Mark Blaug: entrevista [2]
Economia

Mark Blaug: entrevista [2]



       Mark Blaug

P - Na actual prática dominante na Economia, a falsificabilidade é inteiramente ignorada?

MB - Não. De certo modo, seria mais fácil se assim acontecesse. A Economia da corrente principal presta-lhe tributo formal, ou seja, diz sempre: "Ah, sim, com certeza, a teoria económica deve ser confrontada com a evidência. Não há dúvida, se a evidência for contrária, se parecer refutar a teoria, oh, sim, certamente que prestaremos muita atenção a isso, e teremos de ajustar a teoria ou até mesmo considerar eventualmente uma nova teoria." Portanto, de modo algum discordam do princípio da falsicabilidade. Pregam-no mas, na realidade, não o praticam. Por outras palavras: quando confrontados com evidência contrária a uma qualquer adorada teoria, ajustam a teoria, ou minimizam a evidência. Por vezes ignoram mesmo a evidência. Não se esforçam muito para encontrar evidência contrária, preferindo mais confirmar do que procurar a refutação.

P - Não é aí que bate o ponto? O facto da teoria económica ser frequentemente tão maleável que pode ser aplicada a não importa que dados?

MB - Sim. Mas enganamo-nos se pensarmos que isso é exclusivo da Economia. Isso permeia todas as ciências sociais e, na realidade, é actualmente muito mais efectivo na Sociologia e na Ciência Política. Dado que aí não se produzem conclusões fortes [hard conclusions] as respectivas teorias são mais difíceis de refutar do que as da Economia. Mas até mesmo nas ciências naturais é difícil encontrar uma experiência crucial que conclusivamente confirme ou conclusivamente refute. Se as pessoas, numa dada disciplina, tomarem a evidência empírica a sério, ela abala-a e eventualmente acaba por a derrubar. Mas não é o tipo de coisa em que se acorde uma manhã e se diga: "Olha, Olha! Evidência refutadora! Lá vamos ter que deitar fora a teoria!"

Portanto, o que existe é um processo gradual, mesmo nas ciências naturais. E por vezes a evidência empírica encontra-se mais na natureza dos grandes eventos. Para lhe dar um exemplo trivial, a inflação e a estagflação dos anos 1970 fizeram mais para persuadir os economistas de que havia algo de errado na teoria keynesiana - de que eram necessárias políticas do lado da oferta e tudo isso - do que toda a evidência empírica dos estudos econométricos que contrariava o keynesianismo. Às vezes tem de se levar com um martelo na cabeça para aceitar o abandono de uma bem-adorada teoria.

P - Que outros exemplos pode citar em que a evidência é gritante e mesmo assim a Economia não abandonou a teoria?

MB - As expectativas racionais e a nova macroeconomia clássica [new classical macroeconomics]. A implicação de que nenhuma política pública pode influenciar o produto real, o rendimento real e o emprego numa economia, tem sido refutada vezes sem conta. E a evidência em contrário tem sido reconhecida em grande medida por aqueles que são os porta-vozes oficiais desta macroeconomia clássica. No entanto, a macroeconomia clássica é ainda ensinada em todos os manuais escolares, e existem ainda muitos macroeconomistas que acreditam ferverosamente que essa teoria está assente em fundações sólidas, e de que as pessoas, efectivamente, formulam expectativas racionalmente. Existe evidência até nas bolsas de valores. As bolsas são dos melhores locais para testar a ideia porque, entre todos os mercados, é dos que mais motiva os agentes a estarem informados. No entanto a bolsa de valores está pejada de anomalias, como bolhas especulativas, que são impossíveis de explicar na hipótese de todos os intervenientes formularem expectativas racionais.

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Entrevista da Challenge, May-June, 1998



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