Economia
Investimento ou poupança?
Diretamente do Valor Econômico de hoje, artigo do Professor Armando Castelar Pinheiro.
A
maior parte das análises sobre o potencial de crescimento do Brasil enfatiza a
limitação imposta à expansão da economia pela nossa baixa taxa de investimento.
Desde 1995, quando tem início a nova série das contas nacionais do IBGE, em
apenas três anos - 1995, 2008 e 2010 - essa taxa superou 18% do PIB. Estima-se
que para sustentar um crescimento do PIB da ordem de 5% ao ano é necessário
investir algo como 22% do PIB. Isso, mesmo com premissas otimistas sobre a
expansão da produtividade total dos fatores.
As
consequências do baixo nível de investimento são visíveis: portos, aeroportos e
rodovias congestionadas, apagões na rede elétrica, transporte urbano ruim,
baixa cobertura da rede de esgotos etc. No setor imobiliário também é óbvia a
falta de investimento, estimando-se que alguns milhões de famílias vivem em
condições inapropriadas.
Essa
carência de investimentos, por sua vez, é em geral atribuída à nossa baixa taxa
de poupança: em 1995-2010, de apenas 15,5% do PIB, em média. O argumento básico
é que a demanda por investimento no Brasil é alta, dado o grande potencial de
crescimento do país, mas ela esbarra em nossa escassa poupança. O resultado é
uma taxa de juros elevada e um baixo nível de inversão.
Não
há como contestar que a poupança nacional é baixa e que é necessário elevá-la.
Sem isso, uma alta do investimento exigiria déficits elevados com o resto do
mundo, potencialmente geradores de crises de financiamento externo. Mas será
uma alta da poupança também condição suficiente para elevar o investimento,
como sugere o argumento acima? Algumas evidências recentes e outras mais
antigas sugerem que não.
No
Global Competitiveness Report (Relatório de Competitividade Global) de 2011-12,
do Fórum Econômico Mundial, por exemplo, só 3,3% dos empresários consultados
consideraram as condições de financiamento como o maior obstáculo para fazer
negócios no país. Muito mais importantes são a elevada carga tributária
(19,3%), a regulação tributária (16,6%) e a má qualidade da infraestrutura
(15,1%), para ficar nos principais. Em suma, o problema maior é o ambiente de
negócios ruim.
A
recém-divulgada pesquisa do Doing Business, do Banco Mundial, confirma o perfil
hostil do ambiente de negócios no Brasil. O país ficou na 126ª posição, entre
183 economias pesquisadas, seis colocações abaixo da do ano passado. O Brasil
andou para trás em metade dos itens considerados. Vários dos problemas dizem
respeito ao número elevado de procedimentos burocráticos e ao tempo necessário
para se cumprir as regras administrativas: por exemplo, no Brasil, uma licença
para construção leva 469 dias para ser obtida, contra 221 na média da América
Latina e 151 na da OCDE.
No
quinquênio 2003-07, o Brasil registrou superávits em conta corrente. Portanto,
exportou poupança, o que significa que apesar de baixa, esta foi então mais do
que suficiente para financiar a demanda por investimento no país. Atualmente o
país registra um déficit, mas este poderia ser maior, dada a disposição dos
investidores estrangeiros, se houvesse bons projetos a implantar.
O
custo de captação via ações no Brasil não é alto, sendo essa uma opção para
empresas grandes, e até algumas médias, captarem recursos para investimentos.
No último quinquênio, as captações primárias - portanto, recursos novos - na
Bovespa somaram 1,5% do PIB, contra basicamente zero na década anterior. Também
isso parece ter tido pouco impacto sobre o investimento agregado.
Nos
últimos quinze anos aumentou muito a disponibilidade de financiamento a baixo
custo pelo BNDES: de 1,0% do PIB em 1995 para 4,6% do PIB em 2010. Neste ano, a
TJLP, descontada a inflação, foi zero. O impacto no investimento da alta na
oferta e da queda no custo de recursos foi nulo: em 2010, a taxa de
investimento (18,4% do PIB) foi igual à de 1995 (18,3% do PIB). Com isso, tudo
que se conseguiu foi quintuplicar a razão entre os desembolsos do Banco e a
taxa de investimento, de 5% em 1995 para 25% em 2010. Mudou a forma de
financiamento, mas não o ritmo de inversão. A reação das empresas à maior
disponibilidade de recursos baratos não foi investir.
O
ponto que se deseja fazer não é o da irrelevância de medidas para elevar a
poupança, em especial a pública, que ao manter-se sistematicamente negativa
penaliza todo o resto da economia. Longe disso, o Brasil precisa de medidas que
fomentem a poupança e aumentem a eficiência com que essa é intermediada. O que
se quer é chamar a atenção para a necessidade de, em paralelo, remover as
barreiras que desincentivam o investimento no país.
A
falta de políticas voltadas para melhorar o ambiente de negócios e investimento
no Brasil é compreensível, mas lastimável. Compreensível, pois é um processo
lento, que exige persistência e não dá aos políticos a oportunidade de se
promover em eventos de inauguração. Uma lástima, pois é uma agenda positiva, de
baixo custo financeiro e com grande potencial distributivo, já que beneficia
desproporcionalmente os pequenos empresários.
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