Economia
Dilma Rousseff, no comando do BC.
Outro editorial do “O Estado de
S. Paulo” nesta data sobre “Dilma Rousseff, no comando do BC”.
A presidente Dilma Rousseff assumiu oficialmente
o comando do Banco Central (BC) e a política de juros é agora decidida no
Palácio do Planalto. O plano do governo para 2012 é baixar a taxa básica
para 9%, porque "ainda há margem de manobra" para novos cortes,
segundo informou ao Estado o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência
da República, Gilberto Carvalho. A conversa, com participação de dois outros
membros do primeiro escalão do Executivo, foi bastante clara para eliminar
qualquer dúvida: há um plano traçado no Palácio do Planalto e a decisão
final caberá à presidente.
Ressalvas quanto ao ritmo dos cortes -
determinado com "prudência", segundo o secretário - em nada alteram o
dado principal. A autonomia de fato do BC, adotada nos anos 90 e mantida nos
dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é uma experiência
encerrada, embora ninguém, na administração federal, o admita de forma
explícita. Não há outra forma de entender as declarações do secretário-geral
nem os pronunciamentos da presidente Rousseff e do ministro da Fazenda, Guido
Mantega, desde a última semana de agosto.
Esses pronunciamentos foram logo seguidos pelo
anúncio da redução dos juros, decidida pelo Comitê de Política Monetária
(Copom). A aparente dissidência - a decisão foi tomada por 5 votos contra 2 - até
poderia ser interpretada como sinal de permanência da autonomia de fato. Em
pouco tempo as palavras do ministro e da presidente confirmaram a interpretação
oposta. Eles continuaram falando sobre os cortes de juros como se apontassem o
caminho ao BC. E, na sexta-feira, a presidente foi absolutamente explícita -
mais do que pretendia, provavelmente - ao defender a redução da taxa básica
como resposta ao agravamento da crise internacional. "Desta vez",
disse ela, "o Brasil não pode errar na avaliação do quadro externo."
Não seria "admissível", acrescentou, deixar de levar em conta o risco
de recessão e de deflação no resto do mundo. Não é o tom de quem apenas
manifesta um desejo, mas de quem transformou o Banco Central em mais um
instrumento da política econômica do governo.
Ontem, o ministro da Fazenda voltou a falar sobre
as medidas possíveis diante de uma piora do cenário global e mencionou novos
cortes de juros e redução do depósito compulsório dos bancos. Usou o pronome
"nós", ignorando qualquer separação relevante entre o BC e o comando
do Executivo.
Além de comandar a redução dos juros, a
presidente da República decidiu também, segundo todas as evidências, afrouxar o
regime de metas de inflação. Sem usar essas palavras, o BC admite o fato
num relatório trimestral divulgado na semana passada. Pelas projeções
publicadas, a inflação acumulada em 12 meses só voltará ao centro do alvo
(4,5%) no terceiro trimestre de 2013 - mas essa hipótese, a mais otimista, só
aparece num dos três cenários apresentados.
O afrouxamento do combate à inflação será adotado
num período de eleições municipais, com salários em alta e sem garantia, além
de meras promessas, de efetiva austeridade fiscal. Ao mesmo tempo, o Executivo
embarca em políticas protecionistas muito mal disfarçadas, com o pretexto de
tornar mais competitivos certos setores da indústria nacional. Medidas efetivas
para promover esse aumento de competitividade permanecem na esfera das
promessas e de planos muito mal esboçados.
Bons argumentos a favor de uma política monetária
mais branda poderiam surgir em breve, com o provável agravamento da crise no
mundo rico. O primeiro passo poderia ser a redução do depósito compulsório,
para ampliação do crédito. Vendas de dólares, como em 2008, poderiam ser um
complemento, em caso de escassez de financiamentos em moeda estrangeira. O BC
tomou medidas como essas no início da grande crise, há três anos, e foi muito
mais eficiente, na ação imediata, do que o Ministério da Fazenda - ao contrário
da versão cultivada no Palácio do Planalto. Mas o governo preferiu agir às
pressas, impondo ao BC uma ação arriscada, alimentando a expectativa de
inflação e desmontando a credibilidade do regime de metas e da autoridade
monetária. Esse retrocesso pode sair muito caro para o País.
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