Economia


Por que sou libertário

Em artigo publicado no Jornal do Brasil, dia 08/03/07, intitulado Por que não sou liberal, Olavo de Carvalho justifica sua posição conservadora ao tempo em que diferencia esta da posição liberal. Tomo o referido artigo como estímulo e provocação para justificar porque não sou liberal nem conservador, mas sim, libertário. Antes, porém, é necessário esclarecer os conceitos fundamentais para o entendimento da coisa.

Para Olavo o conservador defende a liberdade de mercado porque ela promove o Estado de direito, enquanto que o liberal defende o Estado de Direito porque ele promove a liberdade de mercado. O libertário, contrariamente, rejeita ambas as posições. O libertário é aquele indivíduo que é invariavelmente contra toda e qualquer forma de agressão à vida e à propriedade de outro indivíduo. Esse é o princípio básico e fundador do credo libertário, chamado por Rothbard de “teorema da não agressão”.

Então é imperioso que entendamos o que é o Estado, esta entidade amplamente aceita tanto pelos liberais quanto pelos conservadores. O Estado é uma entidade que detém o monopólio sobre a oferta de determinados serviços (geralmente se reconhece que o Estado deva ofertar, no mínimo, serviços de segurança, justiça e ordem) sobre um determinado território. Outra característica inédita é que o Estado obtém sua renda através dos impostos e não das relações voluntárias e contratuais como ocorre no mercado.

Assim sendo, o Estado é por natureza o perfeito predador social, uma entidade que se caracteriza pela agressão e pelo confisco da propriedade alheia. Por isso, é logicamente impossível argumentar em favor da propriedade privada, do livre mercado e da não agressão aos demais, quando, em meio a isso, não se abstrai o Estado. Liberdade e Estado são incompatíveis. Durante séculos o Estado (através dos membros do governo) tem produzido assassinatos em massa que chamou de “guerras”. Por séculos o Estado tem escravizado pessoas em seus exércitos e chamou isso de “conscrição” para o “serviço nacional”. Por séculos o Estado tem roubado as pessoas e chamou isso de “impostos”.

Contrariamente, a questão da religião e dos valores morais tradicionais, tão caro aos conservadores, estão intimamente associados ao credo libertário, porém, consignado ao direito de propriedade privada. Ao dizer que a tradição judaico-cristã fundamentou a liberdade de mercado e o estado de direito, Olavo de Carvalho não falou para que serve o Estado, ou não se deu conta que o Estado vive exclusivamente da agressão e do roubo, atribuição não somente negada mas criminalizada à todos os demais indivíduos e organizações. Essa ética jamais pode derivar do cristianismo.

O direito à vida e, consequentemente, à propriedade privada é antes de tudo um direito natural e para isso não precisa do Estado. Aliás, o Estado é a personificação cabal da própria negação desde direito. Pois, como pode uma entidade criada para proteger a propriedade privada viver exatamente da agressão à propriedade? Ora, se qualquer indivíduo ou organização ousar confiscar ou tributar a propriedade alheia, imediatamente se enquadrará no crime de roubo.

Outro ponto fundamental é o monopólio da justiça que o Estado se outorga. A propensão natural do ser humano é buscar sempre o seu auto-interesse. Assim sendo, a crítica libertária mostra que os legisladores (que são membros do próprio aparato estatal e também são seres humanos) sempre tenderão fazer leis em favor do próprio Estado. A expansão do poder estatal ao longo da história foi uma conseqüência inevitável de sua própria natureza. O questionamento libertário é o fato paradoxal que uma entidade com o monopólio exclusivo do poder de última decisão em caso de conflito (justiça) e a exclusividade de obter sua renda através do roubo seja necessária, ou melhor, seja ideal para a justiça e a segurança.

Sinto-me incapaz de seguir o ideal conservador ou liberal, ou qualquer outro ideal que requeira o Estado como protetor, organizador e fornecedor da justiça ou de qualquer outro bem ou serviço que se queira. Em poucas palavras, prefiro a ética libertária com suas naturais imperfeições à ética da agressão e do roubo oficializado.
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Para uma análise profunda sobre estes e outros tópicos da fragilidade do ideal conservador e liberal e da alternativa libertária, vide:

1. Hoppe, Hans-Hermann. Democracy: The God That Failed. Transaction Publishers, 2001.
2. Hoppe, Hans-Hermann. Natural Elites, Intellectuals, and the State. (
http://www.mises.org/story/2214)
3. Rothbard, Murray N. For a New Liberty: The Libertarian Manifesto. Macmillan Publishing, 1978.
4. Rothbard, Murray N. Robert Nozick and the Immaculate Conception of the State. (
http://www.mises.org/journals/jls/1_1/1_1_6.pdf)
5. Osterfeld, David. Anarchism and the Public Goods Issue: Law, Courts, and the Police. (
http://www.mises.org/journals/jls/9_1/9_1_3.pdf)
6. E, por fim, a indispensável compilação de livros e papers feita por Hoppe
http://www.lewrockwell.com/hoppe/hoppe5.html



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