Memorização
Economia

Memorização


“Neurónios musculados, precisam-se!”…
Texto de Salvador Massano Cardoso no blogue 4R - Quarta República

 «Tenho seguido com muita atenção o trabalho e a investigação de um notável cientista português, o professor Castro Caldas. O neurocientista revela-nos, graças às novas tecnologias, como funcionam os cérebros dos analfabetos e os que aprenderam a ler em criança. As diferenças são abismais, provando que a melhor aprendizagem deverá ocorrer em momentos certos acompanhando o desenvolvimento cerebral. Agora, e a propósito de um livro sobre o "Desastre no Ensino da Matemática: como recuperar o tempo perdido", foi noticiado que o professor Castro Caldas defende que "o treino da memorização não é uma actividade menor". Depreende-se que o treino da memória é indispensável ao desenvolvimento cognitivo e que se acompanha de um aumento dos neurónios e respectivas ligações. Assim, a velha técnica de “aprender de cor” a tabuada é muito positiva. A notícia não me surpreendeu pelo facto de acompanhar a obra do colega, mas desencadeou uma velha recordação. [...]
      «As técnicas de memorização estendiam-se a muitas outras actividades. Ainda hoje, e não obstante o tempo já passado, ainda recordo muitas coisas aprendidas com esta técnica. Espero que tenha estimulado a produção de muitos neurónios e sobretudo muitas conexões neuronais, porque com a idade muitos vão à vida, e para sobrevivermos no mundo cada vez complexo e competitivo que nos cerca bem precisamos de neurónios bem musculados, caso contrário...»

Comentário:
     A analogia do cérebro com um musculo faz sentido, mas pode igualmente ser limitativa.
     É sabido que partes do corpo humano que não são usadas tendem a degradar-se e a estiolar, de acordo com uma lógica de economia de meios: se determinado órgão não é utilizado, será um desperdício estar a canalizar energia e outros recursos para a respectiva manutenção e funcionamento optimizado.
     Mas a "ginasticação" do cérebro — com o significado de 'uso regular para fortalecimento' — tem outras consequências que a metáfora do trabalho muscular não esclarece. Por exemplo: a aprendizagem matemática, nomeadamente de funções complexas, parece ter efeitos positivos em outras funções cerebrais, tais como a resolução de problemas do dia a dia, ou de organização profissional. Isto talvez aconteça devido à utilização dos mesmos circuitos e funções cerebrais para tarefas de natureza diversa — o que não é incompatível com a funcionamento topograficamente fraccionado, em que uma dada tarefa recorre a diferentes zonas e funções cerebrais.
     É provável que as dificuldades, observadas por docentes em muitos dos seus alunos, no desenvolvimento de raciocínio crítico (usar uma ferramenta teórica para solucionar um problema diferente daquele em que foi inicialmente demonstrada, ou reconhecer uma questão que foi aprendida, quando a mesma surge sob um ponto de vista ligeiramente diferente) tenham a ver com a simplificação das exigências lectivas na matemática no percurso escolar.
     Pode existir aqui um paradoxo cruel: ao dirigir o ensino para uma aprendizagem supostamente mais "humanizada", apoiada no "aprender por si" e com desvalorização dos processos de memorização [veja-se a entrevista de Nuno Crato, abaixo] a geração soixante-huitard pode ter provocado o efeito oposto ao pretendido, degradando a produtividade da aprendizagem.




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