A pressão da moeda sobre os preços
Economia

A pressão da moeda sobre os preços


Massa monetária cresce ao ritmo mais alto em 17 anos e "força" BCE a manter subida de juros

O dinheiro em circulação continua a crescer a um ritmo elevado e os europeus não abrandam no recurso ao crédito. O BCE avisa que pode ter de intervir


A aceleração da massa monetária em circulação na Zona Euro para o ritmo mais elevado dos últimos 17 anos deu ontem ao Banco Central Europeu novos argumentos para continuar a subir as taxas de juro durante os próximos meses.O indicador M3 - que agrega os montantes totais das notas e moedas em circulação, dos depósitos e de outros activos transaccionáveis - registou em Fevereiro passado uma variação homóloga de 10 por cento. Para encontrar um valor mais elevado, é necessário recuar até ao mês de Fevereiro de 1990. A massa monetária em circulação é um indicador utilizado pelo BCE para antecipar a ocorrência de pressões inflacionistas a médio e longo prazo, algo que o banco está mandatado para impedir. Em teoria, quanto mais elevado for o ritmo de crescimento do M3, mais possibilidades existem de, no futuro, os preços começarem a subir. É por isso que Jean-Claude Trichet, em declarações feitas ontem, afirmou que irá "olhar com muito, muito cuidado para extrair toda a informação possível destes novos dados". O presidente do BCE mostrou-se desde já preocupado pelo facto do recurso ao crédito mostrar "sinais muito reduzidos de moderação".Os responsáveis do BCE têm avisado, por diversas vezes, que a forma como os europeus têm continuado a recorrer aos bancos para financiarem o seu consumo (especialmente de casas) não só constitui um risco para a estabilidade de preços, como é uma prova de que as taxas de juro se encontram a níveis ainda baixos. Portugal, com uma taxa de crescimento económico baixo e com um elevado nível de endividamento, pode ser um dos países mais afectados.O recurso ao crédito - um dos dados paralelos à evolução do M3 ontem revelado pelo BCE - apresentou uma taxa de crescimento homóloga na Zona Euro de 10,3 por cento, o que representa uma correcção demasiado ligeira face aos 10,6 por cento de Janeiro. Os empréstimos para compra de casa mantiveram uma taxa de crescimento de 9,4 por cento.Perante estes números, Jean-Claude Trichet aproveitou para repetir as declarações que tinha feito após a última reunião do conselho de governadores e que foi lida pelos analistas como um anúncio de novas subidas de taxas ainda durante a primeira metade do ano. "A nossa política monetária continua a ser acomodatícia, as taxas de juro do BCE são moderadas e o crescimento do crédito e da massa monetária é vigoroso. Isso foi mesmo agora confirmado", disse. Neste momento, a taxa de juro de refinanciamento do BCE encontra-se nos 3,75 por cento, após a ocorrência de sete subidas consecutivas, iniciadas em Dezembro de 2005. A generalidade dos analistas espera, dentro dos próximos três meses, uma nova subida para os quatro por cento. Até ao final do ano, as previsões feitas para as taxas de juro encontram-se maioritariamente entre os 4,25 e os 4,5 por cento.

Sérgio Aníbal , "Massa monetária cresce ao ritmo mais alto em 17 anos e "força" BCE a manter subida de juros", Jornal Público, 29 de Março de 2007, p.41.

Notas explicativas
Os bancos, quando emprestam dinheiro às pessoas ou empresas, aumentam os saldos das contas bancárias dos seus clientes, que posteriormente podem financiar a compra de viagens às Caraíbas, de carros, de casas, de equipamentos industriais, etc. Com a concessão de crédito (e portanto com o aumento dos depósitos bancários), os bancos criam moeda escritural, e portanto aumentam os meios de pagamento disponíveis na economia. Podemos dizer que a economia é oleada. E isso é bom, desde que não seja excessivo. Se for excessivo, a produção das empresas tem dificuldade em conseguir acompanhar o aumento da procura de bens, e o aumento da massa monetária (ou seja dos meios de pagamento, do agregado M3 que é referido na notícia) traduz-se em aumento da taxa de inflação (são as "pressões inflacionistas" referidas no artigo).

"O indicador M3 (...) registou em Fevereiro passado uma variação homóloga de 10 por cento." Isto significa que o valor de M3 no mês de Fevereiro de 2007 é 10,3% superior ao valor que teve em Fevereiro de 2006 - e este aumento é muito elevado. O BCE espera que a variação anual seja apenas cerca de 4,5% (este valor é compatível com um crescimento real do PIB na ordem dos 2,5%, e com uma inflação perto de 2%). Daí a preocupação do BCE que é relatada na notícia. O aumento da taxa de juro que se refere como possibilidade, irá no sentido de moderar a corrida ao crédito bancário, o que, como vimos atrás, diminui a pressão sobre a inflação. Mas é claro que o aumento das taxas de juro tem o inconveniente de dificultar a vida às famílias e às empresas que têm dívidas, visto que terão de pagar juros mais elevados pelos empréstimos que contraíram.

Perguntinhas
a) O que inclui o agregado monetário M3?
b) O que se entende "a nossa política monetária continua a ser acomodatícia"?
b) O que é a taxa de juro de refinanciamento do BCE? Qual é o seu valor actual?
c) O aumento substancial de M3 no passado recente pode conduzir a uma pressão para aumentar ou para diminuir a taxa de juro de refinanciamento do BCE? Porquê?
d) Parece que o BCE se preocupa muito mais com a inflação do que com o desemprego. Porquê?



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