Direto da FOLHA DE S. PAULO, editorial de hoje sobre a ECONOMIA BRASILEIRA:
Desde as semanas que se seguiram à falência do banco americano Lehman Brothers, ocorrida em setembro de 2008, têm sido raras as ocasiões em que a subida do dólar diante do real despertou preocupações. Em geral aconteceu o contrário: pressões de alta da moeda brasileira suscitaram temores, principalmente entre exportadores.
Esta tendência se inverteu no mês passado. A unidade do dólar, que custava R$ 1,74 no final de dezembro de 2009, fechou janeiro negociada a R$ 1,87. A alta, pouco superior a 8%, recolocou a cotação da moeda americana num patamar que não se via desde julho do ano passado.
Nada, obviamente, que se compare à vertiginosa disparada do dólar, de quase 60%, no auge da crise, algo cuja repetição não está no horizonte. Ainda assim, se a nova tendência de valorização discreta e paulatina do dólar persistir pelas próximas semanas -e há motivos para crer que persista-, o pêndulo das preocupações do governo e das empresas brasileiras começará a deslocar-se novamente.
Mais uma vez, o real é o polo passivo desse movimento de alta do dólar, que encontra seus fundamentos no desempenho das economias centrais, em especial da americana. A moeda dos Estados Unidos, depois de bater recordes mundiais de baixa, começa a valorizar-se perante as principais divisas do planeta.
O resultado do PIB dos EUA no quarto trimestre - que mostrou atividade em aceleração -, somado à percepção de que os impulsos monetário e fiscal do governo americano chegaram ao limite e começarão a ser retirados, contribui para essa revalorização do dólar. Tudo isso incentiva a expectativa de lucros e, principalmente, de juros em elevação nos Estados Unidos, o que leva investidores a um aumento de aplicações em dólar, em detrimento das em outras moedas.
Além disso, o temor de complicações adicionais em economias europeias como a grega - associado à perspectiva de ligeira diminuição no atual ritmo de alta do PIB na China, no Brasil e na Índia - reforça essa procura pelo dólar, moeda que, a despeito da virulência da crise nos EUA, ainda preserva o status de "porto seguro" em caso de ameaça.
No Brasil, a desvalorização do real, no momento em que a economia americana retoma paulatinamente as compras, poderia mitigar a situação desfavorável aos nossos exportadores e, por conseguinte, às nossas contas externas. Mas traria, adicionalmente, renovadas preocupações acerca do controle da inflação, em especial quando o governo gasta bem mais do que deveria.
Volta-se ao velho dilema: o descontrole das contas públicas favorece o aumento da dose dos juros pelo Banco Central.