Sobre a música dos Deolinda - Geração parva
Economia

Sobre a música dos Deolinda - Geração parva


Devo talvez começar adiantar que a música e letra não me dizem muito, que está fora de causa que os níveis de vida e de consumo são em média muito superiores aos que existiam há 15 anos atrás e que concordo que a letra pode ser interpretada como desvalorizando a importância da educação.

Dito isto, parece-me que as razões que justificam o "fenómeno" (se assim o podemos chamar) são sobretudo o facto de  tocar num ponto sensível, exprimindo um certo desencanto difuso de uma (parte) de uma geração que se sente de algum modo bloqueada e desencantada pelo facto de não conseguir encontrar estabilidade no emprego que lhe permita uma vida autónoma.

Parte do problema estará nos níveis de consumo que (muitos) jovens usufruem na "casinha dos pais" e que dificilmente conseguem sustentar no início de carreira (que sempre foi dificil) levando-os a optar por adiar "Filhos, maridos" para poder pagar o carro. Verificando os resultados dos inquéritos ao emprego do INE desde 1998 verificamos no entanto um dado que de algum modo pode ajudar a explicar este desencanto. É que se em 1998 a percentagem dos trabalhadores por conta de outrem com contrato sem termo era de 82,8% (média anual), nos últimos quatro trimestres concluidos em Setembro de 2010 esse valor desceu para apenas 77,0%. Uma diferença de 5 pontos percentuais pode não parecer muito mas é um valor significativo, sobretudo pelo facto de que esse aumento ter-se-á provavelmente concentrado nos trabalhadores mais jovens que serão também já os mais afectados pelo desemprego (em % da população activa) que no mesmo período aumentou de 5% para 10,5%.

Embora não disponha de dados que o fundamentam penso, ainda, que é provável que tenha ocorrido um outro fenómeno. Enquanto até ao final da década de 90 os vínculos precários afectavam sobretudo os trabalhadores pouco qualificados, e não tanto os licenciados, desde então essa precarização passou a afectar muitos licenciados. Fruto por um lado dos efeitos da globalização a que o professor Mário Centeno se referiu na sua entrevista ao Público (ver aqui) que tem exercido pressão "no sentido de aumento do peso de dois tipos de profissões: as muito qualificadas e as pouco qualificadas” e, por outro lado, da redução das oportunidades de emprego no sector estatal que tradicionalmente absorvia uma percentagem substancial dos licenciados que iam saindo das universidades.



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