apenas 1 agente e por isso sua curva de oferta de trabalho determina suas preferências). Então para que tenhamos uma situação onde os empreendedores cobrem preços diferentes para os agentes temos que ter muitos agentes no mercado de modo a tornar praticamente impossível que os empreendedores descubram as preferências de cada um.
O processo de formação do equilíbrio competitivo e a antecipação das ações dos outros empreendedores
Primeiro sobre as características do processo: Temos 2 tipos de agente: Os maximizadores passivos que respondem as propostas feitas pelos agentes ativos e possuem as dotações dos bens na economia e os empreendedores, que são os agentes dotados de propensão a descoberta espontânea de dados que eles anteriormente não estavam cientes de existir. O processo de mercado é um processo onde com a passagem do tempo os empreendedores descobrem que podem fazer propostas de trocas com os trabalhadores de forma auferir lucros com as diferenças entre os preços que os vendedores aceitam pela compra e o preço que o comprador aceita pela venda do bem, essa diferença causada pelas valorações e dotações diferentes entre os vários agentes.
Agora voltemos ao caso do trabalhador. Digamos que temos um empreendedor que sabe que os consumidores estão dispostos a pagar mais do que o trabalhador está disposto a receber. Se o empreendedor não sabe a “curva” de desutilidade marginal do trabalho mas tem alguma idéia da curva de oferta de trabalho, ele não vai fazer um contrato de 10 horas por $150, mas vai oferecer um salário por hora para o trabalhador (que está livre para ajustar a quantidade de horas ofertadas) que maximize o lucro esperado (que é um salário de $15, que gera um lucro de $30). Algo ridículo no meu exemplo com apenas 1 trabalhador porque as duas curvas são idênticas e é a desutilidade do trabalho (lembre-se que estamos numa situação sem efeito renda!) que determina a curva de oferta. Mas se tivermos muitos trabalhadores e cada trabalhador tem curvas de oferta de trabalho diferentes, então é possível que o empreendedor tenha uma idéia de como é a curva de oferta de trabalho sem que ele conheça as preferências dos trabalhadores. Claro que se ele tem uma percepção perfeita da curva de oferta de trabalho ele vai saber as preferências dos trabalhadores, e desse modo, vai realizar contratos sob medida, de modo a capturar todos os ganhos possíveis com a troca, já que se ele tem uma percepção perfeita da curva de oferta de trabalho ele vai ter uma percepção perfeita de todo o resto, porque na teoria austríaca moderna uma percepção perfeita de algum dado só pode ocorrer quando o agente tem percepção completa de todos os dados. Como? Simples, os agentes sempre tem uma percepção imperfeita da realidade que vai se aperfeiçoando com a passagem do tempo e essa percepção é assimétrica: Cada agente tem dados diferentes sobre cada parâmetro e esses dados nunca são perfeitos, só com uma capacidade perfeita de aprendizado que temos um dado perfeitamente definido (como a curva de oferta de trabalho) mas uma capacidade perfeita da aprendizado implica numa percepção perfeita de todos os dados. Nessa situação analisada o caso é que o empreendedor tem uma idéia da oferta de trabalho sem que ele tenha uma boa noção das preferências dos trabalhadores. E por causa disso o empreendedor vai colocar apenas um preço no mercado de trabalho e deixar os trabalhadores se candidatarem para o emprego.
Essa é uma situação de natureza similar a situação que o leiloeiro walrasiano se defronta. No caso do leiloeiro walrasiano, o leiloeiro coloca preços para todos os agentes, compradores e vendedores, e ajusta os preços de modo a equilibrar o mercado igualando a quantidade ofertada com a quantidade demandada. A informação é centralizada no leiloireo: Ele sabe de todos os bens que podem ser trocados, e por isso coloca os preços de todos os bens e informa esses preços para todos os agentes, quanto a oferta e a procura não se igualam o leiloeiro vai ajustando os preços, até que o equilíbrio é atingido. Ou seja, o leiloeiro executa todo o processo de descoberta na teoria convencional, ela na verdade abstrai o processo de formação do sistema de preços e assume o equilíbrio. Mas no mundo real são as pessoas que realizam o processo de descoberta. No modelo utilizado por Kirzner e que estou utilizando nesse texto o processo de descoberta é centralizado nos empreendedores, que são os agentes ativos, já os agentes que possuem a dotação inicial dos bens são os agentes passivos, se separando analiticamente a descoberta e a posse dos bens.
Essa situação é similar a situação de um empreendedor que tem uma percepção imperfeita da situação de um mercado com muitos agentes com preferências e dotações diferentes. Nesse caso o empreendedor não vai realizar contratos sob medida para cada agente, mas na verdade vai montar uma barraca dizendo: compro x por $5/unidade. Numa parte do mercado e na outra parte do mercado ele vai montar uma barraca dizendo: vendo x por $10/unidade. Ou seja, ele vai explorar oportunidade de lucro de modo imperfeito (porque lucra menos se discriminasse perfeitamente os agentes) devido a sua percepção imperfeita do mercado, e dessa maneira temos uma aproximação da situação walrasiana, com a diferença que na situação walrasiana a barraca que vende vende pelo mesmo preço que a barraca que compra. O processo equilibrativo ocorre da seguinte forma: Os empreendedores avidos para ter lucro descobrem que existem essas diferenças de preço, mas para explorar essa oportunidade de lucro eles tem que barganhar com outros empreendedores pelos bens transacionados, ou seja, o processo de ajustamento dos planos dos empreendedores em relação aos planos de outros empreendedores vai levar a convergência do preço de compra e venda do produto, levando a tendência ao desaparecimento das diferenças de preços no mercado.
