VINICIUS MOTA, na FOLHA DE S. PAULO de hoje, escreve sobre “o impensável”.
O ano que vem marcará o 50º aniversário do episódio mais tenso da Guerra Fria. Em outubro de 1962, soviéticos e americanos flertaram com o embate direto, a partir da resposta dos EUA à instalação, em Cuba, de bases de mísseis de ataque da URSS.
A ameaça de escaramuça desafiou a sociedade a especular sobre o que restaria em caso de colapso daquela ordem bipolar. A abstenção do combate frontal entre americanos e soviéticos, afinal, era um requisito que conferia estabilidade e previsibilidade às relações e aos conflitos internacionais.
A guerra aberta inauguraria um período de prolongada incerteza.
E o que ocorreria hoje se o dólar e os títulos do Tesouro dos Estados Unidos deixassem de ser o esteio das finanças globais? Como no caso dos mísseis, a ameaça de calote americano questiona fundamentos da organização do mundo como ele é -ou parece ser.
A resposta é impensável nos termos atuais. Não há moeda para a qual fugir; não há governo com poder econômico e credibilidade comparáveis; não há arquitetura financeira para absorver o colosso de riqueza denominada em dólares.
E entretanto faz 30 anos que os Estados Unidos estão afundando no vermelho. Para sustentar o consumo, o governo faz dívida com seus cidadãos, as famílias penduram sua renda futura em bancos e cartões de crédito, e o país inteiro toma emprestado do exterior.
Com a produção estagnada no nível de 2007 -e a probabilidade de resultados ruins até 2012-, os EUA rolam a conta na base da maquininha de imprimir dólares e papéis do Tesouro. Apesar dos resmungos, o mundo todo aceita o jogo, pois treme de pensar na desordem profunda que o fim dessa ilusão monetária acarretaria.