Economia
Divisão do Pará e um novo modelo para a Amazônia
Neste
momento eleitoral que vive o estado do Pará, editorial de hoje do VALOR
ECONÔMICO veio no momento exato para uma boa reflexão.
Os
4,8 milhões de eleitores do Pará estão sendo convocados a responder, em
plebiscito marcado para 11 de dezembro, se o Estado deve ser dividido em três
unidades federativas, em duas ou ficar como está, um gigante com 1,2 milhão de
quilômetros quadrados, rico em recursos naturais (tem a maior jazida de ferro
do planeta), mas apenas 1,4% de participação no Produto Interno Bruto (PIB),
com indicadores sociais sofríveis e palco de violenta disputa pela posse e uso
da terra.
Trata-se
de oportunidade única para discutir não apenas a divisão administrativa do Pará
mas também o modelo de desenvolvimento que o país quer para a Amazônia, ainda
hoje assentado em bases lançadas na época do "Milagre Econômico", nos
anos 1970, fincadas na teia de estradas rasgadas na selva, na pata do boi e no
avanço desordenado de frentes econômicas.
Pesquisa
Datafolha realizada no início da abertura da campanha no rádio e na televisão
revela que 58% dos paraenses são favoráveis à manutenção do status quo. Os
emancipacionistas apostam na propaganda para tentar reverter o quadro. Difícil,
quando se considera que 60% do eleitorado a se manifestar no plebiscito está
concentrado na região de Belém e adjacências, sede do governo contra a qual se
voltam as províncias distantes e queixosas do abandono oficial.
Na
hipótese de a maioria votar pela divisão, o Pará remanescente ficará com apenas
17% do atual território - e a grande maioria da população.
Na
região Sul será criado o Estado de Carajás, com 35% do território, 39
municípios, uma população estimada em 1,6 milhão de habitantes, as imensas
jazidas de minérios da Serra dos Carajás. O município de Marabá será a capital
da nova unidade federativa.
A
outra nova unidade será o Estado do Tapajós, com 58% da área do atual Pará, 27
municípios, a cidade Santarém, situada no encontro das águas dos rios Amazonas
e Tapajós, como capital, e densidade demográfica rarefeita - a população
estimada é de cerca de 1,2 milhão de habitantes para uma área de 718 mil
quilômetros quadrados.
"O
surgimento de três unidades federativas onde atualmente há apenas uma deverá
reproduzir os problemas e queixas, em vez de resolvê-las", escreveu o
jornalista Lúcio Flávio Pinto no "Jornal Pessoal", publicado em
Belém, um fórum de excelência sobre a divisão que elevou de patamar o debate
sobre o plebiscito.
"O
que acarreta as distorções não é o excesso de terra a ser jurisdicionada pelo
governo local ou a insuficiência de gente para melhorar a relação
habitante/quilômetro quadrado, que asseguraria a soberania nacional sobre a
fronteira, mas o "modelo" de ocupação", diz Lúcio Flavio,
jornalista de larga vivência e estudos sobre a Amazônia.
De
fato, é de se perguntar se o Tapajós, com população rarefeita, não terá tantos
problemas quanto Belém para dar atenção a províncias longínquas. Será uma
sombra da Vale e o modelo a ser replicado no Tapajós, região onde ainda é
possível uma correção no curso impresso nos anos 70?
O
custo de criação de duas novas unidades federativas também deve ser
considerado.
Segundo
estudo do Ipea coordenado pelo professor Rogério Boueri, o custo fixo para a
manutenção de um novo Estado é de R$ 832 milhões ao ano, a preços de 2008.
Boueri detectou também que esse custo de manutenção, expresso pelo gasto
público estadual, cresce com a população e com a produção econômica da unidade
- cada habitante acresce R$ 564,69 ao gasto estadual e cada real de produção
eleva esse gasto em 7,5 centavos de real.
A
criação de dois novos Estados significará a eleição de seis novos senadores da
Amazônia e de 13 novos deputados federais para a Câmara (o Pará, que atualmente
tem uma representação de 17 deputados ficaria com 14). Aumenta, portanto, o
desequilíbrio da representação legislativa federal. Em cada um dos novos
Estados será criada uma Assembleia Legislativa. Alguém terá de pagar essa
conta, ao final.
Os
paraenses, sem dúvida, são soberanos para decidir o que fazer com o Estado, mas
essa é uma discussão que definitivamente diz respeito a todo o país. E não é
apenas pela fatura, que será paga por todos, mas também pelo destino de uma
região cuja sorte sempre foi escrita por mãos de outras paragens.
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Leonardo Sakamoto é jornalista e doutor em Ciência Política. Cobriu conflitos armados e o desrespeito aos direitos humanos em Timor Leste, Angola e no Paquistão. Já foi professor de jornalismo na USP e, hoje, ministra aulas na pós-graduação da...
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