A quarta geração da escola austríaca: Os pensadores responsáveis pela reemergência da escola.
Desde os primeiros anos da década de 70, a Escola Austríaca se reergueu e tem crescido nas ultimas décadas, se consolidando nos EUA. A Escola Austríaca havia sido praticamente extinta na década de 30, com a consolidação da economia matemática e a transformação completa da teoria marginalista na moderna teoria neoclássica. Além é claro, da revolução keynesiana, que abalou a profissão, convertendo muitos economistas neoclássicos em keynesianos, afastando muitos economistas das idéias de EA, que fazia parte do mainstream neoclássico até a década de 30.
Esse processo de consolidação dos métodos matemáticos transformou a economia de uma ciência que estudava processo equilibrativos de mercado, numa ciência que apenas estudava equilíbrios parciais no modelo Marshalliano ou equilíbrios gerais no modelo Walrasiano. Com isso, as noções de processo de mercado e desequilíbrio (que estavam apenas implicadas de forma sutil nos trabalhos da época), que atualmente são o foco da análise da EA atual, foram praticamente exterminadas do ensino da economia. Mises e Hayek, que fizeram descobertas importantíssimas nas décadas de 30 e 40, eram após a Segunda Guerra, os únicos economistas da Escola Austríaca ainda ativos na profissão.
Atualmente, a EA é uma escola relativamente pequena, mas está em constante crescimento e consolidação, seu renascimento se deu sem dúvida graças a Ludwig von Mises e seus mais de 20 anos de trabalho na New York university nas décadas de 50 e 60, para cultivar uma nova geração de economistas subjetivistas. Na década de 70, com a crise do petróleo (que retirou os keynesianos do mainstream e deu espaço para outras escolas), o premio nobel de Hayek em 1974 e a publicação de Competition and Entrepreneurship do Kirzner em 1973, a escola Austríaca voltou a ser uma escola de pensamento vibrante e passou a se espalhar, contanto hoje com vários núcleos pelos EUA. Os centros de pensamento econômico na tradição da EA hoje são basicamente a George Mason University, a New York University e o Ludwig von Mises institute.
Esse florescimento do pensamento na tradição austríaca ocorreu a partir dos trabalhos de 3 pensadores, todos fortemente influenciados pelo trabalho de Mises:
Murray Rothbard (1926-1995): O mais radical em termos políticos dos economistas, um defensor do anarco capitalismo, Rothbard é o economista mais famoso da geração pós Viena da escola. Seu período mais produtivo dentro do estudo da teoria econômica foram as décadas de 50 e 60, quando publicou livros como Man, Economy and State e America's Great Depression. De sua geração, foi o economista que seguiu o método praxeológico de Mises com maior consistência. Também foi o economista Austríaco de sua geração o que mais se preocupou com análise de estados de equilíbrio, embora é claro que também se focou em processos equilibrativos, mas com um grau bem menor de consistência do que Kirzner e Lachmann.
Após quase 20 anos de grande produção intelectual na área da teoria e história econômica, Rothbard passou a se dedicar a ciência politica e a história do pensamento econômico, nas décadas de 70 e 80. Ele foi um dos membros fundadores do Partido Libertário americano e ajudou a desenvolver teorias de como funcionaria uma sociedade anarco capitalista. Foi o economista de sua geração mais engajado na politica e o principal critico da intervenção estatal no mercado.
Israel Kirzner (1930-): Provavelmente mais importante economista da tradição austríaca desde Hayek. Kirzner foi responsável pela formação e consolidação do paradigma de pensamento da escola Austríaca moderna. Combinando as idéias de Hayek sobre a natureza do conhecimento, do processo de mercado como um processo de descoberta e da natureza subjetivista do equilíbrio, com as idéias de Mises da ação empresarial como força dinâmica do processo de mercado, e sua função geradora de tendências equilibrativas. Kirzner formulou a teoria de processo empresarial de descoberta, que é atualmente a base do pensamento da maior parte dos economistas austríacos desde meados da década de 70.
Sua teoria se baseia no entendimento da natureza subjetivista do equilíbrio econômico ou seja, da natureza do problema do conhecimento, que é considerado por ele como o problema econômico fundamental. Para solucionar o problema do conhecimento, Kirzner se baseou na idéia misesiana do empreendedor, que considera que o empreendedorismo é a parte da ação humana que lida com a incerteza genuína que caracteriza, num certo grau, toda ação humana. Todo indivíduo é num certo grau um empreendedor, já que lida continuamente com a incerteza genuína no dia a dia. Mas o empreendedorismo quase puro, só se pode encontrar no mercado em empresários inovadores, que percebem uma maneira de comprar por 5 e vender por 10, algo que nenhuma outra pessoa havia percebido anteriormente. O equilíbrio é uma situação onde não existem diferenciais nos preços, logo onde não existe incerteza genuína nem possibilidades de lucros e perdas empresariais, num mundo em completo equilíbrio empresários simplesmente não existem. Esse tipo de mundo é o mundo da teoria neoclássica. Já Kirzner construiu seu paradigma teórico, não num mundo em completo equilíbrio, mas num mundo que está longe do equilíbrio, e que a ação empresarial move em direção ao equilíbrio. Sua teoria é uma teoria no processo equilibrativo de mercado e os empreendedores são a força motriz desse processo que, assumindo que os dados do mercado sejam fixos, para se focar no elemento equilibrativo, levará ao estabelecimento de um equilíbrio no futuro.
Ludwig Lachmann (1906-1990): O menos conhecido dos economistas austríacos dessa geração, mas não menos importante, Lachmann foi um subjetivista radical. Enquanto Rothbard se focava mais na análise de estados de equilíbrio em sua análise, e Kirzner se focava na analise de processos de mercado que tendem ao equilíbrio, Lachmann se focava no desequilíbrio, e na sua natureza. Segundo Lachmann, a economia do mundo real nunca está em equilíbrio ou mesmo próxima do equilíbrio, para ele, o equilíbrio não existia além de uma construção mental de modelos walrasianos. Isso se devia a natureza subjetiva não só do valor mas também das expectativas dos agentes.
A análise de Lachmann não era só baseada na economia de Mises e Hayek, como também foi fortemente influenciada por G. L. S. Shackle, um economista pós keynesiano. Segundo Shackle a economia neoclássica não se aplicava a realidade simplesmente porque ela assumia que a incerteza genuína não existia. Nesse aspecto Shackle está no mesmo barco que a EA, mas diferente da EA, para ele não existiam nem mesmo tendências equilibrativas no mercado, ou seja, o mundo sempre estaria em completo desequilíbrio. Essa conclusão se deve a percepção subjetivista da natureza das expectativas no trabalho de Shackle. Lachmann afirmava que embora Mises e Hayek entendessem a natureza subjetiva do valor, eles falhavam em entender que além disso, as expectativas dos agentes em relação ao futuro também são subjetivas, ou seja, cada agente interpreta o sucesso de suas expectativas de maneira própria. Logo não é possível afirmar que essas expectativas tendam a ser reajustadas na direção da formulação de um plano de ação que posteriormente não poderá ser considerado incorreto, segundo o próprio julgamento subjetivo do indivíduo. Lachmann e Kirzner discutiram exaustivamente suas idéias em relação ao subjetivismo durante três décadas, até a morte de Lachmann em 1990.