Como esse processo ocorre? Voltemos ao exemplo do trabalhador, se primeiro temos um empreendedor que descobre a curva de oferta de trabalho do trabalhador mas não descobre a curva de desutilidade do trabalho, então o empreendedor vai contrata-lo por $15 por hora e ele vai escolher ofertar 6horas de trabalho. Mas agora vamos expandir a análise ao longo do tempo, digamos que esse trabalhador pode trabalhar nos dias 1,2,3,.... e que só do dia em que ele pode trabalhar que ele vende seu trabalho datado daquele dia, digamos, só no dia 2 que ele pode vender o trabalho do dia 2. Estou assumindo isso porque se o empreendedor pode comprar todos os dias de trabalho do trabalhador no dia 1, então ele vai comprar e o processo de convergência para a concorrência perfeita não ocorre. Mas se eu assumir que o trabalhador só vai vender seu trabalho do dia y no dia y eu estou assumindo uma dessas duas coisas:
1- O trabalhador só percebe que possuí o fator de produção “dia de trabalho y” no dia y. Essa é a hipótese do agente passivo ultra passivo.
2- O trabalhador espera até a ultima hora para vender seu fator “dia de trabalho y” porque ele espera que exista a possibilidade de que vários empreendedores se ofereçam para comprar seu trabalho, e dessa forma eu estou dizendo que o trabalhador tem certa capacidade empreendedora (embora mínima). Hipótese do agente passivo não tão passivo.
Então o que ocorre? O seguinte, outros empreendedores que descobrirem a existência dessa curva de oferta de trabalho vão oferecer contratos de trabalho melhores do que os contratos oferecidos pelo primeiro empreendedor para capturar os lucros possíveis da transação de horas de trabalho nos dias de trabalho futuros que ainda não foram vendidos. Como o trabalhador só vai aceitar ofertas de compra de horas de trabalho do dia y no dia y, os empreendedores dias antes já planejam o valor que vão ofertar para o trabalhador e tentam antecipar as ações dos outros empreendedores para conseguir “capturar” essa oportunidade de lucro. Isso significa que se o primeiro empreendedor oferece um salário de $15 por hora e o trabalhador resolve trabalhar 6 horas e assim um lucro de $30 será auferido pelo empregador (produtividade por hora ($20 - $15)6 = $30). O empreendedor então descobre que o trabalhador pode trabalhar nos dias 1,2,3... e assim planeja sempre oferecer um salário de $15 por hora. Mas no dia 2 outros empreendedores descobrem essa oportunidade de lucro e descobrem que o empregador está pagando um salário de $15. Então eles vão oferecer um salário maior, digamos, $17.50, e o trabalhador responde a essa oferta mais gorda oferecendo 8 horas de trabalho, se aproximando da quantidade de trabalho ótima de 10 horas (que esgota as possibilidades de troca mutuamente benéfica entre o trabalhador e os consumidores do produto do trabalho do trabalhador). Mas o primeiro empreendedor vai descobrir que outro empreendedor está oferecendo um salário maior e vai ajustar sua oferta para um salário maior ainda. O processo equilibrativo termina quando o trabalhador receber um salário igual a $20 e essa discrepância no sistema de preços desaparecer. No equilíbrio o trabalhador vai trabalhar 10 horas e teremos uma alocação ótima do trabalho no sentido que as possibilidades de troca mutuamente benéfica entre o trabalhador e o mercado do produto do trabalho do trabalhador foram esgotadas.
Isso tudo significa que o processo competitivo em mercados com muitos agentes diferentes onde os empreendedores não tem uma percepção decente das preferências e dotações de cada agente mas descobrem discrepâncias no sistema de preços de mercado tende a um equilíbrio eficiente que é justamente o equilíbrio walrasiano. O mais importante é notar que nesse caso os empreendedores não precisam descobrir as preferências e as dotações de cada agente para realizar todas as transações mutuamente benéficas possíveis, diferente de outros equilíbrios, mas na verdade só precisam descobrir que existem discrepâncias nos preços de mercado e precisam antecipar as ações dos outros empreendedores de forma a conseguir capturar as oportunidades de lucro. Isso significa que a idéia Keynesiana de que uma situação onde os empreendedores ficam focados na antecipação das ações dos outros empreendedores seja uma situação negativa para o bem estar dos agentes está precisamente errada. Ao contrário, os empreendedores antecipam as ações dos outros empreendedores para capturar oportunidades de lucro que não podem ser capturadas imediatamente e por isso os empreendedores tem que reduzir a discrepância entre o preço de compra e o preço de venda de modo a conseguir capturar essa oportunidade de lucro, aproximando o mercado do equilíbrio (ou seja, corrigindo as ineficiências) de modo mais rápido do que se tivesse que descobrir as preferências de todos os agentes do mercado.