Défices e taxas de juro
Economia

Défices e taxas de juro


Bruce Bartlett no Talking Points, chama a atenção para um estudo publicado pelo Federal Reserve Bank of Philadelphia , comentando: «Trata-se de um novo paper acerca de porquê os défices públicos conduzem ao aumento das taxas de juro. A diferença está em que o texto apoia a ideia actualmente promovida por alguns políticos liberais (1) de que os défices correntes não importam, apenas os défices esperados no futuro. Isto surpreende-me por ser uma ideia muito anti-Keynesiana, para principiantes. Mas como tem o apoio do Fed, provavelmente será citado pelos usuais suspeitos.»

O texto referido é "Deficit-Financed Tax Cuts and Interest Rates", da autoria de Sylvain Leduc. Na apresentação do texto, diz-se:
«As propostas para fazer baixar impostos encontram frequentemente oposição no Congresso. Um dos argumentos utilizados é o de que a diminuição dos impostos sem a equivalente descida da despesa pública pode conduzir a futuros défices orçamentais, que se traduzirão depois em mais elevadas taxas de juro de longo prazo e mais baixos níveis de rendimento. Neste artigo, Silvain Leduc examina os argumentos teóricos acerca de os défices conduzirem a taxas de juro mais elevadas. Também analisa estudos empíricos que utilizaram dados sobre a expectativa de défices orçamentais para documentar a possibilidade de que aumentos em futuros défices orçamentais estejam associados a taxas de juro de reais longo-prazo mais elevadas.»
    O próprio estudo conclui:
«Podem os défices orçamentais ser associados ao aumento das taxas de juro de longo prazo? Recentes estudos empíricos mostram que sim, uma vez que contamos com o impacto de futuros défices esperados nas taxas de juro de longo prazo correntes. As expectativas de défices orçamentais são importante porque, ao baixarem o nível esperado de futuras poupanças, colocam uma pressão crescente nas taxas de juro de curto prazo esperadas. De acordo com a teoria das expectativas, um aumento nas taxas de juro de curto prazo esperadas provoca o aumento das taxas de juro de longo prazo correntes, o que pode fazer afundar o investimento e conduzir a níveis mais baixos do PNB no futuro.»

liberais" no contexto americano - e que, na Europa, designaríamos talvez como "socialistas".

Sobre este mesmo assunto, Alan Reynolds, do Cato Institute (um grupo de pressão favorável ao "estado mínimo"), escreveu em 2002 o artigo "Do Budget Deficits Raise Long-Term Interest Rates?", onde concluía em sentido oposto: «Não existe uma ligação clara entre os défices ou superavits governamentais e taxas de juro de longo prazo. Certamente que equilibrar os orçamentos constitui uma orientação politica recomendável, mas a sua defesa deve ser baseada noutros critérios que não a preocupação com as taxas de juro.»

O que é interessante nesta polémica é este paradoxo (que também perturba Bruce Bartlett) de políticos mais à esquerda conjurarem a ocorrência de défices, como argumento contra a diminuição das taxas de juro, enquanto que os defensores do "estado mínimo" - tradicionais opositores dos défices - já os parecem admitir, desde que a sua origem decorra da redução das taxas de juro. Recorde-se que o reaganismo conduziu a gigantescos défices nos EUA, situação que John Keneth Galbraith identificou como um "keynesianismo de cabeça para baixo".

Esta hipótese tem consequências para Portugal? Bem: apenas indirectamente. Atendendo a que a União Europeia tem um "mercado único" de capitais e dada a existência do euro como moeda comum, as taxas de juro de que cada um beneficia são influenciadas pelo agregado dos défices orçamentais dos vários países da moeda única; assim, é possível para um pequeno país como Portugal ter défices elevados e beneficiar de taxas de juros baixas, determinadas por défices baixos e controlados nos restantes países. É uma situação em que "o crime compensa". Também poderíamos dizer que, existindo essa possibilidade, o mais "racional" seria aproveitá-la"... É por isso que é necessária uma regulamentação rigorosa para controlo dos défices de cada um dos países da União Europeia, uma vez que o mercado não penaliza tão duramente os défices nacionais, como aconteceria se cada país tivesse a sua própria moeda e mercado de capitais.



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