O recado de Lourenço
Economia

O recado de Lourenço



No público de hoje (texto não disponível online) Vasco Pulido Valente "atira-se" a Eduardo Lourenço, a propósito do seu artigo (reproduzido abaixo)do dia 2 de Janeiro sobre a "depressão nacional", o qual comentámos aqui. Escreve VPV: «ele [Eduardo Lourenço] que durante 30 anos persistentemente encorajou o 'excesso dos nossos sonhos', desistiu de excessos», e «resignou».

Não concordo com VPV. O que Eduardo Lourenço faz, e bem, é desmascarar os álibis que estamos constantemente a inventar para não agarrar os problemas a sério. É um facto que o país evoluíu muito ao longo dos últimos 40 anos, tanto em termos económicos como sociais - quem duvida que consulte o estudo de dirigido por António Barreto sobre A Situação Social em Portugal 1960-1999. Mas Eduardo Lourenço não diz que o país não tem problemas: afirma que, se os quer resolver, tem de se deixar de fitas. Esta gritaria histérica sobre o facto do país ter "batido no fundo", "nada funcionar", é a maneira mais fácil de deixar tudo na mesma, enquanto cada um se sente muito contentinho per "denunciar" a situação. "Eu bem disse", é o nosso lema, em vez de: "eu bem fiz".

As citações, agora recorrentes, das Farpas de Eça de Queiróz, que por aí circulam e que deixam os basbaques aturdidos de espanto com a "semelhança", ignoram o facto de que o país está muito diferente do que era nos tempos de Eça - e para muito melhor. Só o exagero da nossa canastrona representação (e a ignorância da História económica e social do país) é que permite tais comparações acéfalas.

O que o ensaísta fez foi reagir adequadamente a mais uma encenação dramática da nossa "eterna crise", desta vez montada pelo Diário de Notícias, mas que se encontra permanentemente em cena nos palcos por onde passeamos as nossas máscaras.

Os três parágrafos de Eduardo Lourenço, ao contrário do que insinua VPV, nada têm a ver com "direita" ou "esquerda", já que ambas participam com talento na farsa; a única diferença entre elas é que o culpado da "crise", para a direita, é o 25 de Abril, enquanto que para a esquerda é o "grande capital" e o "neo-liberalismo". E é claro que para manter o dramatismo da representação não se pode admitir o quanto o país tem melhorado: nem à esquerda (seria reabilitar Salazar e Caetano) nem à direita (seria branquear a Revolução). Aliás, não foi só a esquerda que ignorou o texto de Eduardo Lourenço: a direita também. Ambas sentiram que o recado lhes era dirigido. Ambas enfiaram o barrete.

[Leia-se abaixo o texto referido de Eduardo Lourenço]



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