Economia
Moisés Naím e Martin Wolf numa conversa econômica.
Uma conversa entre MOISÉS NAÍM e MARTIN WOLF merece ser divulgada pelo menos para os meus quase ainda dois fieis leitores. Abaixo matéria obtida no UOL on line.
A crise
transformou alguns comentaristas econômicos em personagens de fama mundial. Um
deles é Martin Wolf, o principal editorialista econômico do Financial Times e
certamente um dos colunistas mais influentes do momento. Conversei com ele
alguns dias atrás em Istambul. "Que aspectos da crise o
surpreenderam?", perguntei.
*
Martin Wolf
- O pouco capital próprio que possuíam os bancos e outras instituições
financeiras, para os riscos que assumiam. Captavam dinheiro a curto prazo e o
colocavam no longo prazo. Eu tinha voltado toda minha atenção à macroeconomia e
não vi o que estava acontecendo com a microeconomia. Esse é o maior erro que
cometi em minha carreira. Meu outro erro foi não ter me dado conta de quão
fracos e inadequados eram os controles e regulamentos dos bancos.
Que responsabilidade têm os jornalistas nesta
crise?
Eles cometeram muitos erros de omissão.
Deveriam ter sido muito mais agressivos e rigorosos na fiscalização dos bancos,
os reguladores, etc. O problema é que, em geral, os jornalistas sabem pouco de
economia e finanças.
Mas os economistas mais renomados tampouco se
cobriram de glória. Nem previram a crise nem entraram em acordo quanto a como
administrá-la. Quais foram as exceções?
Nouriel Roubini alertou desde cedo sobre as
bolhas nos preços de certos ativos financeiros e sua relação com o
endividamento e percebeu que essa mistura era explosiva. Robert Shiller
analisou melhor que ninguém o que estava acontecendo no setor imobiliário. E
Raghuram Rajan soou o primeiro alarme sobre a fragilidade do setor financeiro e
explicou como ele estava se convertendo em ameaça à estabilidade global. Na
realidade, porém, houve muitos outros. E a verdade é que a economia ortodoxa
mostrou não ter utilidade para explicar o que acontece.
Mas os chefes de Estado precisam administrar
a situação, mesmo que as recomendações que os economistas lhes dão sejam de
qualidade duvidosa. Como o sr. qualifica a administração da crise feita por
George W. Bush, Barack Obama, Wen Jiabao e Angela Merkel?
Bush, reprovado. Obama e Wen Jiabao,
aprovados. Merkel, aprovada como líder da Alemanha e reprovada como líder
europeia.
Mas Obama está sendo criticado ferozmente pelo
modo como administra a economia.
De fato. Seus críticos argumentam que a
recessão dos EUA deveria ter sido mais curta e a recuperação mais veloz e
vigorosa. Mas, com base na experiência histórica e na análise objetiva, a crise
que Obama herdou deveria ter causado uma recessão ainda mais profunda que a que
houve, e provavelmente até uma forte depressão. Obama conseguiu evitar essa
catástrofe, e, desde que a crise começou até agora, a economia americana é a
que mais se recuperou, em comparação com as dos outros cinco países mais
avançados.
Nesta crise, os chefes dos bancos centrais se
transformaram em atores fundamentais. Quem são os melhores banqueiros centrais
do mundo?
Ben Bernanke, o diretor do Federal Reserve
dos EUA.
Quem mais?
Os outros estão em outra categoria. Bernanke
vem fazendo um trabalho excepcional.
Paul Krugman argumenta que uma política
monetária e fiscal mais expansiva reduziria o nível de desemprego nos Estados
Unidos. Raghuram Rajan pensa que muitos dos empregos que desapareceram na crise
não poderão mais ser recuperados --que são produtos de mudanças estruturais e
tecnológicas. Quem tem razão?
Os dois. Krugman ao afirmar que os EUA podem
e devem fazer mais através de gastos públicos e da política monetária para
aumentar o emprego. E Rajan ao dizer que a economia dos EUA se transformou de
tal maneira que muitos empregos de antes não vão mais existir e que, a longo
prazo, é preciso criar postos de trabalho em outros setores.
Dentro de dez anos, que país vai ter uma
economia com mais crescimento, Espanha ou Itália?
Espanha.
E entre China e Índia?
Índia.
Estados Unidos ou Alemanha?
Estados Unidos.
E, já que estamos na Turquia, um país que vem
tendo um desempenho econômico espetacular, como o sr. vê a situação aqui?
Insustentável. A Turquia sofre de
desequilíbrios econômicos profundos, e seu enorme déficit de conta corrente é
um sintoma desse fato.
E a Europa?
Vejo três cenários: mais Europa, mais do
mesmo ou reformas limitadas. O primeiro é uma Europa mais federal, o segundo é
a Europa das contínuas cúpulas de líderes em que não se decide nada de
fundamental ou "grande", e o terceiro supõe que os países vão
acordando reformas parciais que permitam ir resolvendo os problemas mais
graves; é o que chamo de "o status quo e algo mais". É este o cenário
que vejo como o mais provável.
Siga-me no twitter @moisesnaim
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