Economia
A Guido o que é de Guido
A queda do PIB revelada pelo IBGE colocou o país numa situação desconfortável: apenas a Ucrânia, imersa numa guerra civil, e a Rússia, sob sanções precisamente por se envolver no conflito ucraniano, apresentaram desempenho pior que o nosso.
Se já era difícil atribuir ao resto do mundo a fraqueza da economia local, este dado deveria ser mais do que eloquente para sepultar tal ideia. Obviamente isto não ocorrerá, pois a capacidade de certos analistas se aferrarem a conceitos mais do que desmentidos pelos fatos se aproxima do infinito.
O resultado reforça que o Brasil está em recessão. Não porque o PIB caiu por dois trimestres seguidos, mas com base no trabalho desenvolvido pelo Comitê de Datação dos Ciclos Econômicos, que, aplicando metodologia similar à utilizada em outros países, concluiu que a recessão se estende desde o segundo trimestre de 2014.
Diga-se também que o investimento no Brasil caiu por nada menos do que oito trimestres consecutivos, fenômeno que não apenas aprofunda a queda da atividade, mas sugere também que a capacidade de crescimento à frente será negativamente afetada.
Estes fatos, porém, trazem um novo problema. Muito embora seja lugar-comum atribuir a queda da atividade econômica à austeridade fiscal e monetária, tanto a recessão como a queda persistente do investimento precedem, em muito, a mudança de política. Falta, portanto, identificar as causas iniciais destes processos.
Como temos explorado há tempos neste espaço, o arranjo de política econômica que vigorou de 2011 a 2014, a Nova Matriz Macroeconômica (NMM), era insustentável.
A inflação vinha desde o primeiro trimestre de 2012 em trajetória de aceleração, apesar de controles de preços, cortes pontuais de impostos e tentativas de segurar o valor do dólar no mercado de câmbio.
Em particular, a prática de represamento dos preços administrados, especialmente combustíveis e energia, teve repercussões negativas em várias dimensões, desde o atiçamento das expectativas inflacionárias (pois se antecipava, acertadamente, que seria necessária uma inflação corretiva), até a desarticulação dos setores energético e sucroalcooleiro, passando pela emasculação da capacidade de investimento da Petrobras.
As contas públicas mostravam deterioração constante, mal disfarçada pelas “pedaladas” das mais diversas variedades. Consequentemente, a dívida do governo passou a crescer de forma acelerada, revertendo anos de trabalho paciente de melhora nesta frente.
As contas externas, por fim, apresentavam déficits crescentes, também sinalizando que em algum momento medidas deveriam ser tomadas para corrigir o desequilíbrio.
Em suma, era óbvio que, cedo ou tarde, ou a NMM seria (como foi) abandonada, ou rumaríamos para uma crise aguda.
Não deveria ser surpreendente sob tais circunstâncias, portanto, que tanto o investimento quanto o produto caíssem mesmo antes da mudança de política, que, a propósito, só se manifestou no lado monetário; do lado fiscal o desempenho consegue ser ainda pior do que o observado no ano passado. E ganha um doce quem identificar austeridade no orçamento de 2016...
Os sinos da recessão tocam, portanto, pela NMM, também responsável pelos obstáculos à adoção de políticas anticíclicas, tópico a ser explorado na próxima coluna.
(Publicado 2/Set/2015)
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