Ricardo Lacerda
É do senso comum que regiões e localidades com melhores recursos naturais atraem mais pessoas, formando maiores aglomerações populacionais e redes de cidades de malha mais estreita, com menores distâncias entre os centros urbanos. Não custa lembrar o contraste entre a elevada densidade populacional na Zona da Mata, com solos mais adequados para a agricultura e menos sujeita a estiagens, e a população relativamente rarefeita do semi-árido nordestino, com características climáticas mais inóspitas.
Além da geografia, a história também conta. Uma vez criadas as aglomerações humanas, a partir de um evento inicial de motivação econômica, política ou religiosa, operam-se mecanismos de autorreforço que podem as fazer crescer cumulativamente. Novos eventos ao longo da história, como mudanças econômicas, tecnológicas ou institucionais (de caráter endógeno ou exógeno), a exemplo do efeito do surgimento da indústria de pneumáticos na virada para o século XX sobre a extração do látex das seringueiras da Amazônia, abrem possibilidades de mudar a distribuição espacial da população.
A evolução dos meios de transporte e as mudanças nas restrições legais à migração cumprem seu papel, o que deixa a nossa análise referenciada apenas a movimentações internas. Ficando posta a questão, passemos a observar os indicadores de densidade populacional dos estados brasileiros e dos territórios e municípios sergipanos.
Estados
Na tabela a seguir, são apresentadas a população, a área territorial, a densidade populacional de 2010 e a taxa de crescimento populacional, entre 2000 e 2010, das unidades federadas.
Em sua dimensão continental, com vastas áreas de florestas, a densidade populacional brasileira é de 22,4 pessoas por km2. O Distrito Federal e o Rio de Janeiro (que abrange o ex-Distrito Federal) têm densidades demográficas muito mais elevadas do que as demais unidades federadas, 442,92 pessoas/km2 e 365,94 pessoas/km2, respectivamente, o que bem diz do poder de atração de uma capital federal e da ordem de grandeza da transferência de riqueza que se procede dos demais estados para o centro do poder político.
Não é demais lembrar que, entre 2000 e 2010, o Distrito Federal registrou crescimento populacional de 25,3%, o 4º mais elevado entre as unidades federadas, abaixo apenas de estados de populações pequenas da região Norte, enquanto o Rio de Janeiro reduziu sua taxa relativa de crescimento populacional frente à media nacional, desde que deixou de ser capital.
Nordeste
O peso do passado, expresso no povoamento e na criação dos sistemas de produção dos primeiros séculos, muitas vezes ainda tem grande significado. É interessante perceber que estados da região Nordeste Oriental, na área delimitada entre o Rio Grande do Norte e Sergipe, apresentam-se entre os de maiores densidades populacionais, apesar de mais de dois séculos de crescimento em ritmo médio inferior ao chamado Centro-Sul.
É possível associar densidade e extensão territorial no sentido de que estados de menor dimensão, excluídos os de fundação mais recentes da região Norte, teriam maior densidade. Assim, estados como Alagoas, Sergipe, Espírito Santo, Paraíba e Rio Grande do Norte e Santa Catarina têm maior densidade populacional do que estados de maior extensão, como Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Maranhão, Bahia, entre outros.
A argumentação pode ser aceita, mas apenas parcialmente. Faz sentido para situações como a de Alagoas e Sergipe, que têm as mais elevadas densidades populacionais da região Nordeste, especialmente porque esses estados têm uma menor parcela de suas áreas territoriais no semi-árido. Mas a relação causal pode estar invertida. De um ponto vista histórico, esses estados se constituíram províncias autônomas exatamente porque contavam com densidades econômicas e populacionais que abriam um espaço para esse tipo de reivindicação.
Tabela: População, Área Territorial e Densidade Populacional das Unidades da Federação. 2010. |
Ranking de densidade | UFs | População 2010 | Área (Km2) | Densidade populacional 2010 (Pop/km2) | Crescimento Populacional 2000-2010 (%) |
1º | DF | 2.570.160 | 5.802 | 442,98 | 25,3% |
2º | RJ | 15.989.929 | 43.696 | 365,94 | 11,1% |
3º | SP | 41.262.199 | 248.209 | 166,24 | 11,4% |
4º | AL | 3.120.494 | 27.768 | 112,38 | 10,6% |
5º | SE | 2.068.017 | 21.910 | 94,39 | 15,9% |
6º | PE | 8.796.448 | 98.312 | 89,48 | 11,1% |
7º | ES | 3.514.952 | 46.078 | 76,28 | 13,5% |
8º | PB | 3.766.528 | 56.440 | 66,74 | 9,4% |
9º | SC | 6.248.436 | 95.346 | 65,53 | 16,7% |
10º | RN | 3.168.027 | 52.797 | 60,00 | 14,1% |
11º | CE | 8.452.381 | 148.826 | 56,79 | 13,8% |
12º | PR | 10.444.526 | 199.315 | 52,40 | 9,2% |
13º | RS | 10.693.929 | 281.749 | 37,96 | 5,0% |
14º | MG | 19.597.330 | 586.528 | 33,41 | 9,5% |
15º | BA | 14.016.906 | 564.693 | 24,82 | 7,2% |
16º | MA | 6.574.789 | 331.983 | 19,80 | 16,3% |
17º | GO | 6.003.788 | 340.087 | 17,65 | 20,0% |
18º | PI | 3.118.360 | 251.529 | 12,40 | 9,7% |
19º | MS | 2.449.024 | 357.125 | 6,86 | 17,9% |
20º | RD | 1.562.409 | 237.576 | 6,58 | 13,2% |
21º | PA | 7.581.051 | 1.247.690 | 6,08 | 22,4% |
22º | TO | 1.383.445 | 277.621 | 4,98 | 19,6% |
23º | AC | 733.559 | 152.581 | 4,81 | 31,6% |
24º | AP | 669.526 | 142.815 | 4,69 | 40,4% |
25º | MT | 3.035.122 | 903.358 | 3,36 | 21,2% |
26º | AM | 3.483.985 | 1.570.746 | 2,22 | 23,9% |
27º | RR | 450.479 | 224.299 | 2,01 | 38,9% |
Fonte. IBGE.
Ciclos
Como regra geral, é de se esperar que as regiões e as localidades com mais oportunidade de trabalho atraiam populações e aquelas menos promissoras expulsem-nas. A associação entre a extensão territorial e a dimensão da população é um resultado formado ao longo dos tempos, com peso maior de processos antigos, em alguns casos, e de processos mais recentes, em outros, pelas diversas camadas de ciclos de crescimento e de estagnação, que geram certa proporção entre elas, a densidade populacional. Deve-se considerar que os mecanismos sociais que atraem e expulsam pessoas operam longe da perfeição, dado que a migração de populações não se dá sem elevados custos econômicos e emocionais e encontra limitações legais.
Mais precisamente, a densidade populacional poderia ser pensada como um indicador do potencial dos recursos do território em receber contingente populacional, em determinadas condições, e não um indicador de desenvolvimento humano, como por fim e ao cabo é mais correto pensar o desenvolvimento. No próximo artigo, será examinada a densidade populacional dos municípios sergipanos, observando-se as áreas que logram acumular maior contingente de pessoas.
Publicado no Jornal da Cidade de 25/03/2012
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