Batalha naval
Economia

Batalha naval



Os 18 leitores já perceberam que tenho uma modesta diferença com a equipe econômica no que diz respeito à política adotada há algum tempo no Brasil: eles a consideram genial, um modelo de como gerir o país no contexto de um mundo instável; eu, por outro lado, a classifico como uma abominação, provavelmente a principal responsável pelo medíocre desempenho recente do país, que, na ausência de mudanças, deve ser também a marca registrada dos anos que virão.

Dentre todas suas características, porém, o que mais me incomoda é a percepção do improviso constante. O governo parece atirar em todas as direções, na esperança que alguma das suas medidas atinja o alvo e afunde o submarino adversário, mas a falta de um diagnóstico retira destes disparos um mínimo de orientação. Deste modo as chances destas ações gerarem um processo de crescimento sustentável são muito baixas, para não dizer nulas.

Tomemos, por exemplo, a recente desoneração da folha salarial do setor de construção civil. Trata-se, à primeira vista, de uma proposta meritória: o setor responde sozinho por cerca de 8% do emprego no país e é uma porta tradicional para o mercado de trabalho no caso da mão de obra com baixa qualificação. Ao mesmo tempo os salários no setor têm crescido aceleradamente (pouco mais de 9% na comparação com o ano passado, segundo dados da FGV), de modo que um alívio nos encargos tem a possibilidade de ajudar o segmento.

Falta, todavia, a visão do conjunto da economia. Com a taxa de desemprego na casa de 5% a 5,5%, parece claro que já operamos muito próximos ao pleno emprego, senão acima dele. Nestas circunstâncias, o estímulo à contratação de trabalhadores em um setor, no caso a construção civil, deve elevar também os salários em outros setores, notadamente o industrial, cujo salário de admissão é apenas um pouco inferior ao observado na construção.

Isto, contudo, agrava a perda de competitividade da indústria, uma vez que a elevação salarial já tem superado persistentemente o crescimento da produtividade mesmo antes da adoção da medida. Adicione-se a isto que a manufatura, ao contrário da construção, está sujeita à concorrência internacional, de modo que enfrenta limites à sua capacidade de repasse das elevações salariais aos preços. Como tenho argumentado, este é o principal fator limitante da expansão da produção industrial.

Trata-se de um clássico caso de cobertor curto: o incentivo à construção conflita com o objetivo de crescimento manufatureiro. Assim, muito provavelmente o governo terá que adotar novas medidas para compensar a indústria, incluindo novas rodadas de proteção e desvalorização cambial.

No entanto tais políticas também têm consequências negativas, seja do ponto de vista de elevação dos preços domésticos (a inflação parece que vai superar os 5,5% em 2012, o que me coloca na posição desconfortável de ter sido otimista demais nas minhas previsões no começo do ano), seja do ponto de vista de incentivos à expansão da produtividade e do investimento.

Poderia me estender, mas acredito que o argumento ficou claro. Por falta de um diagnóstico coerente o governo tem mais objetivos do que instrumentos, o que gera conflitos de políticas e reiterados remendos, daí a percepção inevitável (e correta) de improvisação persistente.

Desta forma, enquanto a equipe econômica não entender que o problema no Brasil não reside na fraqueza do consumo e da demanda, e sim no baixo crescimento da produtividade no contexto de uma economia próxima ao pleno emprego, não há porque imaginar que este padrão (se é que assim podemos chamá-lo) de política possa ser alterado.

Se há alguma certeza acerca dos rumos da economia no futuro próximo é que testemunharemos novos pacotes a intervalos crescentemente reduzidos e com a mesma efetividade para acelerar o crescimento até agora observada.

Água, água e água...


(Publicado 12/Dez/2012)



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