Desenvolvimento e infraestrutura no Nordeste
Economia

Desenvolvimento e infraestrutura no Nordeste



Ricardo Lacerda

Quem acompanhou os descaminhos da economia do Nordeste nos anos noventa deve lembrar como eram restritas as suas possibilidades. Na década liberal, as perspectivas de desenvolvimento para o Nordeste na prática inexistiam.

O espectro doutrinário predominante rechaçava políticas de desenvolvimento industrial ou regional, sob o pretexto de que elas geravam privilégios para as empresas que recebiam incentivos e afastavam a economia dos preços certos, determinados pelas vantagens comparativas dadas pela dotação de recursos de cada região ou país.

Vocação restrita

O discurso emitido pelo governo federal e repetido pelos governos estaduais e agências regionais de desenvolvimento restringia a dois os eixos de desenvolvimento que os formuladores de políticas recomendavam para o Nordeste: turismo e fruticultura irrigada. Ou pouco além disso.

Ao Nordeste do litoral caberia se transformar em um grande balneário e para o interior a redenção seria a agricultura irrigada. Turismo e fruticultura irrigada são importantes para o Nordeste mas os investimentos nessas áreas são insuficientes para dinamizar uma região com mais de 50 milhões de habitantes.
As disparidades de desenvolvimento entre as regiões eram consideradas como um resultado natural das forças de mercado, que tal como a uma força da natureza, nada poderia ser feito para contrariar.

O Nordeste não precisaria de novas indústrias porque as vantagens comparativas indicavam que elas deveriam ser situadas na região Sudeste que contava com infraestrutura, força de trabalho e proximidade do mercado de consumo. Dotar o Nordeste da infraestrutura para o desenvolvimento industrial e estimular o seu interior a edificar uma economia diversificada era impensável no ideário liberal, pois tudo que foge às vantagens comparativas era carimbado como desperdício de recursos.

Frente ao abandono de políticas nacionais de desenvolvimento regional, coube aos estados adotarem incentivos fiscais por meio da redução do ICMS para atrair empresas, no processo que ficou conhecido por guerra fiscal.

Paralisia

Os investimentos em infraestrutura produtiva e social no Nordeste praticamente paralisaram ao longo da década de noventa: a formação bruta de capital fixo do setor público, nas três esferas de governo (federal, estadual e municipal) na região despencou, apresentando taxas negativas de 6,3% para cada ano entre 1990 e 1996, período para o qual as estatísticas estão disponíveis (dados da SUDENE).

Na prática isso significava que recursos para estradas, saneamento e habitação minguavam e a expansão das redes federais de ensino técnico e de ensino superior nem era cogitada. O governo federal entrou em guerra aberta com o sistema público de ensino superior, com ataques frontais às universidades federais.

Depois da crise cambial de 1998/1999, quando o Brasil quebrou e teve que ser socorrido pelo FMI, com apoio dileto do governo norte-americano, o projeto liberal começou a naufragar, assim como em outros países.

Anos 2000

As economias dos estados nordestinos somente voltaram a apresentar perspectivas de retomar crescimento robusto com diversificação produtiva após o ciclo de crescimento iniciado em 2004. O crescimento da região acelerou a partir de então, impulsionado pela ampliação das políticas públicas. O Nordeste passou a crescer e a gerar emprego em ritmo superior às médias do país e das regiões mais ricas.

Foram especialmente importantes para a aceleração da expansão da economia do Nordeste a política de elevação real dos salários mínimos, os programas de inclusão social e a retomada dos investimentos em infraestrutura social (com destaque para saneamento e mobilidade urbana) e infraestrtura produtiva.

Estimativa da consultoria econômica Ceplan, de Pernambuco, aponta que todas as sub-regiões do Nordeste apresentaram, entre 2000 e 2011, taxas de crescimento do PIB superiores à média do Brasil. A aceleração do crescimento abrangeu as áreas de expansão da fronteira agrícola, como os cerrados nordestinos situados no oeste da Bahia e no sul do Piauí e Maranhão; o semiárido, a sub-região mais pobre de recursos naturais; e a sub-região úmida da Zona da Mata e Litoral, onde se situa o maior número de capitais com seus polos industriais, comerciais e de serviços.

Investimentos

Com a retomada do crescimento do país, a região Nordeste voltou a receber investimentos expressivos. Entre os principais investimentos realizados na região podem ser destacados as obras de infraestrutura como a Ferrovia Transnordestina, a Ferrovia Oeste – Leste (FIOL); a transposição do Rio São Francisco; a montagem de parques eólicos na região, em praticamente todos estados, iniciando por Rio Grande do Norte, Ceará, Sergipe e Bahia; as obras de duplicação da BR-101; os investimentos nos portos de Suape, Aratu e Pecém; o aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN); projetos ligados ao programa Luz para Todos e de recursos hídricos (Canal do sertão alagoano, a adutora do agreste em Pernambuco e o futuro canal de Xingó).

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) realizou, entre janeiro de 2010 e junho de 2014, operações creditícias para os estados do Nordeste no montante de R$ 60,7 bilhões, considerando apenas a modalidade de operações ditas não automáticas, com créditos superiores a R$ 10 milhões (ver Tabela).

Ná área de infraestrutura produtiva, tais operações alcançaram R$ 25 bilhões, com destaque para investimentos no setor de energia (hidroelétrica, termoelétrica e éolica) e transportes terrestres (rodoviário e ferroviário). No setor industrial, sobressaíram as operações para a indústria automobilística, química, papel e celulose, petróleo e gás e na indústria farmacêutica.

O retorno às políticas liberais não é, definitivamente, uma opção a ser considerada pelo Nordeste.



Tabela. Operações não automáticas do BNDES. 2010 a junho de 2014, segundo áreas operacionais. .R$ milhões

Áreas operacionais
R$ milhões
Participação (%)
Infraestrutura
25.385,15
41,8
Infraestrutura social
15.282,94
25,2
Insumos básicos
13.447,32
22,1
Industrial
6.404,41
10,5
Agropecuaria e de inclusão social
154,68
0,3
Meio ambiente
81,03
0,2
Pesquisa e acompanhamento econômico
4,83
0,01
Total
60.760,36
100
Fonte: BNDES





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